O número de trabalhadores lançados no desemprego através de processos de despedimento coletivo disparou 59% em 2024, atingindo um total de 5.758 casos, revelam novos dados da Direção-Geral do Emprego e das Relações de Trabalho (DGERT), que é tutelada pelo Ministério do Trabalho, da ministra Maria do Rosário Palma Ramalho.Em termos absolutos, trata-se do maior número de despedidos desde o primeiro ano da pandemia (2020), altura em que milhares de empresas foram forçadas a parar ou a reduzir fortemente a atividade na sequência das restrições e confinamentos impostos pelo governo.Muitas acabaram por falir, tendo levado a um aumento muito forte do desemprego. Nesse ano, o despedimento coletivo afetou mais de 7.500 pessoas.Tirando este ano de má memória, o primeiro da covid-19, é preciso recuar ao último ano da troika e do programa de austeridade em Portugal (2014) para encontrar um contigente superior, que ultrapassou então os 6.200 casos anuais.De relevar ainda que o forte aumento registado no ano passado, a tal subida de 59%, é também o maior desde 2020 (altura em que o número de envolvidos em despedimentos coletivos mais do que duplicou), sendo preciso depois regredir até 2012, o ano mais violento da austeridade da troika e do governo PSD-CDS (o ano do "enorme aumento de impostos", para encontrar uma subida mais agressiva: 62%. No entanto, estes valores agora revelados para 2024 ainda são preliminares. Resultam da comunicação feita pelas empresas até ao dia 31 de dezembro do ano passado.Além disso, referem-se à realidade de Portugal continental. Ou seja, o número de despedidos através de procedimento coletivo tenderá a ser superior a nível nacional.As intenções de despedimento pela via coletiva manifestadas pelas empresas, isto é, o número de pessoas a despedir, os chamados processos iniciais (que, como é de lei, tem de ser comunicados pelos empregadores à DGERT) também sofreram um forte agravamento, na ordem dos 59% em 2024.A meta inicial das empresas que avançaram com despedimentos coletivos visava o afastamento ou a saída de 6.085 trabalhadores no território de Portugal continental.Ou seja, segundo a DGERT, com o que foi comunicado até ao último dia do ano, foi possível cumprir 95% do objetivo. É uma das taxas de conclusão mais elevadas desde o tempo da troika (2013).Regras e ónus do despedimento coletivoO Ministério do Trabalho (DGERT) explica que "considera-se despedimento coletivo o efetuado pelo empregador, simultânea ou sucessivamente no período de três meses, abrangendo pelo menos dois trabalhadores se a empresa tiver menos de 50 trabalhadores; cinco trabalhadores, se a empresa tiver pelo menos 50 trabalhadores", tendo como fundamentos "o encerramento de uma ou várias secções ou estrutura equivalente ou a redução do número de trabalhadores determinada por motivos de mercado, estruturais ou tecnológicos".De acordo com a lei (Código do Trabalho), os motivos de mercado são "a redução da atividade da empresa provocada pela diminuição previsível da procura de bens ou serviços ou a impossibilidade superveniente, prática ou legal, de colocar esses bens ou serviços no mercado".As razões estruturais são "o desequilíbrio económico-financeiro, a mudança de atividade, a reestruturação da organização produtiva ou a substituição de produtos dominantes".E os motivos tecnológicos alegados pelo empregador podem ser "as alterações nas técnicas ou processos de fabrico, a automatização de instrumentos de produção, de controlo ou de movimentação de cargas, bem como a informatização de serviços ou automatização de meios de comunicação".Normalmente, primeiro, as empresas tentam chegar a acordo com cada um dos trabalhadores (rescisões amigáveis, por exemplo) para a sua saída, uma forma de minimizar os riscos reputacionais, financeiros e jurídicos que envolvem a figura mais violenta e definitiva do despedimento coletivo, onde têm de ser observadas inúmeras condições, podendo ser objeto de impugnação se algo não estiver dentro da legalidade.Razia nas empresas mais pequenas, Lisboa e Vale do Tejo, mulheresO quadro anual dos despedimentos coletivos mostra que a razia continua a fazer tombar muitos empregos em empresas de micro e pequena dimensão, que respondem por mais de metade (50,2%) total de pessoas efetivamente despedidas em 2024, no Continente.A maior parte cabe às empresas de "pequena dimensão", com mais de 39% do total de despedidos. Os dados do Ministério apontam para quase 2.270 casos confirmados, em 2024, neste tipo de firmas.Segundo o Instituto Nacional de Estatística (INE), uma empresa de tamanho pequeno é a que "emprega menos de 50 pessoas e cujo volume de negócios anual ou balanço total anual não excede 10 milhões de euros, e que não está classificada como microempresa".No ano passado, a região mais fustigada (face ao total de pessoas despedidas no Continente) foi Lisboa e Vale do Tejo, arcando com 50% dos despedimentos concretizados. Foram 2.866 casos, segundo a DGERT.Logo a seguir, a região Norte, com uns expressivos 36% do total, o que corresponde a quase 2.100 pessoas afetadas por despedimentos coletivos.A região centro é a terceira neste ranking, com 13% do total (739 casos).No Alentejo e no Algarve, o contributo para o recorde nacional (continental) é baixo: ambas representaram apenas 0,6% do total de despedimentos comunicados.Como sempre, as mulheres são as mais atingidas pelos processos de falência e de forte minimização de estruturas produtivas (nomeadamente, na indústria transformadora, como mostram os casos recentes).Mais de 53% das pessoas despedidas são mulheres (3.062 casos). Os homens valem 47% do total (2.696 despedidos em 2024).Exemplos por todo o paísA crise ou os atritos e incertezas cada vez maiores nos destinos do comércio internacional e no que vão ser as tarifas alfandegárias, agora que Donald Trump já é de novo Presidente dos Estados Unidos, está a deitar abaixo muitos negócios e investimentos ou a acelerar o encerramento de operações um pouco por toda a Europa.Em Portugal, não têm faltado exemplos sonantes e até surpreendentes. Há cerca de um ano, em fevereiro passado, a Nokia Portugal avançou com um plano para despedir 142 trabalhadores, grande parte deles muito qualificados.No final de outubro, a empresa de origem dinamarquesa do ramo alimentar DAT-Schaub concluiu o despedimento de 125 pessoas (grande maioria mulheres), mais 25 afastados através de rescisão amigável, da fábrica em Arcozelo, Gaia, que foi encerrada.A Coindu, uma fábrica do setor automóvel (faz interiores de carros, capas para assentos de carros, etc.), localizada em Arcos de Valdevez, anunciou o encerramento definitivo no fim deste mês de dezembro, tendo despedido todos os funcionários, cerca de 350 pessoas.Outro exemplo mediático e simbólico, mas que não cai no ano de 2024, mas deve contar para 2025, será o do fecho quase certo da histórica fábrica de plásticos da Tupperware, uma empresa com sede nos EUA que está a encerrar produção na Europa.Emprega cerca de 200 trabalhadores em Constância. Estão todos em casa com dispensa de trabalho à espera de uma solução, eventualmente, do despedimento coletivo, do fim.