Polícia está a investigar ameaça a "Bolsonaro de saias"
Como num filme de mafiosos, Joice Hasselmann abriu na semana passada a porta da sua residência em São Paulo e encontrou uma cabeça de porco, uma peruca loira e um bilhete com a frase "vai sofrer e vai morrer". E este é apenas o último episódio em que a recém-eleita deputada federal pelo PSL, que se denomina "Bolsonaro de saias", é protagonista.
"Adianto que já chamei a polícia e que esse 'presentinho' não muda em um minuto o meu dia, tenho muito trabalho, sigo a agenda e não tenho medo de bandido", reagiu, pelas redes sociais, a propósito da ameaça. José Mariano Araújo, delegado de polícia, confirmou que as autoridades estão "a ouvir testemunhas e a tentar fazer levantamento de impressões digitais da encomenda".
De acordo com Hasselmann, as ameaças não são novidade. "Durante a campanha chegaram a entrar armados no flat em que eu morava, passei 20 dias a dormir escondida numa maca de uma clínica médica."
Joice Hasselmann, nascida há 40 anos em Ponta Grossa, cidade do Paraná de onde é natural também o ministro da Justiça, Sérgio Moro, foi, com mais de um milhão de sufrágios, a deputada federal mais votada da história do Brasil nas eleições legislativas de dia 7 de outubro.
Jornalista de formação, em 2014 foi despedida da revista Veja e punida pelo conselho de ética do sindicato da categoria do estado do Paraná, após 23 companheiros de trabalho de diversos veículos de comunicação, incluindo da própria Veja, a terem acusado de 65 plágios em reportagens assinadas por 42 profissionais diferentes ao longo de meras três semanas.
Desde então, passou a publicar textos e vídeos nas redes sociais, conotados com a extrema-direita, que se tornaram recorde de audiências. Em dois dos mais vistos, já durante a campanha eleitoral, sugeria uma fraude, ao garantir que se o eleitor digitasse o número 1 na urna eletrónica, automaticamente surgiria a imagem do candidato do PT Fernando Haddad - no Brasil, a votação é realizada em máquinas tipo multibanco em que se digita o número do candidato, quer Haddad (13) quer Bolsonaro (17) tinham números iniciados por 1. O vídeo foi enquadrado pelo Tribunal Eleitoral na categoria fake news.
Noutra ocasião, anunciou, sem citar fontes nem apresentar provas, que a sua antiga empregadora, a Veja, recebera 600 milhões de reais (cerca de 135 milhões de euros) para escrever uma reportagem contra Bolsonaro nos últimos dias de campanha.
Uma vez eleita, promete continuar a publicar textos e vídeos para transformar "o Congresso Nacional num reality show". "Deputado não é superautoridade, foi eleito para representar o povo, é empregado do povo, as pessoas vão saber de tudo em lives, eu faço prestação de contas desde o primeiro dia da eleição."
Como principais medidas no Parlamento, Hasselmann, que é dona de uma espingarda semiautomática AR-15, promete defender a flexibilização da posse e do porte de armas e o fim das visitas íntimas para condenados por crimes hediondos.
Não equaciona disputar a presidência da Câmara dos Deputados, apesar da sua forte votação, mas ambiciona ser líder parlamentar do PSL se o grupo de 52 deputados do partido e o próprio Jair Bolsonaro assim o entenderem.
Bolsonaro, aliás, costuma ouvi-la. Aproximou-se de João Doria (PSDB), entretanto eleito governador de São Paulo, e de Rodrigo Maia (DEM), candidato à reeleição como presidente da Câmara dos Deputados, por sugestão dela.
Em comum, segundo a Veja, a mesma revista que há quatro anos a despediu, Hasselmann e o presidente têm, além das ideias políticas, o enorme aparato de seguranças e guarda-costas de que usufruem cada vez que pisam fora de casa. "Por algum motivo me chamam de Bolsonaro de saias, o que eu incentivo, não acho ofensivo, pelo contrário, vejo como elogio compararem-me ao capitão."