Radomir Antic, de 70 anos, faz parte da história do Atlético de Madrid, pois logo na primeira época em que treinou o clube, em 1995-1996, sagrou-se campeão espanhol e venceu a Taça do Rei, numa equipa que tinha, curiosamente, Diego Simeone como jogador. Já afastado dos bancos, mas por dentro da realidade do clube, até por residir em Madrid, o técnico sérvio falou ao DN sobre a contratação de João Félix, a mais cara da história dos colchoneros (126 milhões de euros)..A primeira questão colocada a Antic, que além do Atlético treinou igualmente o Real Madrid e o Barcelona, foi precisamente se achava o valor pago pelo Atlético exagerado, tendo em conta sobretudo a idade de João Félix. "Hombre, depois de ter visto hoje durante a apresentação que o (Jorge) Mendes é o empresário dele, não me estranha nada o valor que pagaram por ele. Porquê? O Mendes é o melhor empresário de futebolistas, sabe negociar como ninguém", referiu entre risos..Antic falou depois mais a sério. "Entendo que haja quem questione e levante dúvidas sobre esta contratação. Estamos a falar de muito dinheiro. O João Félix é um jogador muito novo, com pouca história ainda. Apareceu apenas na época passada ao serviço do Benfica... mas é um avançado que marca e oferece golos. E isso no mercado atual paga-se caro. É um investimento que o tempo vai tratar de provar se foi bom ou não. O Atlético hoje vive numa outra realidade, está a viver o seu melhor período de sempre em termos económicos e pode dar-se ao luxo de contratar jogadores por valores impensáveis há uns anos", indicou..O técnico sérvio, que teve três passagens pelo Atlético de Madrid, admite que não tem uma ideia formada sobre João Félix: "Sei quem é, conheço, mas mais pelos resumos que vejo através da televisão. E não posso ter uma ideia formada de um jogador que só vejo os golos que marca pela TV. Vi que marcou contra o Sporting e na Liga Europa, e que é muito falado. Mas não tenho uma noção completa.".Uma certeza Radomir Antic tem, até por conhecer muito bem o treinador Diego Simeone (foi ele, aliás, que o contratou quando chegou ao Atlético em 1995). "Se o João Félix quiser jogar e ser primeira opção vai ter de mostrar carácter. Na época passada, por exemplo, o Atlético contratou o Lemar, naquela altura a contratação mais cara do Atlético [70 milhões de euros] e julgo que não fez um único jogo completo na Liga espanhola. O João Félix vai ter de se superar e perceber muito bem o que o treinador pretende dele. Só assim pode ter sucesso", justificou..Um dos maiores desafios que tem sido apontado a João Félix, além da pressão que vai ter devido ao valor da transferência, é o facto de o jovem avançado de 19 anos poder ser alvo de comparações com Antoine Griezmann, jogador que foi a figura da equipa colchonera nos últimos anos e que está de saída, muito provavelmente para o Barcelona. "Não vejo bem as coisas assim. Já ouvi estarem a comparar os golos que um marcou e que por isso o outro vai ter de fazer igual. Na época passada, o Griezmann marcou 15 golos na Liga espanhola. Mas é preciso termos a noção de que foi um jogador muito sacrificado em tarefas defensivas no esquema de Diego Simeone. E isso é uma perceção que o João Félix vai ter de entender: o equilíbrio entre a defesa e o ataque, um aspeto muito importante para o Simeone. Ele terá de aprender, pois podem ter a certeza de que o treinador vai ser exigente nesse aspeto. O problema de Félix não vão ser as comparações com Griezmann. É a exigência do treinador", disse, admitindo que "não será fácil a Félix ganhar a titularidade logo de início"..Como antigo treinador do Atlético, Antic diz que vai estar a torcer para que a contratação de João Félix seja um êxito. E aplaude o facto de atualmente ver o clube colchonero mais ou menos no patamar dos rivais Real Madrid e Barcelona: "O clube está a atravessar um bom momento também a nível económico. Construiu um novo estádio, tem boas receitas, grande apoio dos adeptos. O futebol espanhol vive uma época dourada, sobretudos através do dinheiro dos direitos televisivos. Isso aproxima