Podia pegar nas manifestações em França, nas greves ou na visita do presidente chinês... o trânsito na A1 e a chuva miudinha atrapalhavam-me o pensamento, o prazo para a entrega da crónica aproximava-se e convinha-me escrevê-la na cabeça para a poder enviar assim que chegasse a Lisboa..Saíra do Porto às 20.00, depois de quatro horas de aulas, o estômago vazio teve um gesto de revolta e tomou o lugar do GPS, conduzindo-me à avenida dos leitões em plena Mealhada. Parei junto a um restaurante qualquer e estacionei num parque vazio e mal iluminado. Assim que saí do carro vi uma senhora de boné branco e colete amarelo refletor, como o dos outros que andam zangados. Estava abrigada debaixo de um telheiro e sorria, disse boa-noite e mais nada. Aproximei-me e dei-lhe uma moeda, surpreendido com aquela forma de pedir como quem não espera nada..- Está a chover muito, leve o meu chapéu..- Deixe estar, tenho aqui uma boina..- Ainda se constipa, leve, leve, que eu fico por aqui..Declinei e segui para o restaurante, pedi um prato do bicho e fiquei a ruminar. Podia falar da mesquita clandestina, ou dos prémios do turismo, se não tiver mais nada faço um balanço do ano....Bebi o café à pressa, paguei, e voltei para o carro quase a correr..- Então já comeu? Parece impossível..- Sabe, estou com pressa..- Esta chuva é perigosa, vá devagar, tenha cuidado!.- Obrigado, obrigado, olhe, não tenho é mais moedas....- Ora essa, nem eu queria! Isto é mais para passar o tempo. Um bom Natal para si e para os seus, boa viagem, não se apresse!.E ficou ali, com o ar amável de uma tia da província, a sorrir e a acenar. Desta vez foi a crónica que me escolheu, mais do que eu a ela. Não há aqui moral nem opinião, só espanto, e uma senhora simpática a passar o tempo num estacionamento vazio, de boné na cabeça e colete amarelo..Escritor, diariamente online
Podia pegar nas manifestações em França, nas greves ou na visita do presidente chinês... o trânsito na A1 e a chuva miudinha atrapalhavam-me o pensamento, o prazo para a entrega da crónica aproximava-se e convinha-me escrevê-la na cabeça para a poder enviar assim que chegasse a Lisboa..Saíra do Porto às 20.00, depois de quatro horas de aulas, o estômago vazio teve um gesto de revolta e tomou o lugar do GPS, conduzindo-me à avenida dos leitões em plena Mealhada. Parei junto a um restaurante qualquer e estacionei num parque vazio e mal iluminado. Assim que saí do carro vi uma senhora de boné branco e colete amarelo refletor, como o dos outros que andam zangados. Estava abrigada debaixo de um telheiro e sorria, disse boa-noite e mais nada. Aproximei-me e dei-lhe uma moeda, surpreendido com aquela forma de pedir como quem não espera nada..- Está a chover muito, leve o meu chapéu..- Deixe estar, tenho aqui uma boina..- Ainda se constipa, leve, leve, que eu fico por aqui..Declinei e segui para o restaurante, pedi um prato do bicho e fiquei a ruminar. Podia falar da mesquita clandestina, ou dos prémios do turismo, se não tiver mais nada faço um balanço do ano....Bebi o café à pressa, paguei, e voltei para o carro quase a correr..- Então já comeu? Parece impossível..- Sabe, estou com pressa..- Esta chuva é perigosa, vá devagar, tenha cuidado!.- Obrigado, obrigado, olhe, não tenho é mais moedas....- Ora essa, nem eu queria! Isto é mais para passar o tempo. Um bom Natal para si e para os seus, boa viagem, não se apresse!.E ficou ali, com o ar amável de uma tia da província, a sorrir e a acenar. Desta vez foi a crónica que me escolheu, mais do que eu a ela. Não há aqui moral nem opinião, só espanto, e uma senhora simpática a passar o tempo num estacionamento vazio, de boné na cabeça e colete amarelo..Escritor, diariamente online