Após a vitória nas eleições gerais, Pedro Sánchez não precisou de calculadora para perceber que as contas estão difíceis para os socialistas. Mas não estão impossíveis de fazer. Contudo, o jogo de eventuais alianças ou abstenções para permitir a sua investidura só deverá ser feito depois da "segunda volta", isto é, das eleições europeias, autárquicas e regionais que se realizam a 26 de maio, até porque o novo Congresso só toma posse a 21 de maio..O resultado eleitoral deu 123 deputados aos socialistas de Sánchez, seguido pelo PP com 66, o Ciudadanos com 65, a coligação Unidas Podemos com 42 e o Vox com 24. Os independentistas catalães conseguiram, no total, 22 deputados, pertencendo15 à Esquerda Republicana da Catalunha (ERC) e os restantes sete ao Junts per Catalunya. O Partido Nacionalista Basco (PNB) elegeu seis deputados, o Bildu mais quatro, a Coligação Canárias outros dois. A plataforma Navarra Some (Na+) elegeu dois, o Compromís um e o Partido Regionalista da Cantábria o último dos 350 deputados..As únicas coligações a dois que garantem uma maioria dos 176 deputados são a impossível entre PSOE e PP (189 deputados) e a igualmente improvável aliança entre PSOE e Ciudadanos (180 deputados). Estes dois últimos partidos até chegaram a um acordo de governo após as eleições de junho de 2016, mas não conseguiram os apoios suficientes para passar então no Congresso..Desde então, muitas coisas mudaram, nomeadamente a "traição" de Sánchez a Albert Rivera ao garantir a moção de censura a Mariano Rajoy com o apoio dos independentistas catalães, sem convocar de imediato eleições antecipadas. Rivera estava então à frente nas sondagens. O alegado diálogo e abertura dos socialistas às exigências dos independentistas catalães, chegando a aceitar a nomeação de um "relator", terá sido a gota de água para o Ciudadanos, que nasceu na Catalunha contra o independentismo..Logo na campanha, Rivera deixou claro que não estava disponível para novo acordo com o PSOE e já nesta segunda-feira o Ciudadanos voltou a repeti-lo. O próprio Sánchez não estará aberto a isso: na noite eleitoral, quando discursava, os apoiantes gritavam "Com Rivera não!" e ele respondeu "Acho que ficou bastante claro, não?". Mas depois suavizou dizendo que o PSOE não vai fazer "cordões sanitários" como o Ciudadanos. "A única condição que vamos pôr é a Constituição e avançar para a justiça social, a regeneração e a limpeza política", acrescentou..As contas possíveis.A aliança prevista já antes das eleições era entre PSOE e Unidas Podemos, mas com apenas 165 no conjunto, fica a 11 dos 176 necessários para garantir a maioria. Logo na noite eleitoral, Pablo Iglesias estendeu a mão a Sánchez, pedindo cautela e discrição antes das negociações mas lembrando que o Podemos é "imprescindível para que haja um governo de esquerda"..Mas a vice-presidente do governo, Carmen Calvo, já disse que o PSOE "vai tentar governar sozinho". Como é que isso funciona? Na prática, os socialistas teriam o apoio parlamentar do Podemos para a investidura de Sánchez, sem que Iglesias e os seus tivessem qualquer ministério ou pasta, podendo negociar o apoio de outros partidos pequenos, como o Nacionalista Basco, e esperar a abstenção dos independentistas catalães (a ERC lembra que um governo socialista será um mal menor frente à ameaça da direita)..Para ser investido chefe de governo, Sánchez precisa de uma maioria absoluta na primeira volta, mas apenas de uma maioria simples, isto é, mais "sim" do que "não" na segunda volta. Em conjunto, a direita tem 149 deputados (inclui os dois da Na+)..Seja como for, as negociações de governo só devem começar depois da "segunda volta" eleitoral, isto é, as eleições europeias, autárquicas e regionais. Nestas últimas haverá eleições em 12 das 17 comunidades autonómicas (exceções são Andaluzia, País Basco, Catalunha, Galiza e Comunidade Valenciana)..Os próximos passos.Os novos deputados e senadores (os socialistas conquistaram a maioria no Senado pela primeira vez desde 1993) só vão tomar posse a 21 de maio, quando se elegem os presidentes de ambas as câmaras. O presidente do Congresso dos Deputados é o responsável por comunicar ao rei Felipe VI o resultado eleitoral, cabendo ao monarca receber depois os representantes dos partidos políticos para saber quem vai chamar para se submeter à investidura..Havendo acordo, estima-se que poderá haver debate de investidura em finais de maio ou princípios de junho. Será investido chefe do governo quem conseguir a confiança do Congresso: maioria absoluta na primeira votação ou, 48 horas depois, maioria simples na segunda..Caso o candidato não consiga os números necessários, abre-se um novo processo para nomear outro candidato (ou até o mesmo). Desde a primeira votação falhada, começa contudo a contar o prazo de dois meses para conseguir uma solução, depois do qual se dissolve novamente o Congresso (seria em agosto) e se celebram novas eleições (provavelmente em outubro)..Os espanhóis tiveram eleições em dezembro de 2015 que representaram o fim do bipartidarismo entre PP e PSOE, com a irrupção de Podemos e Ciudadanos no Congresso, tendo sido impossível investir um primeiro-ministro. Os espanhóis regressaram às urnas em junho de 2016.