Guedes faz de Eder e a seleção de Fernando Santos volta a fazer história
E vão dois! Dois troféus conquistados pela seleção nacional à terceira final. Desta vez, não houve Eder como no Euro 2016, mas estava lá Gonçalo Guedes a marcar o golo que permitiu a Portugal vencer a Holanda por 1-0 e assim conquistar a primeira edição da Liga das Nações.
A equipa das quinas torna-se a primeira a deter os dois troféus de seleções da UEFA e Fernando Santos entra no restrito lote de selecionadores com dois títulos conquistados, juntando-se ao alemão Joachim Löw e ao espanhol Vicente del Bosque.
Quinze anos depois da desilusão vivida na final do Euro 2004 com a Grécia, os portugueses puderam finalmente fazer a festa em casa, num Estádio do Dragão efervescente, mas que merecia casa cheia... afinal, não é todos os dias que uma equipa nacional tem oportunidade de levantar um troféu. A seleção nacional fez por merecer a vitória, com uma exibição excelente e consistente, perante uma Holanda que nunca mostrou ser capaz de evitar a quarta derrota em outros tantos jogos em fases finais.
Após o triunfo por 3-1 diante da Suíça nas meias-finais, Fernando Santos mudou cinco jogadores, mas mais importante do que isso foi ter colocado jogadores nas posições que mais rendem, casos de Bernardo Silva e de Bruno Fernandes. Desta vez o 4x3x3 mostrou-se bem mais versátil, até porque Danilo Pereira dava um enorme equilíbrio e segurança como médio mais recuado e tinha jogadores capazes de acelerar o jogo, como Gonçalo Guedes, ou de colocar a bola rapidamente na frente, como Nélson Semedo, Raphaël Guerreiro, Bernardo e Bruno Fernandes.
A seleção holandesa manteve-se fiel aos princípios que apresentara diante da Inglaterra, sobretudo com a tentativa de ter sempre a bola, com um jogo de passes curtos e muito pacientes, à espera de que os três homens da frente, aos quais se juntava Wijnaldum, pudessem aproveitar os passes em profundidade e surpreender a defesa portuguesa.
Nos primeiros minutos do jogo, a Holanda mandou no jogo e colocou a equipa das quinas em dificuldades para sair para o ataque, com uma pressão forte no início de construção dos portugueses. Aos poucos, a equipa de Fernando Santos foi-se adaptando às circunstâncias e consentiu que os holandeses impusessem o seu estilo, sempre à espreita de que uma recuperação de bola permitisse uma transição rápida para colocar a defesa contrária em apuros.
A primeira vez que Portugal tentou chegar à baliza de Cillessen causou perigo, através de um remate de longe de Bruno Fernandes que William por pouco não desviou. As rápidas trocas de bola dos jogadores portugueses criavam muitos embaraços à defesa da Laranja Mecânica, que via invariavelmente Van Dijk ser o pronto-socorro da equipa. Impressionante a colocação e rapidez do defesa do Liverpool.
A verdade é que em todo o primeiro tempo a Holanda não fez um remate à baliza de Rui Patrício e, da única vez que esteve perto, valeu Rúben Dias a evitar que Bergwjin rematasse à entrada da área. Já Cillessen não teve descanso, sobretudo a partir do último quarto de hora antes do intervalo, quando a seleção nacional pressionou para chegar ao golo, com Bernardo Silva a dar um autêntico recital com o seu pé esquerdo e com Bruno Fernandes a testar o seu forte remate. O empate a zero ao intervalo era lisonjeiro para os holandeses, dos quais se esperava muito mais.
O sentido do segundo tempo manteve-se, com Portugal a procurar explorar a velocidade de Gonçalo Guedes, sobretudo em diagonais da esquerda para o meio, aproveitando a forma como Ronaldo arrastava a defesa holandesa. Contudo, foi a Holanda a assustar o Dragão quando Depay colocou José Fonte em dificuldades, acabando Rui Patrício por resolver um momento de grande atrapalhação.
Ronald Koeman, que ao intervalo tinha lançado Quincy Promes para o lugar do "inexistente" Ryan Babel, queria mais da sua equipa e lançou Van de Beek, médio do Ajax com enorme capacidade de chegar em zonas de finalização. Só que, assim que a substituição é feita, Bernardo Silva pegou na bola, entrou pela direita e colocou a bola para Gonçalo Guedes rematar forte e colocado para o golo. Portugal colocava-se a vencer e a Holanda sofria um duro golpe quando tentava ter mais capacidade ofensiva.
