Cidades-fantasma, futebol e religião suspensos. A doença que está a parar o mundo

O covid-19 já chegou a mais de 50 países, deixando marcas na economia e na sociedade, obrigada a adaptar-se. A OMS elevou o nível de emergência internacional para "muito elevada".
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Em pouco mais de dois meses, o mundo mudou e o responsável chama-se covid-19. O novo coronavírus está cada vez mais espalhado no mapa: só nesta sexta-feira, dia 28, foram anunciados casos positivos por contaminação em mais seis países. O relógio viral, esse, terá começado a contar a 17 de dezembro. De acordo com a Academia Chinesa de Ciências, a primeira contaminação pelo vírus terá ocorrido nesse dia, na cidade de Wuhan, na China. Hoje, está em mais de 50 países. O paciente zero, ainda desconhecido, seria habitante da cidade com mais habitantes do que Portugal (11 milhões) e terá começado a espalhar o vírus a 24 de dezembro. Contudo, só a 31 desse mês é que soaram os alarmes: o governo chinês lança o alerta à Organização Mundial da Saúde (OMS) para aquilo que ainda só se sabia ser uma série de casos de pneumonia de origem desconhecida.

A 1 de janeiro, as autoridades chinesas fecham o mercado da cidade, onde trabalhavam muitos dos infetados. Três dias depois, já se registavam 44 casos positivos. E não demoraria muito até à confirmação da primeira morte, a 11 de janeiro, validando assim o que seria um novo tipo de coronavírus. Um número que já supera os 2860 mortos (em quase 84 mil casos confirmados) por uma doença que rapidamente deixou de ser só da China, tocou a Europa e corre mais de meia centena de países no mundo. Àqueles, como Portugal, aos quais o vírus ainda parece não ter chegado, o diretor-geral da OMS deixa o alerta: é um "erro fatal" presumir que não chegará e os países mais ricos não estão seguros, disse Tedros Adhanom Ghebreyesus. Não por acaso a organização decidiu, na sexta-feira, aumentar o nível de ameaça internacional para "muito elevada".

Certo é que, em pouco mais de dois meses, o mundo viu-se obrigado a adaptar-se às consequências da epidemia. As digressões de celebridades e as gravações de filmes de Hollywood estão a ser canceladas por todo o mundo, na Suíça já estão a encerrar os estádios de futebol para a próxima jornada da Liga, as bolsas europeias estão a abrir nesta semana com quedas superiores a 3%, algumas companhias aéreas a cancelar viagens para zonas de risco, Meca fechou portas aos peregrinos e o governo australiano até equaciona a hipótese de enviar os seus cidadãos para uma ilha remota. O mapa de casos não para de alargar - ainda que a vasta maioria dos infetados consiga recuperar (mais de 36 mil em cerca de 84 mil) - e cada país tem reagido à sua maneira.

O que estão os países a fazer

Um mês depois da primeira contaminação, ainda eram mais as perguntas do que as respostas. As autoridades de saúde internacionais pareciam estar longe de imaginar que se espalharia tão rapidamente pelo mundo, ao ponto de se registarem mais casos novos fora da China, país de origem do vírus, do que dentro deste país. Embora continue a ser aqui que se concentra a esmagadora maioria dos casos positivos e das mortes.

Passados apenas dois dias desde que foi identificado o agente responsável pelos sintomas dos doentes, surgiu a primeira ameaça fora do território chinês: um caso positivo na Tailândia. Logo depois, a 15 de janeiro, é reportado o primeiro no Japão, que entretanto decidiu impedir a entrada no país de qualquer pessoa suspeita de estar contaminada.

Ainda que a Tailândia tenha sido o primeiro país a seguir à China, o Japão já regista quase mais 200 casos do que os tailandeses e, ao contrário destes, já regista mortos (nove). No sudeste asiático, o governo começou por proibir o desembarque de cruzeiros que tinham como destino o país. Ainda na Tailândia, dois médicos garantiam ter curado uma paciente infetada com o vírus através de uma mistura de medicamento contra o VIH e um remédio antigripal, segundo o diário Bangkok Post.

Seguiram-se a Coreia do Sul, os EUA e Macau. Embora o presidente norte-americano Donald Trump esteja convencido de que o "risco" no seu país "é muito baixo" devido à decisão que tomou de proibir a entrada de pessoas provenientes da China.

Chegaria depois à Europa, a 24 de janeiro, mais propriamente a França. Contudo, no continente europeu, é em Itália que a situação se mostra mais alarmante, com mais de 800 casos confirmados desde o final do mês passado, e 21 mortes. Nas estações do norte italiano, as carruagens dos comboios foram chegando aos destinos vazias e cerca de uma dúzia de cidades foram isoladas, deixando as ruas desertas.

Segundo os dados publicados na revista científica Lancet, cada pessoa infetada com covid-19 contagia, em média, 2,68 pessoas. Uma taxa inferior à média da SARS (3), mas acima da registada pela gripe espanhola de 1918 (1,8), a MERS (0,30) e a gripe suína (1,46).
Não só a doença, mas também o medo têm sido propagados pelo mundo. Na Ucrânia, a chegada de dezenas de repatriados levou protestos às ruas, com manifestantes a bloquear com fogueiras a estrada por onde passariam os autocarros com os cidadãos que ficariam de quarentena. O episódio levou a ministra da saúde, Zoriana Skaletska, a decidir ficar em quarentena com os repatriados, para acalmar o povo. Entretanto, a Rússia anunciou o fecho da fronteira com a China, mas a União Europeia (UE) garante não estar a equacionar encerrar fronteiras no espaço Schengen.

Ainda sem conseguir calcular a dimensão, a UE admite que a propagação da epidemia está a resultar em danos económicos. No entanto, os Estados membros estão a unir-se para comprar conjuntamente variados equipamentos de precaução, como máscaras.

Como se prepara Portugal

O mais perto que este vírus chegou de Portugal foi no início da semana, em Espanha, com a confirmação de mais de 30 casos positivos. A proximidade não deve, contudo, ser motivo para alarmismo, disse o primeiro-ministro. O país é, nas palavras de António Costa, um caso de "felicidade", ainda sem casos positivos confirmados, e é importante agir sem "pânicos desnecessários".

O governo decidiu acionar os dispositivos de saúde pública, colocando os hospitais Curry Cabral, Dona Estefânia, Santa Maria e São José (Lisboa), São João e Santo António (Porto) e o Centro Hospitalar e Universitário de Coimbra (incluindo o hospital pediátrico) como unidades de referência para o rastreio e o tratamento do coronavírus. Caso se registe um agravamento da epidemia, está ainda prevista uma linha de 15 a 20 hospitais (de norte a sul do país, nos Açores e na Madeira) preparados para receber os doentes.

Até agora, segundo a DGS, não está prevista qualquer restrição para quem regresse de zonas de risco, como o norte de Itália, China, Coreia do Sul, Singapura, Japão ou Irão. Aconselha estes cidadãos a manter-se atentos a possíveis sintomas (febre, tosse ou dificuldade respiratória) durante 14 dias.

Há dois portugueses hospitalizados no Japão, portadores do covid-19, que estavam a bordo do navio de cruzeiro Diamond Princess, cuja tripulação registou já cinco mortes.

Os ministros da Saúde da União Europeia vão reunir-se na próxima sexta-feira para debater a ação perante o surto.

Até à hora de fecho desta edição, existiam ainda dois casos suspeitos em análise em Portugal e zero confirmados, de acordo com a DGS.

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