Trump insistiu em ter alta. Mas é a Casa Branca segura?
O presidente norte-americano deixou nesta segunda-feira à noite o Centro Médico Militar Walter Reed, quatro dias depois de ter sido hospitalizado por causa da covid-19. Donald Trump regressou a uma Casa Branca que está transformada num foco de infeção, com mais membros da sua equipa a testar positivo para o novo coronavírus.
"Estou a sentir-me bem! Não tenham medo da covid. Não deixem que domine as vossas vidas. Desenvolvemos, sob a Administração Trump, alguns medicamentos e conhecimentos muito bons. Sinto-me melhor do que há 20 anos", indicou o presidente de 74 anos no Twitter, anunciando a sua saída.
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Os médicos que estão a tratar o presidente disseram que ele estava animado e desejoso de voltar à Casa Branca, onde tem uma equipa médica à sua disposição 24 horas por dia. E rejeitaram a ideia de que Trump estava a pressionar para sair, alegando que ele cumpre todos os requisitos para ter alta, "apesar de não estar ainda livre de perigo". Lembraram ainda que "cada dia que um paciente fica no hospital sem ser necessário é um risco".
Mas, para o presidente, continuar hospitalizado passava uma mensagem de fraqueza - ainda para mais quando o adversário nas presidenciais de 3 de novembro, o democrata Joe Biden, está a viajar para fazer campanha, tendo estado nesta segunda-feira na Florida. A idade do ex-vice-presidente, 77 anos, tem sido usada pela campanha de Trump para o atacar, dizendo que ele não está capaz de estar na Casa Branca.
Trump planeia participar no próximo debate entre os dois, marcado para 15 de outubro. Horas antes, Biden disse que ouviria os cientistas para saber se era ou não seguro um novo frente-a-frente com o presidente.
O desejo de Trump de ter alta chocava contudo com as notícias vindas da Casa Branca, que parece ter-se tornado num foco de infeção com cada vez mais casos na equipa do presidente. O caso mais recente é o da assessora de imprensa, Kayleigh McEnany, que testou positivo nesta segunda-feira, depois de vários testes desde quinta-feira que tinham sido negativos.
Além disso, pelo menos outros dois membros da equipa de comunicação, assim como três membros da imprensa, já testaram positivo. E, de acordo com os media norte-americanos, há vários funcionários de nível médio e inferior na Casa Branca que também estarão infetados.
McEnany é a última de uma longa lista de próximos de Trump infetados, que começou com a sua conselheira Hope Hicks (cujo teste positivo fez soar o alarme e resultou no diagnóstico do presidente).
A primeira-dama, Melania Trump, também está infetada, assim como o assistente pessoal do presidente, Nicholas Luna, a antiga assessora Kellyanne Conway e o diretor de campanha, Bill Stepien e o seu conselheiro Chris Christie (ex-governador de Nova Jérsia).
Testaram também positivo várias pessoas que estiveram no evento na Casa Branca que se suspeita tenha sido um foco de contágio, a apresentação da juíza escolhida por Trump para o Supremo Tribunal, no dia 26 de setembro. É o caso dos senadores republicanos Mike Lee, Thom Tillis e Ron Johnson, assim como o presidente da Universidade de Notre Dame, John Jenkins e a responsável pelo Comité Nacional Republicano, Ronna McDaniel.
As pessoas que estiveram em contacto com Trump e Hicks não foram colocadas em isolamento ou quarentena. Violando as normas das autoridades de saúde norte-americanas, os funcionários continuaram a trabalhar - muitas vezes até sem máscara - após resultados negativos nos testes rápidos.
A única estratégia da Casa Branca para travar a infeção foi recorrer aos testes rápidos, ignorando as regras de uso de máscara ou de manter o distanciamento de segurança. Isto apesar de se saber que estes testes não são 100% fiáveis e que alguém contagiado pode demorar dias a testar positivo.
Com casos de covid-19 confirmados, também não há sinal de que tenha havido uma verdadeira investigação aos contactos dos infetados - o jornalista do The New York Times Michael Shear, que acredita ter sido infetado no evento da nomeação da candidata de Trump para o Supremo Tribunal, disse que ninguém entrou ainda em contacto com ele.
O evento de nomeação de Amy Coney Barrett para o cargo deixado vago pela morte da juíza liberal Ruth Bader Ginsburg, a 26 de setembro, poderá ter sido a origem do contágio de muitos dos que já testaram positivo - mais de uma dúzia da equipa de Trump ou de convidados, entre eles três senadores republicanos.
No regresso à Casa Branca, a questão é saber se o presidente conseguirá ficar isolado e em confinamento para não infetar mais ninguém. Foi o próprio Trump que disse num vídeo que divulgou no sábado que lhe deram a possibilidade de ficar na residência oficial na sexta-feira, mas que tinha de ficar confinado ao andar superior. "Não posso fazer isso, tinha de dar a cara", disse Trump. "Não posso ficar trancado num quarto lá em cima."
Trump provou a sua impaciência ao resolver sair para acenar aos apoiantes que estavam diante do Centro Médico Walter Reed, no domingo à tarde (já noite em Lisboa). O presidente está a ser acusado de pôr em risco a saúde dos membros dos serviços secretos que seguiram com ele no carro de onde esteve a acenar, apenas para o que é considerado um golpe publicitário.
Com Trump na Casa Branca - onde trabalham centenas de pessoas - poderá ser ainda mais difícil "contê-lo" na residência e não o deixar ir à Ala Oeste. O seu médico, Sean Conley, disse que tudo está a ser feito para que o presidente possa continuar a trabalhar, não sendo claro se o fará apenas da residência oficial ou se irá até à Sala Oval.
"Vamos fazer o que for preciso para o presidente poder trabalhar com segurança" dentro da Casa Branca, disse o médico.
Outro membro da equipa médica, Jason Blaylock, disse que está a trabalhar de perto com laboratórios locais para o presidente poder ter acesso a um teste de diagnóstico avançado que permitirá dizer à equipa médica sobre a sua capacidade para continuar a transmitir o vírus a outras pessoas. Conley lembrou que é normalmente nos primeiros cinco dias que os doentes são mais contagiosos.
Em relação ao tratamento, o presidente conta com uma equipa médica na Casa Branca, pelo que não haverá problema de continuar a tomar os medicamentos que começou a tomar na sexta-feira - nomeadamente o remdevisir, que tem de ser tomado durante cinco dias - ou monitorizar o seu estado de saúde.
Na Casa Branca, a recuperar também da covid-19, está a primeira-dama, Melania Trump, que escreveu no Twitter que está bem.