Estrela vs Belenenses: dois ex-capitães explicam a rivalidade histórica
Quase dez anos depois, Estrela da Amadora e Belenenses reencontram-se este domingo (15.00 horas) no Estádio José Gomes, na Reboleira. As duas equipas vão defrontar-se na 12ª jornada da I Divisão da Associação de Futebol de Lisboa, o último escalão do futebol sénior com o sonho de regressarem um dia aos tempos de glória, que as levaram a conquistar a Taça de Portugal e, no caso dos azuis, até ao título de campeão nacional.
O duelo deste domingo será uma espécie de regresso ao passado na Reboleira. Os amadorenses estão esta época a começar do zero depois de ter sida decretada a falência e extinção em 2011, enquanto o Belenenses assumiu este ano o desafio de começar com uma equipa nos distritais depois do divórcio com a SAD, cujo imbróglio continua por resolver.
Nas bancadas, atentos ao que se vai passar no relvado vão estar os históricos Rebelo e Filgueira, antigos capitães de Estrela da Amadora e Belenenses, respetivamente, que ao DN não escondem a emoção de assistir à reedição de duelos que se habituaram a jogar. "Foram sempre jogos equilibrados, eles iam ganhar à Reboleira e nós ao Restelo. Agora espero que também haja equilíbrio", começou por dizer o antigo defesa que vestiu a camisola dos amadorenses durante 14 anos. "Ainda não fui ver qualquer jogo do Estrela esta época, mas já me disseram que há mais gente agora do que na I Divisão. Parece que são cerca de 1500 pessoas e nós tivemos jogos com algumas centenas na I Liga", acrescentou o antigo futebolista de 57 anos.
Filgueira concorda com Rebelo e destaca estes duelos como jogos sempre "muito disputados" quando ambas as equipas estavam no escalão principal do futebol português. E garante que apesar de estarem nos distritais, "a grandeza dos clubes mantém-se intacta, apesar de estarem em situações invulgares", o que torna este duelo "especial" até porque "os adeptos dão-lhe mais importância".
É que entre Estrela da Amadora e Belenenses "sempre houve rivalidade", de acordo com Rebelo, uma ideia partilhada por Filgueira, antigo defesa-central de 51 anos, que garante que essa rivalidade "vai sentir-se muito neste jogo, que será por isso diferente dos outros que estas duas equipas têm disputado esta época".
O Estrela da Amadora chama-se agora Clube Desportivo Estrela. "Não posso dizer que é o mesmo clube porque tudo é diferente, mas há que louvar estas pessoas, sócios do antigo Estrela, que assumiram um trabalho muito difícil que é começar do zero...", assume Rebelo, que ainda assim tem outro sentimento em relação a esta nova realidade: "Sinto que é uma parte do Estrela que está a nascer. Os adeptos estão lá, as pessoas que estão à frente também foram do Estrela, possivelmente no futuro ex-jogadores, como é o meu caso, podem regressar para os ajudar. É uma espécie de renascer e temos de louvar a coragem destas pessoas."
O antigo capitão não esconde a desilusão em relação ao processo que conduziu ao abismo do clube da Amadora. "Foi como se tivesse perdido uma parte de mim, afinal estive lá 14 anos e vivi momentos únicos que jamais irei esquecer. Foi um clube que fez parte da minha vida e não fez do futuro porque eles não quiseram, e tenho muita pena por isso, pois estou convencido que se o Estrela tivesse aproveitado os jogadores que por lá passaram, tenho quase a certeza absoluta que tinham feito um bom trabalho e o clube não acabaria", sublinha, ao mesmo tempo que responsabiliza "a má gestão de todos" pela situação a que se chegou.
Apesar da situação do Belenenses ser diferente, Filgueira mostra-se um apoiante a 100% da decisão da direção do clube em se afastar da SAD e lançar uma equipa a partir dos distritais. "Não há muito a fazer. Cada um tem de seguir o seu caminho, pois não vejo qualquer possibilidade de união. Pessoalmente não me revejo na SAD e por isso desliguei-me completamente dessa equipa que está na I Liga. Tenho lá amigos, ex-colegas e jogadores que treinei nas camadas jovens, mas não tenho qualquer relação sentimental com aquela equipa", garantiu.
Os olhos do antigo capitão do Belenenses estão postos no futuro. "Acredito que é possível chegar rapidamente à I Liga, mas trata-se de um plano que tem de ser bem pensado e bem executado. No futebol nunca há certezas, mas acredito que em breve chegaremos ao futebol profissional, mas isso vai depender sempre do investimento que for feito na equipa", explicou, deixando a certeza de que apesar de os azuis do Restelo estarem nos distritais, "a paixão dos adeptos não morreu e até os sócios regressaram ao estádio e seguem a equipa para todo o lado". E nesse sentido "é preciso lembrar o passado histórico do Belenenses" para que este renascimento seja uma realidade.
Em relação ao jogo deste domingo no Estádio José Gomes, Rebelo admite que o Belenenses "tem outras condições" que o Estrela não tem, algo que está bem patente na classificação da Série 2 da I Divisão da Associação de Futebol de Lisboa, na qual os azuis são líderes só com vitórias, estando o Estrela com dez pontos de atraso com mais um jogo disputado. "O Estrela começou com os miúdos e estou convencido que mais cedo ou mais tarde consigam chegar lá acima. Ainda espero estar vivo com o Estrela na I Divisão. Seria uma honra e uma alegria muito grande", disse.
Filgueira mostra um melhor conhecimento da equipa do Restelo. "Temos jogadores muito bons, jovens com boa formação e uma equipa que talvez tenha melhor qualidade de treino, por isso não prevejo que o Belenenses tropece na Reboleira, mas o mediatismo que está a rodear este jogo poderá torná-lo num jogo equilibrado, é isso que estou à espera", assumiu o ex-futebolista.
A maior coroa de glória do Estrela da Amadora foi alcançada em 1989/90, quando a equipa orientada por João Alves conquistou a Taça de Portugal numa final com o Farense. Na época anterior, o Belenenses conquistou a última das suas três Taças de Portugal frente ao Benfica, perdendo-se já na memória o título nacional de 1945/46.
Além dos títulos, representaram estes dois clubes grandes nomes do futebol nacional e bem recentemente ambos foram treinados por Jorge Jesus, tendo os amadorenses sido conduzidos pelo campeão europeu Fernando Santos durante quatro épocas (de 1994/95 a 1997/98).
Quanto a jogadores, o Estrela lançou no futebol nacional internacionais como Jorge Andrade, Paulo Bento, Dimas, Miguel, Abel Xavier, Calado, por exemplo, enquanto nos tempos mais recentes o Belenenses foi rampa de lançamento para Eliseu, Rolando, Cabral, César Peixoto, Gonçalo Brandão, Rúben Amorim e Neca, que se juntam a históricos como Pepe, Matateu, Vicente Lucas, Pietra, José Pereira, Félix Mourinho, Jorge Martins, entre outros.
No domingo é a história construída por estas e outras estrelas do futebol nacional que será recordada pelos adeptos que devem encher as bancadas do Estádio José Gomes. Os artistas serão outros, mas a paixão dos adeptos por estes dois clubes será a mesma de outros tempos. Apesar de as duas equipas estarem nos distritais.