Braço-de-ferro a três: Cavaco, Marcelo e Costa
Marcelo parece ter-se sentido provocado por Cavaco Silva? Sim, mas não só. Se, por um lado, as críticas ao pacote da Habitação do governo surgem na sequência das palavras duras de Cavaco Silva ao executivo, por outro lado Marcelo já tinha sido bastante contundente no discurso de Ano Novo e, mais recentemente, na entrevista que concedeu à RTP e ao Público.
O antigo primeiro-ministro e ex-Presidente da República, Cavaco Silva, acusou o governo de ter lançado planos que "ficaram no papel e no PowerPoint". O atual Presidente da República, Marcelo Rebelo de Sousa, diz que se trata de uma "lei-cartaz" e que, tal como está concebida "é inoperacional", não passa de programação e de um panfleto, sublinha. No centro da polémica está o arrendamento coercivo.
António Costa conseguiu, de uma assentada, pôr os dois Presidentes contra o pacote da Habitação, precisamente aquele que o atual primeiro-ministro gostaria de deixar como marca do seu mandato, como recentemente relataram ao Diário de Notícias os autarcas socialistas espalhados pelo país. Aliás, denunciaram que se sentem "pressionados" a executar o plano de Costa a que Marcelo chama "inoperacional". Costa respondeu ontem que cada um deve atuar e falar no momento próprio.
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Os Presidentes, Cavaco e Marcelo, comentaram um assunto que ainda está no Parlamento e já foram criticados por isso. Mas o tema é tão importante para a sociedade portuguesa que nem todos se viraram contra tais dirigentes.
O que fará Marcelo Rebelo de Sousa a seguir? Apesar de ter já promulgado apoio às rendas e ao crédito à habitação, lamenta que não se vá mais longe e tem sérias dúvidas quanto à execução do resto do plano. Além disso, a iniciativa do governo levanta interrogações de legalidade, pelo que o Presidente pode enviar o documento para o Tribunal Constitucional ou então acionar diretamente o veto, opção que não está fora de jogo.
E o que fará o governo de António Costa? Pelas palavras da ministra da Habitação, Marina Gonçalves, e do próprio primeiro-ministro, ontem no Parlamento, ainda não se percebeu se o executivo fará ouvidos de mercador às críticas da oposição e dos Presidentes ou se admite ajustar e acrescentar medidas, de modo a que o veto não seja o seu destino final.
Após as críticas de Cavaco e de Marcelo, que falou também numa maioria "requentada" e "cansada", a Habitação parece ser o pretexto para um braço-de-ferro com Costa. Com tensão no ar e uma narrativa cada vez mais crispada, o país perde tempo e a oportunidade de resolver um dos dramas da década: a falta de habitação acessível para os portugueses.
Diretora do Diário de Notícias