Um português 15 dias em Berlim são 4 meses de um alemão em Lisboa

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Se Portugal está muito melhor, porque é que não o sentimos? É a pergunta para 1 milhão de euros e que ganha força depois de ontem o FMI ter pintado um quadro muito mais alegre - até do que prevê o governo - das perspetivas para a nossa economia. Prevê a instituição que o país consiga gerar mais riqueza neste ano, mesmo sem ajuda do consumo - e aqui já se começa a entender a divergência - e até com um arrefecimento nas exportações, montado num turismo cuja pujança continua a surpreender.

Em resumo, são excelentes as notícias que nos chegam do Fundo. O problema é que pouco deste resultado é colheita de planeamento, investimento sustentado e abertura de caminhos que permitam atingir os bons objetivos que todos desejamos. Pelo contrário, é resultado que temos a sorte de lograr apesar de escolhas e políticas primariamente avessas ao investimento, como a instabilidade legislativa e fiscal e a penalização ideológica dos novos modelos de negócios que ajudaram a impulsionar o turismo, do alojamento local às plataformas digitais, passando por instrumentos de captação de investimento estrangeiro como o regime dos residentes não habituais ou os vistos gold.

O problema da sorte é que um dia acaba-se. E é esse um dos principais motivos para se poder dizer com bastante segurança que, infelizmente, o incremento no PIB continuará a estar longe de se sentir nas carteiras das famílias, emagrecidas pela subida dos custos e cujos rendimentos se manterão mais ou menos congelados e cortados a metade pela voracidade da máquina fiscal. Sozinho, o turismo não pode tudo. Sem planeamento estratégico, sem diversificação, sem fortalecer a produtividade, sem investir na inovação que permitirá competir num mundo global e com níveis de investimento miseráveis como os que vimos tendo, o crescimento do PIB não traduz verdadeiramente criação de riqueza duradoura e multiplicável. E sem isso não haverá melhoria das condições de vida, apenas esmolas financiadas pelo confisco fiscal.

Para as empresas, essa realidade é ainda mais pesada na medida em que os impostos afetam não apenas a capacidade de investir em pessoas - recorde-se que temos uma das maiores cargas fiscais sobre o trabalho entre os países da OCDE - como de alocar orçamento à inovação e à criação de valor, fatores essenciais para melhorar a competitividade e a produtividade. Até as que têm melhores resultados, uma vez que os impostos cobrados à medida das necessidades redistributivas e de financiamento da obesidade do Estado penalizam estas em maior medida.

De acordo com os números do INE e do Banco de Portugal, o crescimento médio anual do país nas últimas duas décadas não chegou à fasquia de 1%. Uma miséria. Mesmo com anos de evolução mais forte, como este que o FMI agora projeta. Enquanto o crescimento não for suportado em investimento sério, público e privado, em planeamento consistente e a prazo, não poderá fazer-se sentir verdadeiramente na economia. Não deixaremos de ser o país que está melhor, sem que os portugueses sintam melhorias na sua vida. O país que ocasionalmente cresce a melhor ritmo do que a União mas nunca consegue convergir para a qualidade de vida média europeia. Seremos eternamente o povo da fotografia tirada por Augusto Mateus: os que têm margem para passar 15 dias de férias na Alemanha, enquanto vemos os alemães dar-se ao luxo de aqui poder gozar 4 meses por ano.

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