26 JUN 2020
25 junho 2020 às 22h10

Liverpool é campeão inglês. Toda a história de um título que fugia há 30 anos

Os reds voltam ao trono do futebol inglês depois de em 1990 terem acabado uma era dourada com 11 títulos em 18 épocas. O arquiteto do título é Jürgen Klopp, o treinador alemão excêntrico que introduziu novas ideias no clube.

Terminou o jejum. O Liverpool, mesmo sem jogar, sagrou-se esta quinta-feira campeão inglês pela 19.ª vez, depois de o Manchester City não ter conseguido vencer o Chelsea em Londres, quando ainda faltam sete jornadas para o fim da Premier League - a equipa de Frank Lampard venceu por 2-1 o conjunto de Pep Guardiola em Stamford Bridge.

Foram 30 anos em que o histórico clube de Anfield ficou afastado do trono do futebol inglês, embora nesse período tenha vencido por duas vezes a Liga dos Campeões. Foi o mais longo período que o Liverpool esteve sem ser campeão na sua história. E tudo começou a 28 de abril de 1990, quando os reds receberam e venceram o Queens Park Rangers, por 2-1, garantindo o título a duas jornadas do fim da prova.

Na altura não se sabia, mas era o ponto final de um domínio absoluto do clube no futebol inglês, que em 18 épocas tinha conquistado onze títulos, entre os quais dois bi e um tricampeonato.

O último campeonato dos reds em 1990 teve a assinatura de Kenny Dalglish, um ícone do clube que aos 39 anos desempenhava o cargo de treinador-jogador de uma equipa que contava com outros históricos como o guarda-redes Bruce Grobbelaar, os defesas Steve Nicol e Alan Hansen, os médios Ray Houghton, Ronnie Whelan e Jan Molby, para já não falar dos avançados John Barnes, Ian Rush, Peter Beardsley e John Aldridge.

Recorde de 100 pontos à vista

É caso para dizer que os tempos de angústia terminaram em Anfield. O Liverpool sagra-se pela primeira vez campeão desde que a Premier League foi criada em 1992/93, isto depois de na época passada ter ficado a um ponto do Manchester City, o mesmo rival que agora relegou para o segundo lugar com uma temporada fantástica, na qual ainda pode bater o recorde de 100 pontos que está na posse, precisamente, dos citizens de Pep Guardiola desde 2017-18. Para isso tem de conquistar pelo menos 15 dos 21 pontos que ainda estão em disputa.

O Liverpool festeja numa época em que, para já, venceu 28 dos 31 jogos disputados até ao momento, tendo concedido apenas dois empates, com Manchester United e Everton, e perdido um jogo, com o Watford.

De resto foram 70 golos marcados, dos quais 40 tiveram a assinatura do temível trio atacante composto pelo egípcio Mohamed Salah (17 golos), o senegalês Sadio Mané (15) e o brasileiro Roberto Firmino (7). Isto numa equipa que foi sendo construída desde 2015 pelo treinador alemão Jürgen Klopp e que nas duas épocas anteriores recebeu duas peças essenciais para o equilíbrio da equipa: o guarda-redes brasileiro Alisson Becker e o defesa holandês Virgil van Dijk, eleito pela FIFA como segundo melhor jogador do mundo de 2019.

A base do sucesso do Liverpool assenta numa equipa com grande capacidade de recuperar rapidamente a bola e acelerar de imediato para a baliza contrária, apoiada nos três jogadores do ataque que conferem muita velocidade e capacidade de finalização. Neste processo tático, há outros jogadores que assumem grande importância como os laterais Alexander-Arnold e Andy Robertson devido à capacidade de ajudar nas transições, mas também os médios Jordan Henderson (capitão), Gini Wijnaldum, Naby Keita e até Fabinho, todos essenciais na grande intensidade que é colocada em campo.

Klopp, um treinador com rock and roll

Muito do mérito deste título do Liverpool é do treinador alemão Jürgen Klopp. O germânico chegou a Anfield em outubro de 2015 (rendeu Brendan Rodgers) depois de uma experiência bem-sucedida no Borussia Dortmund (antes treinou o Mainz), clube onde conquistou dois campeonatos (2010/11 e 2011/12), uma Taça da Alemanha (2011/12) e duas Supertaças alemãs (2013 e 2014).

Os donos do Liverpool queriam ver a equipa a atuar de forma diferente, com um jogo mais agressivo, um futebol moderno. Klopp trouxe isso tudo, aplicando o modelo gegenpressing, dos tempos do Dortmund - após perder a bola no campo do adversário, pressionar imediatamente o portador da bola para criar ocasiões de golo em vez de recuar e compor a defesa. Por isso o seu estilo de jogo ficou conhecido por rock and roll e heavy metal, um futebol agressivo, vertical e totalmente virado para o ataque, um 4X3X3 onde Firmino, Salah e Mané formam um tridente atacante temível.

Um dia perguntaram-lhe as diferenças do seu estilo de jogo no Liverpool relativamente ao Arsenal que na altura era treinado por Arsène Wenger. E a resposta foi clara. "Ele gosta mais de ter posse de bola, fazer passes. É mais ao estilo de uma orquestra. Mas é uma música silenciosa. Eu gosto mais de rock and roll, de heavy metal", referiu, rejeitando também na altura comparações com José Mourinho: "Special One? Não, eu sou um Normal One."

Jürgen Klopp foi um médico falhado (não teve média suficiente para seguir medicina) e um jogador de futebol mediano (atuava como central), como um dia se intitulou: "Como jogador tinha a habilidade de um futebolista de V divisão, com o cérebro de atleta de I Divisão. O resultado foi um futebolista de II Divisão." Representou durante 11 anos o Mainz e depois esteve oito anos como treinador do clube alemão, levando a equipa ao principal escalão do futebol germânico e chegando inclusivamente a posições que permitiram ao Mainz jogar na Taça UEFA em 2005-06.

Em 2007-08, o clube baixou novamente ao segundo escalão, mas, apesar de propostas melhores, manteve-se no cargo, demitindo-se no final da temporada depois de não ter conseguido subir de divisão. Depois, a história é conhecida. Seguiu-se o Borussia Dortmund e o Liverpool a partir de 2015. Antes do Dortmund, chegou a estar nos planos do Hamburgo, mas acabou por ser descartado alegadamente devido à sua imagem pouco cuidada, sempre com a barba por fazer e por na altura andar sempre com um gorro de basebol.

O tão ambicionado título de campeão inglês, que o Liverpool perseguia há 30 anos, chegou finalmente nesta quinta-feira, com a equipa a festejar no sofá. Uma missão cumprida por Klopp após quase cinco anos no cargo, depois de um oitavo lugar na sua primeira temporada, dois quartos lugares nas épocas 2016-17 e 2017-18 e de um segundo posto na última temporada.

Este é o quarto título do técnico germânico pelos reds (o primeiro a nível de campeonato inglês), depois da Liga dos Campeões 2018-19, da Supertaça Europeia (2019) e do Mundial de Clubes (2019), prova na qual derrotou na final o Flamengo de Jorge Jesus.

Entre os campeões também há um português, Vítor Matos, que integra a equipa técnica de Jurgen Klopp.