A associação que ajuda portugueses na Venezuela: "Uma reforma já não dá para um frango"
António (nome fictício), natural da Madeira, é uma das pessoas que regularmente recebem ajuda da Sociedade de Beneficência de Damas Portuguesas. São cerca de quatro dezenas nestas circunstâncias. Apenas uma é oriunda de Portugal continental, as restantes são da Madeira. Há mais gente com problemas gravíssimos, mas não há possibilidade de ajudar. E são carências de vária ordem.
A atual presidente está há dez anos na associação. A primeira entrevista que Fátima Pita dá é ao Diário de Notícias da Madeira. E fá-lo por causa das pessoas que precisam. Quem está na instituição assume a causa, é para ajudar. E perante tamanhas necessidades, não só por razões económicas mas também por problemas de saúde, a ajuda que é dada, reconhece, "é pouca, muito pouca". Há gente que bate à porta a pedir alimentos, roupa, medicamentos, dinheiro para uma cirurgia ou uma prótese. Há gente que vive sozinha, "os filhos já emigraram, mas ainda não têm possibilidades de mandar algum dinheiro". Um recomeço de vida fora do país nem sempre fácil.
Fátima Pita fala da existência de "fome, muita fome" entre elementos da comunidade madeirense. "Não têm como comprar um quilo de farinha. Vê-se na cara que passam grandes necessidades." A presidente lembra-se em particular de uma senhora que "se vê que passa fome", mas o que dói mais "é quando há crianças".
Todos os elementos da direção fizeram questão de nos receber, diria até, com solenidade na sede da instituição. Demonstra a importância que dão à visita do Diário de Notícias da Madeira. Pedem para agradecer publicamente. "Demonstra que não se esqueceram de nós neste momento particularmente difícil." Trabalham em equipa. Na mesa ao lado há café e biscoitos. À medida que a presidente falava recebia a concordância e achegas dos outros membros da junta diretiva: "Muitos casos já nem querem dinheiro, querem comida. Uma reforma não dá para um frango."
O "filho predileto" da Sociedade de Beneficência é o Lar Padre Joaquim Ferreira, que acolhe os mais velhos, cerca de 60, e que precisa também de apoio permanente. Uma instituição que "passa por uma situação muito, muito crítica", acentua Fátima Pita. O edifício precisa de obras, as canalizações têm de ser reparadas, os elevadores estão avariados. Além de um pedido de apoio extra, dirigido ao governo da Madeira e às autarquias, especialmente à do Funchal, sugerem também um apoio regular.
Além das ajudas que recebem de empresários, Fátima Pita dá conta de algumas iniciativas levadas a cabo para a recolha de fundos. São quatro as principais ao longo do ano. Um almoço em cada estação, sem esquecer o São Martinho, mas agora sem bacalhau nem azeite português, "é um luxo, mas um luxo dos grandes. O mais próximo que conseguimos arranjar foi um arroz de marisco". Há também bingo e bazares.
Já há o grupo das netas. Já têm iniciativas próprias com o objetivo de angariar fundos. Fazem voluntariado, por exemplo, junto dos mais velhos que estão institucionalizados. De pequenino... As Damas já preparam o cinquentenário da constituição da Sociedade de Beneficência. Um festival de restaurantes é uma das ideias que estão a ser pensadas.
Não baixam os braços, fazem das tripas coração para ajudar. No entanto, como sublinha a presidente, "as necessidades são quotidianas e permanentes. É verdade que sempre houve carenciados entre a comunidade, mas nunca como agora. Há muitas incertezas em relação ao futuro". Daí o apelo: "Por mais pequeno que seja o donativo, é sempre importante." Urgente.
Este texto foi originalmente publicado no Diário de Notícias da Madeira