O avançado do Valência marcava o seu quarto golo pela seleção, mas apenas o primeiro em jogos oficiais e tornava-se o segundo jogador português a marcar um golo numa final, o primeiro fora Eder na célebre final com a França, no Stade de France, que deu o título europeu à seleção de Fernando Santos já no prolongamento.
Se havia um momento bom para marcar era, de facto, aquele, até porque a Holanda vinha de um prolongamento com a Inglaterra na meia-final de quinta-feira e seria natural que viesse a acusar o desgaste. Ainda assim, a reação da equipa de Ronald Koeman foi imediata, mas talvez não tenha sido a mais adequada, pois a falta de imaginação dos holandeses no ataque continuava a ser evidente, tendo começado a cruzar bolas para a área para tentar chegar ao empate. E aí apareceu Rui Patrício a defender um cabeceamento de Depay, que minutos depois viu Rúben Dias antecipar-se na sequência de um cruzamento de Quincy Promes.
A falta de forças e sobretudo de discernimento dos holandeses foi-se acentuando e Fernando Santos queria a equipa com a mesma intensidade e concentração para que, através de transições rápidas, pudesse aproveitar os espaços que o adversário dava na sua defesa. E, nesse aspeto, a entrada de Rafa Silva para o lugar do esgotado Gonçalo Guedes acabou por ser importantíssima. E a verdade é que Cilessen acabou por manter a sua equipa dentro do jogo com duas defesas seguras.
Mas o mais extraordinário nos minutos finais da seleção nacional foi a maturidade com que a equipa soube gerir o jogo, revelando toda a sua experiência nestes momentos, algo que não sucedia há alguns anos, pois acabava por ser sufocada pelos adversários. Desta vez, havia toda a sensação de que a conquista da primeira edição da Liga das Nações já não fugia. E não fugiu. O apito final do árbitro Undiano Mallenco fez explodir a festa no Estádio do Dragão.
No relvado, Fernando Santos era abraçado por todos, afinal ele tinha dito antes da partida que tinha a convicção de que a taça era portuguesa... e foi. Em cinco anos conquista dois troféus para Portugal e, além disso, só perdeu dois jogos oficiais desde que assumiu o cargo de selecionador nacional. É obra.
Gonçalo Guedes marcou o golo que valeu o troféu, Rúben Dias foi um gigante e fez dois cortes que valeram como se tivessem sido golos, Danilo Pereira foi importantíssimo no equilíbrio defensivo e nas recuperações de bola, Ronaldo foi Ronaldo, mas houve um jogador que esteve a um nível impressionante: Bernardo Silva. Ao longo da última época, Pep Guardiola fartou-se de elogiar o pequeno número 10 português que neste domingo mostrou que esses elogios são mais do que merecidos. As suas diagonais da direita para o meio que baralharam a defesa holandesa, a perceção que tem em escolher o melhor momento para fazer o passe e o voluntarismo com que recuou para ajudar Nélson Semedo a defender foram importantíssimos para a boa exibição de Portugal. E, para aqueles que dizem que lhe falta físico para se impor nos duelos, vejam a matreirice que ele tem adquirido... nunca se encolhe e, por isso, até ganha a maioria desses lances. A assistência para o golo de Guedes foi um prémio para a excelência da sua exibição. Foi eleito pela UEFA como o melhor jogador do torneio e bem o mereceu.
FICHA DO JOGO
Estádio do Dragão, no Porto
Árbitro: Alberto Undiano Mallenco (Espanha)
Portugal - Rui Patrício; Nélson Semedo, José Fonte, Rúben Dias, Raphaël Guerreiro; Bruno Fernandes (João Moutinho, 81'), Danilo Pereira, William Carvalho (Rúben Neves, 90'+3); Bernardo Silva, Cristiano Ronaldo, Gonçalo Guedes (Rafa Silva, 75')
Treinador: Fernando Santos
Holanda - Cillessen; Dumfries, Matthijs de Ligt, Virgil van Dijk, Daley Blind; Marten de Roon (Luuk de Jong, 81'), Frenkie de Jong, Wijnaldum; Bergwijn (Donny van de Beek, 60'), Memphis Depay, Ryan Babel (Quincy Promes, 46')
Treinador: Ronald Koeman
Cartão amarelo a Dumfries (88') e Virgil van Dijk (90'+1)
Golo: 1-0, Gonçalo Guedes (60')