O fenómeno das cheerleaders começou inglês e masculino mas com os anos tornou-se muito americano e muito feminino. Hoje, a dupla função delas é animar a multidão, mais ou menos como uma claque do futebol tradicional, e entretê-la, com acrobacias e pompons, enquanto não regressa a atividade essencial, isto é, o jogo de basebol, de futebol americano ou de outro desporto com muitos tempos mortos..Na primeira semana no cargo de presidente do Brasil, Jair Bolsonaro provou ter vocação para a dupla função das cheerleaders..Na tomada de posse gritou "a nossa bandeira jamais será vermelha", que está para os neocons brasileiros como o "e quem não salta é lampião" está para os adeptos do Sporting..E animou a multidão..Momentos antes, prometera "libertar o país do socialismo", mesmo apesar de suceder ao conservador Michel Temer, de cujo governo aproveitou uma mão-cheia de ministros para o seu executivo, e de dez em cada dez cientistas políticos brasileiros não terem encontrado mais do que leves vestígios socialistas na história do país..Mas distraiu a multidão do essencial..Entretanto, da mesma forma que dois pesquisadores do departamento de psicologia da Universidade da Califórnia descobriram em estudo de 2013 que uma mulher parecia fisicamente mais atraente se fotografada em grupo do que se fotografada sozinha, tese que batizaram de "efeito cheerleader", Bolsonaro também entendeu que, solitário, o seu cheerleading não seria tão eficaz..Chamou reforços. Primeiro, os três filhos parlamentares, depois, meia dúzia de apoiantes para todo o serviço, ao género do ator pornográfico Alexandre Frota, e, finalmente, um grupo de ministros..Compõem este último grupo de entretenimento o titular das Relações Exteriores - que acredita que só a fé em Cristo pode derrubar a união entre multimilionários e comunistas chamada globalismo -, o da Educação - que vai combater o marxismo cultural e o pensamento gramsciano, sejam lá o que forem, em prol da família - e a ministra dos Direitos Humanos - para quem o maior problema do Brasil é uma tal de ideologia de género que vem desestimulando o menino de vestir azul e a menina de vestir rosa..O público, fanático, aplaude as cheerleaders. E esquece-se do que está, de facto, em jogo no campo..Como por exemplo, resolver o desemprego, o baixo crescimento económico, os eternos flagelos da desigualdade e dos serviços públicos de péssima qualidade e a necessidade imediata de reformar a previdência social sem castigar mais ainda os pobres (53% da população) nem a já de si asfixiada classe média..O presidente cheerleader, apesar de se sentir mais confortável na segunda qualidade, de vez em quando tem de mostrar que foi eleito para a primeira. Resolveu então deixar de lado os gritinhos de guerra sobre a Embaixada do Brasil em Jerusalém, sobre instalar uma base americana no país ou sobre espalhar colégios militares por cada capital estadual, e falou de economia em cada um dos três primeiros dias de presidência.."Infelizmente", anunciou num deles, "assinei um projeto nesse sentido", referindo-se a um aumento de imposto para transações financeiras. Logo a seguir, o secretário das Finanças desmentiu-o. "Não assinou não, deve ter sido confusão." Mais tarde o ministro da Casa Civil admitiu que "o presidente se equivocou"..Na véspera, levantara dúvidas sobre a venda de parte de uma empresa pública de aviação, fazendo as ações caírem 5%..E no dia que sobrou divulgara na televisão um projeto de reforma da previdência diferente daquele que o seu ministro da Economia está a produzir há meses..Paulo Guedes, o ministro em causa, e outros adultos do governo demoraram apenas uma semana para entender a vocação do seu presidente: fazer acrobacias e agitar pompons para a galera.