Governo: na remodelação alargada, há uma escolha de risco

Primeiro-ministro surpreendeu com maior mexida no governo, com a saída de quatro ministros, a entrada de três e alterações na orgânica. Mas Siza Vieira está dependente de avaliação do Tribunal Constitucional.

Depois da demissão do ministro da Defesa, António Costa surpreendeu com uma remodelação alargada, com a saída de quatro ministros, a entrada de três novos e a mexida na orgânica de mais dois gabinetes. Mas há uma dose de risco, mais ou menos calculado pelo primeiro-ministro, em manter Pedro Siza Vieira, que viu até o seu poder formalmente reforçado.

O agora ministro adjunto e da Economia pode estar a prazo no executivo socialista, uma vez que está dependente da avaliação do Tribunal Constitucional sobre se deve ser demitido ou não, por eventual incompatibilidade de funções.

Comecemos por onde tudo começou: com a saída de Azeredo Lopes de ministro da Defesa, cuja demissão foi anunciada na sexta-feira, António Costa chamou o embaixador João Gomes Cravinho, um experiente diplomata e antigo secretário de Estado da Cooperação, para apaziguar uma pasta que tem dado muitas dores de cabeça ao executivo, sobretudo depois do roubo de armas do paiol de Tancos.

O primeiro-ministro aproveitou ainda para mexer em pastas que têm dado outras dores de cabeça ao governo: na Saúde, onde a contestação permanente do setor mantinha em lume brando Adalberto Campos Fernandes; e na Cultura e na Economia, em que Luís Filipe Castro Mendes e Manuel Caldeira Cabral eram duas inexistências.

Na Economia, Costa optou por formalizar aquilo que o seu amigo de longa data já era no governo: o verdadeiro ministro da Economia. Pedro Siza Vieira soma agora essa pasta, mas perdendo a energia, que passou para o ministro do Ambiente. Incompatibilidades oblige: o até agora ministro adjunto já tinha pedido escusa, nas suas funções, de intervir em assuntos relacionados com energia - foi sócio da sociedade de advogados que representa a empresa China Three Gorges, que é a maior acionista da EDP.

Siza Vieira teve outro tropeção: assumiu funções no governo quando ainda era sócio-gerente de uma empresa imobiliária familiar e, por isso, pode vir a ser demitido. Os juízes do Tribunal Constitucional já têm em mãos o parecer do Ministério Público sobre essa eventual incompatibilidade, mas não têm data para divulgar o acórdão de uma decisão, que terá de ser discutida em plenário.

Para a Saúde, Costa convidou Marta Temido, conimbricense, de 44 anos, atual subdiretora do Instituto de Higiene e Medicina Tropical, é licenciada em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra, doutorada em Saúde Internacional e presidiu ao conselho diretivo da Administração Central do Sistema de Saúde.

Pelo menos, para já, Marta Temido merece o benefício da dúvida do Bloco de Esquerda. O deputado Moisés Ferreira notou que a nova ministra, numa entrevista em julho passado, falou "na necessidade de haver mais verbas para o SNS e de uma visão estratégica que fosse para além da mera injeção pontual de capital para pagamento de dívida", para além de apontar outras medidas "que o Bloco de Esquerda tem defendido e proposto em vários momentos". Moisés Ferreira deixa um desejo: "Que este seja o momento de as colocar em prática e que não se fique pelas intenções e não se sucumba ao espartilho das finanças."

Na Cultura, António Costa recorreu uma vez mais ao seu inner circle, promovendo a atual secretária de Estado adjunta e da Modernização Administrativa a ministra. Graça Fonseca acompanha o primeiro-ministro desde os tempos de Costa no Ministério da Justiça, no segundo governo de António Guterres; depois, foi chefe de gabinete do atual primeiro-ministro, entre 2005 e 2007, quando Costa assumiu a pasta da administração interna; e esteve na Câmara Municipal de Lisboa, como vereadora de Costa, entre 2009 e 2015.

Graça Fonseca é, aos 47 anos, dirigente do PS e foi a primeira política portuguesa a assumir publicamente que é homossexual.

Outra saída que estará em cima da mesa é a do secretário de Estado da Energia. Como recordou o Presidente da República, na nota divulgada no site sobre a exoneração dos governantes e os novos ministros, "cessam igualmente funções os secretários de Estado com a exoneração do respetivo ministro". Jorge Seguro Sanches estará de malas aviadas, depois do confronto público entre EDP e o governo.

O Bloco de Esquerda lançou a suspeita: o secretário de Estado acabou "remodelado" depois de Eduardo Catroga, membro do Conselho Geral e de Supervisão da EDP, ter "agoirado" que a "indignação dos acionistas em relação ao governo" seria "passageira". António Costa terá de explicar bem a eventual saída de Seguro Sanches.

António Costa fechou o Orçamento do Estado para 2019 no sábado, numa reunião que se prolongou por 11 horas, no domingo de manhã fez sair a notícia da remodelação, e esta segunda-feira remata estes dois dossiês: às 12.00, no Palácio de Belém, é a tomada de posse dos cinco ministros e durante o dia (eventualmente já noite dentro) fará chegar a proposta de lei do Orçamento à Assembleia da República.

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