A vida insiste em dar-nos razões para andarmos maldispostos: são as contas para pagar, a maldita dor nas costas, a chuva, o patrão, a derrota do clube... Porque nos haveríamos de espantar com os cretinos no trânsito? Ou com as trombas da funcionária das finanças? Ou com a indiferença do empregado de mesa? As vidas são difíceis, ganhamos pouco, temos problemas, estamos cansados... Já muito faz a gente, não é?.Era, mas já não é, desde que conheci o vendedor da Cais que costuma estar na Rua Engenheiro Canto Resende, junto ao Corte Inglés. O senhor, que coxeia ligeiramente, move-se entre os automóveis com uma simpatia absurda, brinca com as crianças, faz caretas cómicas e encolhe os ombros apontando para o preço da revista, são dois euros, dois euros apenas. O senhor, de quem não sei o nome, ganha certamente menos do que nós, vive pior do que nós, trabalha na rua de pé e ao frio e mesmo assim sorri e faz sorrir.. O vendedor da Cais trocou o direito ao mau humor pelo dever da simpatia, a ele e a todos nós..Escritor