Exército aceitou candidatos com nota negativa para sargentos dos quadros permanentes

Curso iniciou-se há poucas semanas na Escola de Sargentos do Exército, que Marcelo Rebelo de Sousa visita nesta segunda-feira, tendo mais de 10% dos alunos admitidos com média de nove.

O Exército autorizou a admissão de candidatos com notas negativas para o atual curso de formação de sargentos dos quadros permanentes (QP), a decorrer desde setembro na escola que o Presidente da República visita nesta segunda-feira nas Caldas da Rainha.

A informação consta de um aviso publicado a 9 de agosto em Diário da República e permite verificar que o Exército baixou para "nove valores" a nota média nas disciplinas de Português e Matemática - com nota mínima de "sete valores" em cada uma delas.

A porta-voz do Exército explicou ao DN que a decisão foi tomada depois de "efetuadas as provas culturais, físicas, médicas, emocionais e linguísticas" e para "constituir uma reserva de recrutamento" - da qual entraram oito candidatos, adiantou a major Elisabete Silva.

O aviso de abertura para o 47.º concurso de sargentos dos QP foi lançado em abril, de forma condicionada ao parecer favorável das Finanças e com a definição do número de vagas a preencher.

O Governo aprovou a 1 de outubro a abertura de 70 vagas para essa categoria, mas há 72 alunos a ter aulas porque dois deles são repetentes do curso de 2017, disse Elisabete Silva.

A nota mínima de acesso a esse curso era de "10 valores", correspondentes a 100 pontos numa escala de 0 a 200. Por outro lado, a nota na disciplina de Matemática ou a média de Matemática e Físico-Química no 12.º ano de escolaridade tinha obrigatoriamente de ser "igual ou superior a 10 valores" (também correspondendo a 100 pontos).

Só no exame de Matemática da Prova de Aferição de Conhecimentos (PAC) é que seriam aceites candidatos com nota de "95 pontos" - mas a classificação continuava a ser de 10 valores.

Média de nove valores, sete a Português e Matemática

O aviso de abertura do concurso determinava ainda que a classificação nas duas disciplinas da PAC - Português e Matemática - "não poderá ser inferior a oito valores (80 pontos, de expressa na escala de 0 a 200 pontos)". Mantinha-se, contudo, a obrigatoriedade de a média aritmética "não ser inferior a 10 valores" (95 pontos).

Segundo as fontes do DN e como confirmado pelo Exército, foi a falta de candidatos suficientes para preencher as 70 vagas previstas neste 47.º curso de sargentos para os QP que levou o ramo - ainda chefiado pelo general Rovisco Duarte - a aceitar a admissão de alunos com média negativa de nove valores (90 pontos).

Esse abaixamento estendeu-se à classificação mínima nas provas de Língua Portuguesa e Matemática da PAC, que agora podia ser de sete valores (70 pontos). "É baixar bastante os níveis de exigência", exclamou uma das fontes, sob anonimato por não estarem autorizadas a falar.

"É preferível ter menos mas ter melhores [militares] do que ter muitos e piores"

Segundo o aviso do Exército, os interessados com estas notas "destinam-se à constituição de uma reserva de recrutamento, com a finalidade de preencher as vagas não preenchidas pelos candidatos que cumpram com todas as condições previstas nas normas do concurso de admissão".

A Associação Nacional de Sargentos (ANS) - que é recebida na terça-feira pelo ministro da Defesa, João Gomes Cravinho - qualificou esta situação como "muito preocupante" e uma forma de "enganar os cidadãos".

"Quando se abre a malha do crivo, quando se baixa o nível de exigência, as coisas vão-se complicar no futuro", afirmou ao DN o sargento-mor Lima Coelho, antigo presidente da ANS e atual diretor do jornal O Sargento, para quem aceitar "um sete a Português até causa constrangimentos".

"Quando estamos a recrutar pessoas que vão operar com equipamentos cada vez mais sofisticados, que vão ser chamadas a participar em situações cada vez mais complexas e em que a exigência da formação tem de ser cada vez maior, quando se promete inclusivamente aumentar o nível da qualificação e reconhecimento - que continua a não ser implementado e isto é muito grave - mas se baixam os níveis de exigência, vamos ter cada vez mais dificuldades e vamos ter pessoas eventualmente menos preparadas para uma missão cada vez mais exigente", argumentou Lima Coelho.

