Juros da dívida nacional registam das maiores quedas desde início da pandemia

Taxas de juro de Portugal aliviam para perto de 1% com os três anúncios do BCE e as promessas de uma bazuca da parte da União Europeia
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As taxas de juro de longo prazo da dívida portuguesa (OT, as obrigações do tesouro a dez anos) registaram esta sexta-feira, no fecho dos mercados secundários de OT, uma das maiores descidas desde que começou a pandemia do coronavírus, no final de fevereiro. Podemos equiparar esse alívio diário a menos 11% no custo da dívida. É o efeito das medidas sem precedentes do Banco Central Europeu (BCE) e da prometida "bazuca" por parte da Europa para o Fundo de Recuperação da crise.

Embora as taxas de juro de Portugal e de muitos países do euro estejam a ser afetadas por enorme volatilidade, certo é que as sucessivas medidas que têm sido anunciadas parecem estar a acalmar o custo do endividamento em mercado aberto. No caso da República Portuguesa, isso é evidente. No fecho desta sexta-feira, as OT nacionais estavam a negociar com uma taxa de juro de 1,075%, refletindo uma redução significativa superior a 0,13 pontos percentuais. É a terceira maior descida desde final de fevereiro.

A maior quebra (menos 0,37 pontos) aconteceu a 19 de março, logo após o BCE anunciar o programa de compras de dívidas, avaliado em 750 mil milhões de euros.

Uma semana depois, a 26 de março, com os mercados em tumulto e com dúvidas crescentes sobre a capacidade da Europa se unir para responder à crise, o BCE de Christine Lagarde haveria de ampliar ainda mais o alcance daquele pacote de quantitative easing (QE).

De acordo com a lei, nestes programas de compras de dívida, o BCE está limitado. Só pode adquirir até um terço (33%) das OT de cada país do euro que estejam na posse dos bancos comerciais, o que limita bastante a quantidade de títulos que o Eurossistema pode absorver e transformar em dinheiro a custo zero.

Nesse dia 26, Christine Lagarde, a presidente do banco central, avançou com algo de relevo. O tal limite legal à compra de linhas de obrigações cai temporariamente. Em vez de um terço, o BCE poderá comprar tudo o que houver. Nas taxas de juro o efeito foi imediato. Foi a segunda maior descida nestes tempos de crise aguda, no caso das OT portuguesas.

Mas o BCE continuou. Esta semana, anunciou que, também a título temporário, também vai aceitar dívida chamada nos mercados de "não-investimento", "especulativa", "lixo". O efeito dissuasor contra a especulação e a cortes agressivos nos ratings de muitos países endividados, como Itália, Grécia e Portugal, é imediato e evidente.

O BCE atirou-se para o território da dívida "junk" na véspera do Conselho Europeu, que não decidindo muito, mandatou a Comissão Europeia que desenhe um Fundo de Recuperação para a Europa que pode ir até aos 1,5 biliões de euros (do qual Portugal pode extrair entre 20 a 25 mil milhões de euros, dependendo das condições). Um plano que só deve durar "dois, três anos", disse António Costa, o primeiro-ministro de Portugal, que está a negociar esta género de "plano Marshall", como já lhe chamou.

25 mil milhões para Portugal?

Problema: embora haja "unanimidade" para a parte de onde vem o dinheiro (virá de endividamento direto da Comissão Europeia nos mercados que, não sendo dívida mutualizada ou Eurobonds, anda lá perto), continua tudo muito confuso e em desacordo sobre as condições para escoar o dinheiro para os países.

Se a chave de repartição for a que costuma ser usada em termos clássicos, ela rondará no caso de Portugal os 2%, o que dará cerca de 25 mil milhões de euros. Mas o Conselho Europeu deixou isto e muito mais em aberto. Falta saber quanto será canalizado para cada Estado-membro, mas mais importante ainda: de que forma.

Costa disse que "uma larga maioria dos estados defendeu que fosse via subvenções", isto é, que o dinheiro venha a fundo perdido, como os fundos da coesão. Os clássicos subsídios, basicamente.

"Alguns estados membros admitiram que pode ser através de uma combinação justa entre subvenções e dívida". Neste grupo estará a poderosa Angela Merkel, da Alemanha, que Costa elogiou várias vezes pela postura "construtiva" com que esteve na reunião.

Finalmente, existe uma "pequena minoria" de "quatro países" (onde deverá estar a indefectível Holanda, acompanhada pela Áustria, Dinamarca e Suécia) "que defende que só os empréstimos são a forma válida" para escoar o fundo pelos 27 países.

Qualquer que seja a decisão final, o Conselho precisa de consenso, unanimidade. Todos terão de estar de acordo.

Sobre quando estará o Fundo pronto, dúvidas. Costa espera que seja antes do final deste ano. Problema: ainda estamos em abril e a crise em crescendo.

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