um pouco os clubes em termos económicos e também competitivos.".Félix contra o estigma do terceiro grande.Ar sereno, de ténis e uma camisa branca fora das calças. Foi assim que João Félix, de 19 anos, compareceu nesta segunda-feira na sala de imprensa do Wanda Metropolitano durante a sua apresentação oficial como jogador do Atlético de Madrid, que contou com os pais, Paulo Futre e o empresário Jorge Mendes entre os presentes. E um batalhão de jornalistas..O ex-jogador do Benfica ia preparado. Sabia que não iam faltar referências ao valor (126 milhões de euros) que custou, ao peso de substituir um jogador como Antoine Griezmann e também para as inevitáveis comparações com Cristiano Ronaldo. Diplomaticamente disse que não entendia nada sobre questões de mercado para fugir à questão sobre a pressão de ter custado 126 milhões de euros. E fez questão de não alimentar comparações. Sobretudo quando puxaram o nome de Cristiano Ronaldo à conversa: "Estou aqui para fazer a minha história, para ser lembrado como o João Félix. O Cristiano é o Cristiano e eu quero ser eu mesmo.".João Félix marca uma nova era do Atlético Madrid, num verão em que o clube historicamente tido como o terceiro grande de Espanha (atrás de Real Madrid e Barcelona) entrou em definitivo na bitola dos grandes tubarões do futebol mundial no que diz respeito a valores gastos na contratação de jogadores, avançando para João Félix e tornando-o na mais cara "compra" de sempre do clube - 126 milhões de euros. Aliás, durante a apresentação, o presidente Enrique Cerezo, por entre muitos elogios ao avançado de 19 anos, fez questão de lembrar que Félix "recebeu propostas de alguns dos melhores clubes do mundo" e que optou pelo Atlético. Uma mensagem com um duplo significado..Mas pode esta contratação ser um sinal de que o Atlético se quer intrometer em definitivo na luta pelo título espanhol, ter aspirações na Europa e abandonar de vez a imagem do terceiro clube de Espanha? Historicamente, e se tivermos como ponto de referência os títulos conquistados, o Atlético é considerado a terceira força do futebol espanhol, com dez campeonatos ganhos (à frente dos colchoneros estão o Barcelona com 26 e o Real Madrid com 33), à frente do Athletic Bilbau (oito) e do Valência (seis)..Em maio de 2014, já com Diego Simeone como treinador, o clube sagrou-se campeão espanhol pela última vez, colocando um ponto final a um jejum de 18 anos (terminou com três pontos de vantagem sobre Barcelona e Real Madrid). Depois deste feito, acabou a competição por três vezes na terceira posição (2014-2015, 2015-2016 e 2016-2017). Mas nas duas últimas épocas (2017-2018 e 2018-2019) terminou a liga em segundo, ambas à frente do rival Real Madrid..Também nas provas europeias o Atlético tem causado alguma sensação. Na era Diego Simeone (está no clube desde janeiro de 2012), os colchoneros já venceram duas edições da Liga Europa (2011-2012 e 2017-2018), duas Supertaças Europeias (2012 e 2018) e estiveram em duas finais da Liga dos Campeões, a competição mais importante a nível de clubes. É verdade que das duas vezes foram derrotados (pelo Real Madrid), a primeira em 2013-2014 por 4-1 e em 2015-2016 no desempate por penáltis. Mas não deixa de ser um feito assinalável..Há duas semanas, numa extensa entrevista ao jornal argentino La Nacion, Diego Simeone falou de tudo. E admitiu que neste momento o Atlético está mais próximo de alguns dos emblemas mais poderosos da Europa, mas sem nunca referir os dois grandes rivais internos. "Para mudar a história de um clube é preciso ganhar, parece-me claro. Caso contrário, não mudas. Nestes últimos sete anos e meio ganhamos sete títulos e perdemos três finais, duas da Champions e uma Supertaça Europeia contra o Barcelona. O Atlético está a começar a posicionar-se onde estão o Liverpool, o Inter Milão, a Juventus", referiu..Sete referências no ataque: de Torres e Griezmann.Neste século, o Atlético de Madrid, equipa mais elogiada pela forma como defende e pelo futebol combativo que pratica do que propriamente pela sua linha avançada, teve