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"É uma experiência de tudo ou nada!" Gelo (muito gelo), frio (a melhor temperatura foi mesmo os zero graus), orcas, pinguins, focas leopardos... Não é certamente o local de férias ideal para o comum dos mortais - apesar de alguns turistas procurarem boas fotografias na Antárctida -, mas para Filipe Palma, de 36 anos e antigo professor de Educação Física, é o sítio perfeito para "passear" de caiaque. Foram nove dias, sete em auto-suficiência, rodeado apenas por um paraíso difícil de descrever. Mas esta é mesmo a palavra que mais se ouve o aventureiro português proferir quando relembra a sua expedição paraíso.

Os sustos são agora recordados com um largo sorriso. Os bons momentos fazem desejar repetir a aventura, mas Filipe Palma realçou que "é uma experiência onde não se podem cometer erros. Os erros podem ser fatais. O que não quer dizer que se esteja constantemente em perigo de morte". Em suma "Estou a desfrutar de um passeio e voltaria a fazê-lo".

Pedir para destacar um momento da aventura parece ser algo quase impossível. "O melhor momento foi a expedição em si", frisou, tentando de seguida isolar alguns episódios, que rapidamente se torna na descrição dos nove dias "Contrastes dos dias, ora está uma tempestade de neve e estou cheio de frio, ora está um lindo sol; o encontro com os animais, a colónia de pinguins...".

No entanto, três momentos dificilmente serão esquecidos, dois relacionados com encontros imediatos com a fauna local e um, cujo excesso de confiança resultou num valente susto. "A expedição correu bastante bem. Houve alguns percalços, mas são os que estão previstos. A aventura envolvia vários riscos, como os animais (focas leopardos e orcas), o clima - o vento e o frio estão sempre presentes - e ainda a topografia da costa, pois havia uns sítios específicos para pernoitar e se não ficasse nesses pontos, não tinha sítio para encostar devido às enormes paredes de glaciares", explicou.

A fauna marcou presença durante a travessia e por mais que se conhecesse a fama dos animais, era impossível não ficar nervoso sempre que estes se aproximavam. "No primeiro dia de navegação, depois de ter visto a primeira foca leopardo, tinha atravessado uma baía com quatro milhas, passei-as com alguma ansiedade e fiquei bastante aliviado quando atravessei esse local. Quando começava a desfrutar um pouco, ouço um respirar, um arfar, muito forte atrás de mim. Era uma orca!", relatou Filipe Palma. Neste encontro com um dos "gigantes" do mar, o aventureiro português sabia que não havia registos de ataques por parte das orcas, pois "são animais considerados inteligentes, que sabem distinguir as suas presas".

Porém, ao aparecerem mais três, o coração começou, inevitavelmente, a bater mais rápido. "Continuei a remar. Eu estava ali à mercê delas, por isso tentei manter-me harmonioso o mais possível para não se sentirem ameaçadas. A maior parte das vezes, estes encontros na natureza dão maus resultados porque nós tomamos atitudes agressivas para com os animais", explicou. No entanto, as orcas apenas quiseram investigar o elemento estranho e seguiram o seu caminho, para alívio de Filipe Palma.

No último dia e já com a "meta" bem perto, foi a vez de uma foca leopardo se aproximar do explorador português. "É um animal impressionante, com os tais 300 ou 400 kg que podem atingir. É muito bonito e ágil apesar do peso, tem uma cabeça enorme, boca rasgada, com mandíbulas enormes", descreveu. Ao contrário das orcas, há registos de ataques de focas leopardos a humanos, incluindo uma morte de um mergulhador.

"Eu estava parado a tirar uma fotografia quando ela apareceu. Com o meu remo apoio-me num iceberg pequenino, para o caso de ela querer virar o caiaque. Aparece-me à minha frente, depois de um lado, depois do outro, como que a rodear-me. Ainda foram uns minutos e eu só pensava no que ia fazer, pois não me largava. Quando ela estava no lado oposto, vi uma ilha relativamente próxima e remei com toda a força... Ela não foi atrás de mim", recordou.

Não foram só os animais que assustaram Filipe Palma. No dia em que atravessou o Estreito de Gerlach, local mais complicado da expedição, algum excesso de confiança fez com que o aventureiro arriscasse fazer mais milhas do que as inicialmente previstas para o dia. "São sete milhas, quase 14 km, de total exposição, onde há mais possibilidade de haver vento", explicou. O bom tempo acompanhou-o de início, o que o levou a querer fazer a travessia toda de uma só vez. O nevoeiro apareceu, mas a confiança e a ambição de chegar a uma antiga base para descansar, moveu-o a continuar a remar, apoiado no GPS Magellan que o guiou, já que a visibilidade era quase nula. Abateu-se uma tempestade que boicotou a chegada à base e voltar um pouco para trás até uma colónia de pinguins, foi a solução. "Só pensava não pares porque não tens barco de apoio, ninguém te vem buscar", confessou, acabando por conseguir desembarcar debaixo de uma tempestade.

Apesar dos sustos, Filipe Palma é peremptório em afirmar que nunca penso em desistir. "Há que tomar decisões no momento, isso é o mais importante nestas expedições. Não posso ficar indeciso", concluiu.

EXPOSIÇÃO. Munido de duas máquinas fotográficas, Filipe Palma documentou toda a sua expedição e irá divulgá-la ao público em duas exposições. Amanhã, a partir das 18.30, a Sociedade de Geografia de Lisboa receberá a primeira e em Agosto, será a vez do Oceanário (no Parque das Nações, em Lisboa) mostrar as suas fotografias, naquele que será o mês do pinguim.

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