Comissão de inquérito a Tancos tem 180 dias para apurar responsabilidades políticas
A comissão de inquérito parlamentar ao furto de armas em Tancos, revelado pelo Exército a 28 de junho de 2017, inicia formalmente os seus trabalhos nesta quarta-feira com a posse do socialista Filipe Neto Brandão como presidente.
A posse é dada pelo presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues, numa cerimónia em que são também indicados os vice-presidentes e os coordenadores dos grupos parlamentares. A comissão tem 180 dias para concluir os seus trabalhos, embora possam ser prolongados por mais 90 dias.
Em causa está o furto de material de guerra nos paióis do Exército em Tancos, que continua sob investigação do Ministério Público e cujas conclusões continuam a ser exigidas pelo Presidente da República, "doa a quem doer".
Os centristas querem apurar as eventuais responsabilidades políticas do governo nesse caso, bem como o processo posterior que conduziu à recuperação das armas e já levou à detenção de nove pessoas, oito das quais militares: cinco da PJ Militar (PJM) e três da GNR de Loulé.
Os trabalhos propriamente ditos da comissão só começam depois de Filipe Neto Brandão marcar, ainda hoje, uma reunião com os diferentes coordenadores para - em princípio ainda nesta semana - se decidir o dia e a hora em que volta a reunir-se, bem como para definir o prazo de apresentação das audições a realizar e das listas das personalidades a ouvir, explicaram fontes parlamentares.
Os coordenadores de cada partido são Berta Cabral (PSD), Ascenso Simões (PS), Telmo Correia (CDS), João Vasconcelos (BE) e Jorge Machado (PCP).
O CDS, que requereu a criação da comissão para serem apuradas as eventuais responsabilidades políticas do governo nesse caso, ainda "está a definir" a lista das individualidades que pretende ouvir no Parlamento, disse ao DN o seu líder parlamentar, Nuno Magalhães.
Nuno Magalhães escusou-se a indicar nomes a chamar ao Parlamento. Sobre a possibilidade de ouvir o primeiro-ministro, limitou-se a responder que isso "parece bastante provável e até imprescindível" face aos dados já conhecidos sobre o caso.
A verdade é que figuras como o antigo ministro da Defesa Azeredo Lopes e o ex-chefe do Estado-Maior do Exército, general Rovisco Duarte, serão chamados pelos centristas, assim como o tenente-general Martins Pereira (ex-chefe de gabinete de Azeredo Lopes) e antigos elementos da PJM como o coronel Luís Vieira e o major Vasco Brazão.
As diferenças entre as listas do material furtado e do recuperado, saber se isso resulta de falhas no inventário, o grau de cooperação entre civis e militares quando os responsáveis máximos pelos serviços de informações e de segurança interna só souberam do caso no dia seguinte à descoberta do furto e pela imprensa, qual a responsabilidade da cúpula do Exército nas falhas estruturais de segurança e vigilância do local, quem e até onde conhecia a operação forjada da PJM para recuperar as armas e porque é que o MP não foi avisado quando os responsáveis militares avisaram Martins Pereira e depois Azeredo Lopes ou o envolvimento da GNR de Loulé são outras questões a esclarecer pelos deputados.
Contudo, o segredo de justiça em que estão as investigações do MP ao furto e à recuperação do material poderão condicionar o decorrer dos trabalhos e o acesso a toda a informação existente, conforme afirmou à Lusa o comunista Jorge Machado.
Isso já tinha ficado patente durante as muitas audições realizadas pela comissão parlamentar de Defesa desde julho de 2017 e que, após o general Rovisco Duarte invocar essa situação para não entregar informações pedidas pelos deputados, levaram o Parlamento a requerer à Procuradoria-Geral da República esclarecimentos e acesso às listas do material furtado e recuperado.
Assim como Rovisco Duarte, outros responsáveis que agora vão ser chamados à comissão de inquérito já foram ouvidos na comissão de Defesa - e, no caso do ex-ministro Azeredo Lopes, por quatro vezes.
A maioria dessas audições ficou marcada por um clima de forte animosidade contra Azeredo Lopes e Rovisco Duarte por parte do CDS e também do PSD, bem como entre estes partidos e deputados do PS, em parte pela recusa de ambos em assumirem responsabilidades pelo caso através da demissão. com Lusa