Diga as piores verdades sobre eles – nada gruda em Lula ou Bolsonaro
Teflon - em Portugal, tefal -, todo mundo conhece. É aquela substância antiaderente que recobre o fundo das panelas e faz com que, ao grelhar um bife ou fritar um ovo, não fiquem resíduos gordurosos grudados no fundo. O tefal ou teflon é uma das maravilhas da cozinha moderna. Nada se agarra a ele - nem lagartixas, cujas patas conseguem aderir a qualquer parede. E, para provar isso, há um filminho na internet mostrando, por coincidência, uma lagartixa tentando em vão escalar os poucos centímetros da lateral de uma frigideira protegida pelo produto.
Mas isso já é passado. Existe agora um teflon ou tefal humano, algo que recobre a pele de certos indivíduos e os torna à prova de qualquer acusação, mesmo que esta tenha sido exaustivamente investigada, resultado em condenação e transformada numa sentença que, depois de passar por inúmeros órgãos colegiados, supremas cortes e tribunais de recurso, foi confirmada em todas as instâncias. Pois nada disso adianta. Aos olhos de seus seguidores, esse indivíduo continuará inocente e vítima de uma calhorda manobra política.
O tefal ou teflon humano é um revestimento tão poderoso que protege seu usuário até dos absurdos que ele diz em rede nacional de jornal, rádio e televisão - ou seja, que o país inteiro escuta - e, em condições normais, poderiam destruir sua carreira. Pois, apesar da gravidade dessas declarações, o fulano só vê o número de seus seguidores aumentar, como se não tivesse dito nada ou como se aquilo não importasse.
Neste momento, no Brasil, o tefal está concentrado em dois políticos sobre os quais pode-se dizer as piores e mais incontestáveis verdades. Nada grudará neles: Lula da Silva e Jair Bolsonaro.
Durante seus oito anos como presidente da República, de 2002 a 2008, Lula e seu partido, o PT, foram acusados de comandar o maior esquema de corrupção já visto no Brasil, envolvendo bancos de investimentos, estatais e empreiteiras, em escala monumental e até internacional. Bilhões de dólares foram drenados dos cofres públicos - a Petrobras e a Eletrobras quase quebraram - para o enriquecimento pessoal de muitos e a manutenção do PT no poder. Para isso, incontáveis executivos, políticos e até jornalistas foram comprados, e Lula se uniu ao que havia de pior no Brasil. Passou anos aos abraços e acordos com seus ex-inimigos Fernando Collor, Paulo Maluf e José Sarney, e com uma nova e brilhante geração de corruptos, simbolizada pelo então governador do Rio, Sérgio Cabral.
Devido a uma operação jurídica de saneamento da vida nacional, a Lava-Jato, muitos dos implicados têm sido presos e obrigados a devolver o dinheiro - Sergio Cabral, por exemplo, está preso e condenado, por enquanto, a 170 anos e sua mulher já teve de devolver mais joias do que o tesouro do Ali Babá. Lula também está preso e condenado em segunda instância por corrupção e lavagem de dinheiro, assim como todos os seus ex-ministros da Economia e ex-tesoureiros do PT. Isso deve significar algo, não? Não. Não quer dizer nada para os adoradores de Lula. Todos roubaram, menos ele, que não sabia de nada. É o teflon.
Jair Bolsonaro, por sua vez, se diz o antipolítico que vai mudar o Brasil. Mas é político há 30 anos, está no sétimo mandato e foi um dos deputados mais medíocres que já passaram pelo Congresso. Como ex-capitão do Exército, não admite que o Brasil tenha vivido sob ditadura militar entre 1964 e 1985 e elogia publicamente os torturadores. Sua receita para acabar com a violência no Brasil é pôr uma arma de fogo na mão de cada cidadão e estimulá-lo a matar para se defender. Ele próprio, num comício há um mês, sofreu uma facada que quase o estripou. Mas, dias depois, deixou-se fotografar no hospital fazendo gestos de como se empunhasse revólveres. Está cercado por militares de pijama, hidrófobos e rancorosos, e já deu as mais incríveis declarações fascistas, racistas, machistas e homofóbicas. Pois nada disso consegue perturbar seus admiradores. É o teflon.
Ambos, Lula e Bolsonaro, têm sinistros projetos antidemocráticos. Para isso, cada qual à sua maneira, fazem uma campanha sistemática de desmoralização do Judiciário, da imprensa e, agora, das eleições, cujo primeiro turno ocorrerá hoje. Para os petistas, até há pouco, "eleição sem Lula" era "fraude". Mas, como seu candidato-fantoche, Fernando Haddad tem grandes chances de se eleger, a frase foi provisoriamente arquivada. E Bolsonaro, que já lançou suspeitas sobre as urnas eletrónicas (as mesmas em que ele e seus filhos vivem se elegendo há anos), declarou que não aceitará como legítimo outro resultado que não sua vitória.
Com a volta do PT ao poder, nossa meta será nos tornarmos uma grande Venezuela. Com Bolsonaro, nosso destino é o século XIII.
Lula e Bolsonaro são revestidos de teflon. Mas os brasileiros não são. A merda produzida por eles, não importa quem ganhe, cairá no nosso couro e grudará.
Jornalista e escritor brasileiro, autor de, entre outros, O anjo pornográfico - A vida de Nelson Rodrigues [Tinta da China].