sete grandes referências no ataque, jogadores com nome que deixaram a sua marca nos colchoneros. É com este naipe de futebolistas, e sobretudo com Griezmann, a quem vai suceder, que João Félix irá ser comparado. Veja como foram as primeiras épocas e as trajetórias dos sete avançados mais importantes da história deste século do Atlético de Madrid..Fernando Torres, que anunciou recentemente o adeus aos relvados, foi provavelmente uma das maiores referências do clube em termos atacantes. Formado nas escolas dos colchoneros, estreou-se pelo Atlético no final da época 2000-2001, com apenas 17 anos, estava o clube na II Divisão. Atuou em quatro jogos e marcou apenas um golo. Por isso o melhor ponto de referência como primeira temporada em termos comparativos com o que Félix pode fazer é a época 2002-2003, igualmente na II Liga. Torres participou em 36 jogos (titular em 27) e marcou um total de 29 golos. Em termos globais, El Nino Torres atuou em 404 partidas pelo Atlético e apontou um total de 129 golos. Títulos só venceu um: a Liga Europa 2017-2018)..Diego Forlán chegou ao Atlético de Madrid na temporada 2007-2008, contratado ao Villarreal, na altura com 28 anos. O avançado uruguaio deixou logo a sua marca na época de estreia, com 25 golos apontados em 56 jogos - na Liga espanhola foram 16 em 36 partidas. Nos quatro anos em que vestiu de vermelho e branco, em todas as competições, o sul-americano chegou à marca dos 99 golos em 203 encontros, números que o colocam no top 10 dos melhores marcadores de sempre do clube..Sergio Agüero foi outra das referências do ataque do Atlético de Madrid neste século. Chegou aos colchoneros na temporada 2006-2007, com 18 anos, oriundo do Independiente, da Argentina. Logo na temporada de estreia assumiu-se como titular da equipa, mas só conseguiu marcar sete golos em 42 jogos (seis em 38 jogos no campeonato e um em quatro partidas na Taça do Rei). Nas cinco épocas em Madrid realizou um total de 175 jogos e marcou 74 golos..Radamel Falcao deixou o FC Porto e chegou ao Atlético de Madrid na época 2011-2012 com 25 anos para fazer esquecer Forlán e Agüero. Os números do avançado colombiano falam por si. Logo na primeira temporada marcou 36 em 52 jogos (24 na Liga espanhola e 12 na Liga Europa). Ficou apenas mais uma temporada no clube (transferiu-se para o Mónaco) e voltou a deixar a sua marca na temporada 2012-2013, durante a qual fez 34 golos em 41 jogos..Com a saída de Falcao, o Atlético foi "pescar" a Barcelona o sucessor do colombiano. O eleito foi David Villa, na altura já com 31 anos, que esteve apenas uma época no clube, mas que coincidiu com a conquista do título de campeão espanhol pelos colchoneros. David Villa fez 15 golos em 47 partidas - 13 na Liga espanhola, um na Taça do Rei e um na Supertaça de Espanha..Diego Costa foi contratado ainda muito jovem pelo Atlético de Madrid (chegou do Sp. Braga). E por isso nos primeiros anos esteve cedido a outros clubes, até que chegou a sua oportunidade na temporada 2010-2011. Realizou 38 jogos e marcou oito golos (seis na Liga espanhola em 27 partidas). O avançado brasileiro, que se naturalizou espanhol para representar a seleção do país vizinho, acabou por tornar-se uma referência no ataque dos colchoneros, tanto assim foi que depois de o vender ao Chelsea, o Atlético voltou a adquiri-lo. Nos vários anos que leva no clube apontou 76 golos em 178 jogos..Antoine Griezmann vai ser a sombra de João Félix nos próximos anos. O internacional francês foi contratado no início da temporada 2014-2015, então com 23 anos. Chegou aos colchoneros já conhecedor da realidade do futebol espanhol, por força dos cinco anos passados na Real Sociedad. Logo na primeira temporada mostrou toda a sua qualidade, com 25 golos apontados em 53 jogos (22 em 37 jogos na Liga espanhola). O francês foi nos últimos anos sistematicamente o melhor marcador da equipa que agora vai deixar - vai pagar a cláusula de rescisão de 120 milhões de euros e quase de certeza assinar pelo Barcelona - e os números não vão ser fáceis de superar: 131 golos em 257 jogos.