Uma hora ao ar livre, falta ao trabalho e a sessões nos tribunais e uma visita dos familiares por semana em vez de duas. Esta vai voltar a ser a rotina dos presos a partir de 16 de janeiro quando os guardas prisionais iniciarem o primeiro período de greve de 2019. A paralisação decretada pelo Sindicato Independente do Corpo da Guarda Prisional (SICGP) vai durar até 3 de fevereiro. E não está afastada a hipótese de serem marcadas novas datas de protesto..São 19 dias em que o ambiente dentro das 49 prisões nacionais - onde estavam a 31 de dezembro 12 739 reclusos, 815 deles mulheres - pode voltar a ficar carregado e propício a demonstrações de revolta dos presos como aconteceu em diversas cadeias durante o mês de dezembro do ano passado, período em que se cumpriram vários dias de greve dos guardas..As reivindicações do Corpo da Guarda Prisional passam pela exigência de uma revisão do estatuto, atualização da tabela remuneratória, criação de novas categorias, novo subsídio de turno, alteração do horário de trabalho e pretensão também de novas admissões..São questões em negociação há vários meses, mas sem que os sindicatos e o Ministério da Justiça cheguem a acordo. Para já, segundo disse ao DN Júlio Rebelo, presidente do SICGP, as "estruturas sindicais só foram chamadas ao ministério para reuniões no final do mês [janeiro]"..Perante este cenário, o sindicato avançou com um pré-aviso de greve que vai começar a cumprir a partir de quarta-feira, o que leva a Associação Portuguesa de Apoio ao Recluso (APAR) a alertar para a perversidade de um protesto que "só prejudica os presos"..Vítor Ilharco, dirigente da associação, explica: "Durante a greve só saem da cela para almoçar, têm direito apenas a uma hora a céu aberto, não vão trabalhar [o chamado regime aberto que possibilita que possam trabalhar durante o dia regressando à cadeia após o horário laboral], nem estudar, não podem receber o advogado e só podem fazer um telefonema por dia." O que "roça a ilegalidade, a inconstitucionalidade", acusa..Preocupações que a APAR apresentou no dia 8 quando foi recebida pela secretária de Estado adjunta e da Justiça, Helena Mesquita Ribeiro, governante a quem a associação frisou temer que a situação no sistema prisional possa piorar, incluindo com a intervenção das famílias dos presos..Ao DN, Vítor Ilharco adiantou que, ao contrário do que foi anunciado, não está prevista uma greve dos reclusos, até porque "seriam ainda mais prejudicados". "A paralisação serve para os guardas lutarem pelos seus direitos, mas deviam fazer tudo menos ir contra os poucos direitos que os reclusos têm", acrescenta, acusando os sindicatos de estarem a "usar os presos como arma para atingir os seus interesses".."A greve não afeta o Ministério da Justiça, os guardas recebem o ordenado por inteiro na mesma. Só os presos é que são afetados. A cadeia devia servir para reabilitar e punir, por esta ordem, mas com esta maneira de agir não é assim", salienta..Lembra, por exemplo, que como as cantinas dos estabelecimentos prisionais vão estar fechadas. "Não vai ser possível comprarem produtos de primeira necessidade como papel higiénico, produtos para limpar as celas, comida etc.", diz. Como atualmente o regulamento do sistema prisional não permite que as famílias levem comida ou tabaco, por exemplo, aos presos, o facto de o acesso à cantina ser restrito ou inexistente pode levar a protestos como aconteceram no mês passado com situações de caixotes incendiados em alguns estabelecimentos prisionais.."Eles vão estar fechados 22 horas por dia", refere Vítor Ilharco, sublinhando que no ano passado os guardas cumpriram mais de 300 dias de greve, uns de 24 horas, outros parciais.."Este é o primeiro período, outros virão"."O sindicato teve o cuidado de deixar dez dias de intervalo até esta greve para mostrar que temos boa vontade para resolver a questão. Mas, não se resolveu. Este é o primeiro período, outros virão." Júlio Rebelo, presidente do Sindicato Independente do Corpo da Guarda Prisional, explicou que a paralisação vai manter-se, pois desde dezembro não houve evolução na proposta do governo de equiparação dos guardas à PSP que tinha sido recusada. "A proposta deixava os guardas mais antigos na mesma, por isso não aceitámos", disse ao DN acrescentando que as estruturas sindicais - além do SICGP os guardas prisionais têm outra entidade que os representa, o Sindicato Nacional do Corpo da Guarda Prisional - "foram chamadas ao ministério para o final do mês [de janeiro]"..Reunião que se segue à de dezembro em que o Ministério da Justiça apresentou a proposta de promover 133 elementos a guardas principais e a atualização da tabela remuneratória, idêntica à da PSP. Isso mesmo disse a ministra Francisca van Dunem, na passada terça-feira na Comissão Parlamentar de Direitos, Liberdade e Garantias, onde foi falar sobre a situação vivida no último mês de 2018 nas cadeias, nomeadamente no Estabelecimento Prisional de Lisboa e no Linhó, além das várias greves dos guardas. Nesse dia a governante reconheceu que a "situação não se pode manter, não é sustentável e por isso o governo reuniu-se com os sindicatos e aguardamos resposta". .Para já a resposta foi a marcação deste novo período de greve em que, segundo o dirigente do SICGP, os presos vão ter direito "a uma visita semanal em vez das duas normais, não haverá idas a tribunal nem a consultas exceto os tratamentos em especialidades obrigatórias [tuberculose, HIV e de oncologia], o trabalho vai ser afetado e só poderão ir uma vez durante a greve à cantina". Não serão afetados os presos que têm direito a saída precária e quem "trabalhe no exterior, tal como a formação", garantiu..Em dezembro existiram diversos protestos nas cadeias nacionais, tendo o Estabelecimento Prisional de Lisboa sido o centro da situação mais complicada quando os presos foram avisados de que não iriam ser autorizadas as visitas devido a um plenário dos guardas. Durante cerca de uma hora os reclusos da Ala B do EPL incendiaram caixotes do lixo e colchões e partiram mesas e cadeiras, levando à intervenção do Regimento de Sapadores Bombeiros de Lisboa.