Técnicos de saúde esperam "bom senso" no Natal para não entupir cuidados intensivos

Os doentes de covid-19 internados em cuidados intensivos são 511 esta quarta-feira. Os intensivistas respiram um pouco melhor, mas temem que subam em flecha com a quadra natalícia. Os meios humanos são escassos.

Fernando Miranda é enfermeiro intensivista, trabalha no Serviço de Medicina Intensiva do Hospital de São João, no Porto, há 15 anos. A escassez de meios humanos tem sido uma constante: "Fracos recursos para respostas excecionais", conclui, para sublinhar: "Esta intensidade de trabalho já é assim há muitos anos, talvez seja isso que nos tem permitido dar uma resposta positiva."

Nos últimos dias, tem-se assistido a uma redução de doentes nas unidades de cuidados intensivos (UCI). Nesta terça-feira (22 de dezembro) eram 508 os infetados com o SARS-CoV-2 nos intensivos, mais seis do que na véspera, num total de 3095 pessoas internadas. O valor mais alto de camas ocupadas nestas unidades foi de 536, no dia 29 de novembro.

O enfermeiro, especializado em enfermagem médica cirúrgica, e que tanto cuida de doentes covid como não covid, espera que a tendência de diminuição se mantenha. "Gostaria de acreditar que a sociedade em geral vai cumprir as medidas decretadas pelo governo, mas, tendo em conta o último pico, penso que haverá um aumento de novos casos depois do Natal. Espero que haja bom senso da população."

Bom senso é o que também pede Noel Carrilho, presidente da Federação Nacional dos Médicos. Critica que não houve melhorias a nível dos recursos humanos no Serviço Nacional de Saúde (SNS), salientando que os profissionais não conseguem "gozar o tempo a que têm direito".

"O que os médicos receiam não será muito diferente do que receiam todos os portugueses, que haja o agravamento da pandemia. Os cuidados intensivos são uma preocupação desde o início e tem a ver com a insuficiência de recursos, ninguém estava preparado para as consequências da pandemia, mas esse investimento deveria ter sido feito há muitos anos", argumenta Noel Carrilho.

Com a crise sanitária, o médico salienta que houve um investimento tecnológico e uma reorganização dos serviços, mas não há mais médicos, enfermeiros, técnicos auxiliares, etc., e estes não esticam. "Faltam intensivistas, esse investimento deveria ter sido realizado tendo em vista novas fases da pandemia, nomeadamente para atrair profissionais que não estão no SNS. Têm aumentado o número de camas nos cuidados intensivos, às vezes alocadas a outras unidades, mas os recursos médicos continuam os mesmos", diz o dirigente da FNAM.

1021 camas em intensivos

O último balanço da ministra da Saúde, há sensivelmente um mês, indicava 1021 camas de cuidados intensivos e 566 de cuidados intermédios. Destinam-se a doentes com o SARS-CoV-2 e com outras patologias, como doentes coronários ou outros casos graves.

Em relação ao equipamento hospitalar, Portugal "tinha no início da pandemia 1142 ventiladores, e desde março foram distribuídos mais 749 equipamentos de ventilação assistida", referiu Marta Temido.

Em outubro, a governante anunciou a abertura de um concurso para 48 médicos intensivistas e a previsão de um novo concurso para 46 médicos intensivistas no início de 2021. "A necessidade de mais médicos de medicina intensiva foi evidenciada com a pandemia de covid-19, onde estes profissionais têm estado na linha da frente nos hospitais no combate à doença", justificou a ministra da Saúde. A doença causou 6134 mortes em Portugal até este domingo.

A especialidade de medicina intensiva com informação de raiz só existe desde 2016. Têm sido os médicos de outras áreas, especialmente a medicina interna e também pneumologia, a completar os estudos para trabalharem nos cuidados intensivos.

Enquanto não chegam os reforços, os profissionais das várias especialidades que trabalham nas UCI foram sensibilizados para não gozarem férias durante a quadra natalícia. "Existiu um pedido para que os profissionais, que assim o entendessem, não metessem férias", diz Fernando Miranda. O enfermeiro vai trabalhar no dia de Natal e nos dias 31 de dezembro e 1 de janeiro. E, nas noites de 24 para 25 e de 31 para 1, estará de prevenção no âmbito do programa ECMO (oxigenação por membrana extracorporal, técnica de suporte vital extracorporal).

Fernando Miranda diz estar preparado para o que vier nos próximos dias, embora "preocupadíssimo". Recorda os surtos de covid-19 em Penafiel e que levou à rutura do hospital local, que teve de transferir infetados para outras unidades hospitalares da região.

Ainda assim, considera ter passado os momentos mais difíceis durante a primeira vaga da pandemia, quando eram muito maiores as incertezas relativamente às consequências do SARS-CoV-2 e tudo foi organizado de raiz. "O ponto mais crítico foi em finais de março e início de abril, não estávamos preparados, não sabíamos com o que contar, foi um grande desgaste. Neste momento, não quer dizer que não haja desgaste, mas conseguimos identificar a situação. No início, os doentes chegavam muito mal, o que acaba por ser mais exigente, também para com os familiares, que não os podiam visitar e era difícil explicar-lhes a situação. Mas considero que acabámos por dar uma resposta excecional", sublinha Fernando Miranda, que apela à população portuguesa para cumprir as regras.

A Direção-Geral da Saúde emitiu dez orientações para este período: cumprir as regras de mobilidade para ajuntamentos no concelho onde vive; quem estiver doente, com sintomas ou em isolamento profilático, tem de estar confinado; reduzir os contactos antes e durante esta quadra; ter menos tempo de exposição e, se possível, usar os espaços exteriores; não mudar de agregados familiares durante a quadra festiva; limitar as celebrações às pessoas com quem habita, manter o distanciamento físico em todos os momentos (transporte, preparação das refeições, convívios, etc.); evitar os cumprimentos tradicionais; garantir o arejamento dos espaços e a desinfeção das superfícies, bem como dos objetos de partilha; lavar ou desinfetar as mãos frequentemente, usar a máscara de forma adequada e manter etiqueta respiratória; evitar a partilha de objetos.

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