Há uma fila de pessoas em frente de uma cadeira vazia no pavilhão da Porto Editora. O escritor angolano Eduardo Agualusa está quase meia hora atrasado para a sessão de autógrafos, mas isso não parece demover os leitores que têm nas mãos os volumes coloridos de O Vendedor de Passados e A Educação Sentimental dos Pássaros. Na Praça Laranja há outro escritor atrasado que tem uma pequena multidão à sua espera. Já não há cadeiras vazias para assistir à apresentação do livro de Ricardo Araújo Pereira, Mixórdia de Temáticas - Série Lobato. "Ele só vem quando acabar o futsal", comenta alguém. Virá, então, mais bem-disposto, com a vitória do seu Benfica..Está calor nesta última tarde de Feira do Livro no Parque Eduardo VII, em Lisboa. Famílias inteiras passeiam de gelados numa mão e sacos de livros na outra (sacos de papel, quase todos, uma novidades neste ano). No pavilhão da Almedina, o músico Pedro Branco toca guitarra e vai cantando umas canções. A Princesa Poppy distribui abraços pelas crianças e tira fotografias. Assim como o Garfield. O Lobo Mau. O Estranhão. E a Bruxa Mimi. No pavilhão da Gradiva, o Instituto de Astrofísica e Ciência do Espaço instalou um telescópio apontado "à nossa estrela", que é como quem diz ao Sol. Espreita-se e só se vê uma enorme mancha branca. "À noite, vamos ver a Lua." Na esplanada da Presença, Isabel Monteiro, tradutora e professora de Português, recolhe assinaturas para a ILCAO - Iniciativa Legislativa de Cidadãos contra o Acordo Ortográfico. "Ainda podemos alterar a lei", garante. "Basta haver vontade política.".A Feira do Livro terminou neste domingo após duas semanas de atividades aparentemente sem nenhum incidente nem grandes polémicas. Os 328 pavilhões - mais 32 do que no ano passado - permitiram acolher 25 novos participantes. Ainda não é possível fazer um balanço quantitativo desta 89.ª edição, mas a sensação partilhada por algumas das pessoas com que nos cruzámos na feira é que "esteve tanta gente quanto no ano passado" ou, talvez, mais. Em 2018, a APEL - Associação Portuguesa de Escritores e Livreiros, organizadora do evento, estimava o número de visitantes em cerca de 492 mil..Valter Hugo Mãe, Camus, John Steinbeck, Luis Sepúlveda - estes foram seguramente alguns dos autores mais vendidos no pavilhão da Porto Editora, revela Nuno Vieira de Almeida, diretor de comunicação. "Não temos ainda os números finais de vendas, mas o balanço é francamente positivo", diz. "O essencial da feira é ser um ponto de encontro entre editores, autores e leitores, e nós continuamos a apostar muito na presença dos escritores na feira, achamos que é mesmo importante. A Feira do Livro é um espaço privilegiado para o encontro com os leitores.".Desde a inauguração, a 29 de maio, a Porto Editora teve mais de 200 eventos, entre sessões de autógrafos, apresentações de livros, tertúlias, clubes de leitura. "Tentamos ter eventos variados, ir para além da tradicional apresentação do livro", explica Nuno Vieira de Almeida. Houve ilustradores a desenhar na feira, sessões de leitura e dramatizações para os mais novos, receitas deliciosas preparadas ao vivo..Sem ter ainda números finais para apresentar, José Menezes, diretor de comunicação da Leya, garante que esta edição da Feira do Livro "está em linha com a do ano passado, que foi excelente, um dos melhores anos para nós". Como sempre, o megapavilhão da Leya, onde se juntam as várias editoras do grupo, teve uma programação intensa, como mais de 200 sessões de autógrafos e a presença de mais de 120 autores, "com grande adesão do público"..José Menezes destaca ainda como um dos fatores mais positivos desta feira para a Leya o lançamento, no passado dia 1, Dia Mundial da Criança, do Clube de LeYtura: um clube para os leitores mais novos (até aos 13 anos) em que os sócios pagam 9,90 por mês e têm direito a dois livros - podem ser os dois livros sugeridos pela editora ou outros dois dentro de 20 opções para cada faixa etária. "Temos feito a promoção do clube na feira e tem corrido muito bem, já temos um número de adesões que vai para além das nossas expectativas", diz o responsável, sublinhando que a Feira do Livro "é o ponto de encontro das pessoas que gostam de livros", por isso é normal que se tenham interessado por esta iniciativa..Numa feira que se diz mais amiga do ambiente e das famílias, houve alguns puristas que comentaram nas redes sociais que o espaço dedicado aos comes e bebes é tão grande quanto o espaço dedicado aos livros. Há barracas de farturas e pipocas, hambúrgueres e cachorros, pregos, pitas, sandes de presunto serrano, pratos veganos, waffles, sumo de laranja natural e mais uma série de outras iguarias, mais tracionais ou mais gourmet (ou uma junção disso, como é o caso das farturas gourmet preparadas com água mineral). E é verdade que o espaço de esplanadas e de lazer tem aumentado todos os anos - mas isso será algo a criticar? "Isto não é um evento de farturas", responde Nuno Vieira de Almeida. "É uma festa dos livros e as pessoas vêm cá por causa dos livros. Mas é uma festa. Queremos que as pessoas se divirtam e que passem aqui algum tempo, por isso tem de ter de tudo." Há quem se estenda no relvado ao sol e há quem prefira estar sentado à sombra, mas o que todos querem mesmo é aproveitar os descontos no preço dos livros.."Agora que a feira acaba, é o tempo de fazermos a nossa reflexão sobre o que correu bem ou não", diz o porta-voz da Porto Editora. "Preocupamo-nos com a acessibilidade aos nossos espaços, queremos ter um programa sempre mais diversificado e queremos que o serviço das caixas seja sempre mais rápido, queremos sempre fazer melhor."