O antigo presidente Lula da Silva, líder das sondagens para as eleições de outubro, cumpre pena de prisão de 12 anos e um mês por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do apartamento tríplex oferecido, segundo o juiz Sergio Moro, pela construtora OAS. Responde a mais seis ações, três na Lava-Jato e três noutras operações, envolvendo favorecimento a empresas..O presidente da República, Michel Temer, sabe que ao sair em outubro do Planalto enfrentará em primeira instância quatro processos: por supostamente chefiar "o quadrilhão do MDB", acusado de desviar 150 milhões de euros, por beneficiar empresas do setor portuário, no porto de Santos, por ter recebido doações ilícitas, da empreiteira Odebrecht, e pelo célebre caso da mala, recebida pelo seu assessor especial numa pizaria..Primeiro presidente eleito após a redemocratização, Collor de Mello, candidato zero por cento nas sondagens neste ano, é réu na Lava-Jato e tem mais seis inquéritos à perna por organização criminosa, lavagem de dinheiro e corrupção passiva..Rodrigo Maia, o presidente da Câmara dos Deputados e pré-candidato que também habita o fundo da classificação das pesquisas, é investigado por ter recebido doações da Odebrecht sob o nome de código "Botafogo", o seu clube do coração..O ministro das Finanças, Henrique Meirelles, outro pré-candidato até agora numericamente irrelevante, presidiu a J&F, nada menos do que o grupo empresarial de Joesley e Wesley Batista, dois dos maiores corruptores de políticos do Brasil..Na planilha de pagamentos ilícitos da Odebrecht, o candidato Geraldo Alckmin, um dos favoritos, era conhecido pela alcunha "o santo". Foi citado por três executivos da empresa como destinatário de recursos não declarados de campanha..A candidata Manuela D'Ávila, cujo código era o "avião", recebeu recursos ilegais da construtora..Marina Silva e Álvaro Dias, candidatos em fase ascensional nas pesquisas eleitorais, foram citados mas não respondem a nenhum inquérito. Ciro Gomes, principal nome à esquerda fora Lula, nunca foi citado - mas o seu irmão, o aliado e também político Cid Gomes, consta da delação dos irmãos Batista..O segundo classificado, Jair Bolsonaro, é réu por incitamento ao estupro, racismo e injúrias e também aparece na lista de quase 2000 políticos ajudados pela J&F..Em lugar nenhum do sistema solar, do Mesolítico aos dias de hoje, há precedentes de um conjunto tão grande de candidatos, seja ao que for, atingidos, nas vísceras ou de raspão, por atividades ilegais na política..O Brasil de hoje só é comparável ao fenómeno ocorrido na mítica Volta à França em bicicleta da viragem do século, cuja 105.ª edição vai começar no sábado. Tal como por aqueles anos eram raríssimos os que arriscavam subir o Alpe d'Huez ou o Col du Tourmalet a paniagua - a expressão em italiano para "a pão e água" e que significa, na gíria ciclística, pedalar sem recurso a substâncias proibidas - nos tempos que correm também são incomuns os políticos brasileiros que concorreram a eleições do toda a espécie sem o doping dos financiamentos ilegais de campanha..Uma megaoperação policial da polícia espanhola, a Operación Puerto, descobriu então um sofisticado esquema de mentiras. Como a Lava-Jato, foi acusada, talvez com razão, de excessos e de injustiças. Mas teve o mérito de dizimar a fraude generalizada..No Tour de 2000, por exemplo, dos dez primeiros da tabela final só o décimo classificado, o italiano Daniele Nardello, correu, ao que tudo indica, a paniagua - os nove que o antecederam nos Campos Elísios ou perderam a posteriori o posto ou falharam testes antidopagem naquela corrida ou noutro ponto da carreira. Em 2002 e 2004, por sua vez, o português José Azevedo e o espanhol Carlos Sastre eram os únicos inocentes do top ten..Na política do Brasil, até o preferido do povo, dono de uma inspiradora história de vida e sobrevivente a um cancro, o incontornável Lula, caiu na armadilha do doping eleitoral. É verdade que não errou mais do que os outros, mas ele, como Lance Armstrong, pelo que representava no meio do pelotão, não podia falhar.