Cruzeiros continuam a navegar e sem um porto que os aceite. Tripulantes desesperam para chegar a casa

Os paquetes de luxo mantêm-se em alto mar, embora sem passageiros. Forçados a suspender os cruzeiros devido à covid-19, os portos não os deixam atracar. Os tripulantes, entre eles 12 portugueses, desesperam para chegar a casa. No navio Ovation of the Seas há 2000 pessoas nesta situação.
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A indústria dos cruzeiros está parada pelo menos até agosto e são muitos os paquetes que continuam a navegar e sem um destino à vista, porque não têm autorização para atracar em bom porto. Os tripulantes, de várias nacionalidades, dizem estar há 50 dias em "quarentena forçada" e não veem a hora de chegar a casa.

No Ovation the Seas, da Royal Caribbean, está a tripulação do Azamara, do Spectrum (terão ficado 500 tripulantes chineses à espera de sair na China) e do Radiance​, no total de 2000 pessoas.. E outros navios da companhia estarão na mesma situação, nomeadamente o Symphony e o Harmony, que não têm autorização para atracar em Miami, EUA.

O site Marine Trafic mostra a quantidade de navios na área do Ovation, no Oceano Pacífico, e dá a ideia do que se está a passar em todo o mundo.

O Ovation viu rejeitado o pedido para o desembarque em Sydney, Bali e Singapura, esperando chegar esta quinta-feira às Filipinas, mas sem autorização para atracar no porto de Manila. O transbordo será feito em barcos de salva-vidas, para um outro navio da empresa, até terem um avião para regressar aos respetivos países.

O desespero sobre a situação que vive a tripulação daqueles navios vem de um português que pede para não ser identificado. "Proibiram-nos de falar com a comunicação social", justifica. Ele, e outros 11 portugueses, estão no Ovation of the Seas que juntou a tripulação de outros navios cruzeiros da Royal Caribbean a navegar no sudoeste asiático.

"Estão aqui os trabalhadores internacionais. De início, as coisas correram bem mas, agora, sentimos que estão a poupar - embora haja mantimentos a bordo e tem havido abastecimento. Apenas dão três refeições por dia e em pouca quantidade, Não podemos circular no navio, embora nenhum de nós esteja doente., tiramos a febre duas vezes ao dia", conta o português, sublinhando que está confinado à sua cabine.

Acrescenta que, desde o dia 25 de abril que não recebem salário. Ele terminou o contrato, mas não é essa a situação dos companheiros. "Um colega croata trabalhava há duas semanas e pediu para ficar, mas foi recusado. Só ficam os trabalhadores essenciais para manter o barco a funcionar".

O português, é bartender (faz as bebidas) e está há dez anos na companhia, com contratos de seis meses, ao fim dos quais viaja até Portugal. O seu navio deixou de ter passageiros a 17 de março, como quase todos os navios-cruzeiro. Os funcionários das Filipinas e da Indonésia regressaram aos respetivos países, todos os outros esperam esse regresso.

O Ovation of the Seas prevê a sua chegada na manhã desta quinta-feira a Manila, onde deverão ficar cerca de 1200 tripulantes. Os restantes 800 são indianos e vão seguir viagem para a Índia. Ficam os europeus - portugueses, espanhóis, italianos, ucranianos, sérvios, croatas, húngaros e romenos - e alguns norte-americanos. Os portugueses esperam seguir num voo para Londres com os outros europeus.

"Como é que se faz o repatriamento se as fronteiras estão fechadas e não há voos?"

Francisco Teixeira, diretor geral da Melair Cruzeiros, operadora de viagens que trabalha com a Royal Caribbean, Celebrity Cruises, Azamara e Pullmantur Cruzeiros, sublinha que a sua área é o marketing, mas disponibiliza-se para falar das atuais contingências do setor.

"Como todo o turismo, a atividade está suspensa, só que a indústria de cruzeiros depende de vários fatores: das decisões dos governos e das autoridades de saúde de vários países, dos responsáveis pelos portos, das companhias áreas, das fronteiras. Um cruzeiro não pode viajar se as pessoas não tiverem aviões que as transportem às cidades de embarque. Não pode incluir uma cidade no percurso se esta não permitir turistas. O mesmo se passa com os tripulantes. Como é que se faz o repatriamento se as fronteiras estão fechadas e não há voos?" Questiona Francisco Teixeira.

O diretor da Melair refere que os outros países não seguiram o exemplo de Portugal, com o navio da MSC Fantasia, proveniente do Brasil e que atracou no porto de Lisboa. Os 1338 passageiros foram testados ao vírus SARS-cov-2 e repatriados, à exceção dos portugueses que quiseram ficar em Portugal.

O DN contactou a MSC que, em conjunto com a Melair, são as duas maiores companhias do setor a operar em Portugal, mas Eduardo Cabrita, o diretor, não se disponibilizou a prestar declarações.

O mercado dos cruzeiros cresceu 60% o ano passado em Portugal e tem vindo a conquistar cada vez tem mais adeptos no país. Foi a escolha de 67 mil portugueses para fazerem as suas férias em 2019, diz Francisco Teixeira. Isto ao mesmo tempo que trouxe 600 mil turistas.

Um crescimento em linha com o que acontecia em todo o mundo, prevendo-se antes da pandemia um crescimento de 50% em 2020.

Há cerca de 400 paquetes de luxo neste negócio e estão a ser construídos mais 100. Foram obrigados a parar, com as companhias a suspender as reservas até julho e algumas, como a Norwegian Cruise Line a ameaçar rutura financeira. A Carnival Cruise - proprietária do Diamond Princess e que teve um surto do SARS-Cov-2 a bordo -, anunciou a retoma para agosto, mas essa decisão depende dos governos e das autoridades dos países por onde passam as suas viagens.

A Royal Caribbean, MSC, Norwegian e a Carnival representam 85% da faturação da indústria de cruzeiros, cerca de 55 a 65 mil milhões de euros por ano, explica Francisco Teixeira.

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