"Isto não pode ser a todo o preço. É preferível ter menos mas ter melhores [militares] do que ter muitos e piores", enfatizou o representante da ANS, porque "tapar as vagas não pode significar tudo".

"Não estamos a falar de uma exigência vulgar. Estamos a falar de uma missão e de homens que têm de ser preparados para comandar homens, para chefiar secções e muitas delas em ambiente de tensão, de risco. São pessoas que têm de ter um domínio da língua e das tecnologias cada vez mais exigente", prosseguiu Lima Coelho.

Candidata inapta que passa a apta... sem explicações

Outra situação relacionada com este 47.º curso iniciado em setembro na Escola de Sargentos do Exército envolveu uma mulher - no posto de segundo-sargento - que concorreu em 2011 e uma decisão judicial a obrigar o ramo a justificar o porquê de a ter dado como inapta há sete anos.

Segundo as fontes ouvidas pelo DN, a candidata quis saber a razão do chumbo na admissão ao 40.º curso de formação de sargentos dos QP e recorreu para uma junta de recurso - cuja resposta voltou a ser "inapta".

Daí o recurso da militar para tribunal, que anulou a decisão por "falta de fundamento" e como determina o Código do Procedimento Administrativo, referiu uma das fontes.

No entanto, apesar de instado a transmitir à candidata as razões da decisão tomada em 2011, o Exército não a justificou - limitou-se a declarar agora a segundo-sargento como "apta" e admitindo-a ao 47.º curso numa "vaga extra", adiantou a porta-voz do ramo.

Elisabete Silva adiantou que a candidata em questão desistiu posteriormente "por decisão própria" - mas fica por saber o porquê de o Exército não ter acatado a decisão judicial, fundamentando as razões da exclusão daquela militar em 2011.

A ANS, dizendo desconhecer o caso, lembrou uma situação ocorrida há cerca de um ano na Força Aérea e em que o governo aprovou um número de vagas inferior ao previsto. Resultado: militares que já tinham sido aprovados e adquirido a respetiva farda ficaram de fora e acabaram a ser repescados para o curso deste ano, adiantou Lima Coelho.

Marcelo na Escola de Sargentos sem o ministro da Defesa

A visita que o Presidente da República e Comandante Supremo das Forças Armadas faz nesta segunda-feira à Escola de Sargentos do Exército (ESE), nas Caldas da Rainha, não terá a presença do ministro da Defesa, João Gomes Cravinho.

Contudo, segundo a agenda divulgada no domingo pelo ministério, Gomes Cravinho vai estar de manhã numa iniciativa relacionada também com o Exército e na Universidade do Minho, acompanhando o primeiro-ministro numa visita à exposição Soldado do Futuro e com demonstrações de algumas das empresas envolvidas nesse projeto integrado na Lei de Programação Militar (LPM).

Nas Caldas, Marcelo Rebelo de Sousa voltará a ser "confrontado com uma formatura de militares fardados com uma divisa que não existe", antecipou o sargento-mor Lima Coelho, que falava em nome da ANS.

Isso aparenta ser mais um incumprimento da lei ao nível das Forças Armadas e que dura há vários anos, lamentou Lima Coelho, pois a divisa em causa "não existe no Regulamento de Uniformes" nem há qualquer referência a um posto correspondente no Estatuto dos Militares das Forças Armadas (EMFAR).

"Foi uma decisão interna do Exército", sublinhou o antigo presidente da ANS, que nessa qualidade alertou vários chefes militares do ramo sem quaisquer efeitos e, aparentemente, com o beneplácito da tutela.

Esses militares - soldados e cabos - são alunos que o Exército não gradua como furriéis para evitar pagar-lhes a remuneração equivalente, ao contrário do que ocorre noutros ramos, adiantou Lima Coelho.

"É mais uma manobra" do Exército, da qual resultam outras consequências negativas como, por exemplo, esses militares serem "confrontados com situações muito desagradáveis" em que "subordinados lhes perguntam que posto têm ou como os devem designar", assinalou Lima Coelho.

Daí que a ANS tenha expectativas reduzidas quanto à visita de Marcelo Rebelo de Sousa à ESE, além de ser "protocolarmente bem organizada e onde o Presidente irá dizer coisas muito agradáveis" porque, concluiu Lima Coelho, "muitas das questões que afetam os sargentos não lhe serão colocadas".

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