O primeiro-ministro israelita, Benjamin Netanyahu, venceu as eleições de segunda-feira, mas ficou aquém da maioria que desejava e tem pela frente negociações para conseguir aquilo que nas outras duas eleições no espaço de um ano não conseguiu: formar governo..Com 99% dos votos contabilizados (os resultados finais só serão conhecidos na quarta ou quinta-feira), o Likud tem o melhor resultado de sempre sob o comando de Netanyahu, elegendo 36 deputados entre os 120 do Knesset. Mas a aliança com os seus aliados de centro-direita - o Shas (nove deputados), o Judaísmo Unido da Torá (sete) e o Yamina (seis) - não vai além dos 58 representantes, a três da barreira da maioria absoluta (61)..O seu principal rival, Benny Gantz, da aliança Azul e Branca, que tinha ganho as eleições de setembro de 2019 mas não conseguiu formar governo, não foi além dos 33 deputados (os mesmos que já tinha tido em setembro). A aliança de esquerda entre o Partido Trabalhista, o Gesher e o Meretz elegeu apenas sete representantes (tinham tido 11 nas eleições de setembro, quando o último partido foi a votos junto com os Verdes)..O bloco de centro-esquerda fica completo com a Lista Conjunta, que inclui os partidos da minoria árabe e que foi outra das vencedoras da noite além do Likud. Subiu dois deputados, para os 15. Mas mesmo que estes apoiassem Gantz, os 55 deputados não são suficientes para derrotar Netanyahu..O Yisrael Beiteinu, de Avigdor Lieberman, volta a ser o "fazedor de reis", podendo fazer pender a balança para um ou outro lado, apesar de o partido liberal ter perdido três representantes e eleger apenas sete deputados..A participação situou-se nos 71%, ligeiramente acima dos 69,8% da anterior eleição..Consegue Netanyahu formar governo?.O primeiro-ministro israelita, de 70 anos, procura o quinto mandato e conseguiu derrotar o principal rival. Mas os 58 deputados do centro-direita não chegam para ter garantida a formação de governo, ainda para mais sabendo-se que após as eleições de abril o bloco tinha 60 representantes e Netanyahu não conseguiu o voto que precisava para ter a maioria..Ao contrário do que aconteceu em abril, quando a aliança Azul e Branca elegeu os mesmos 35 deputados que o Likud, desta vez Gantz não foi além dos 33, a três de Netanyahu. Isto depois de em setembro, quando os israelitas foram pela segunda vez às urnas no espaço de um ano, ter sido o mais votado: elegendo os mesmos 33 representantes, mais um que o Likud que teve então 32..Apesar dos problemas com a justiça, Netanyahu é o primeiro-ministro há mais anos no poder em Israel e sempre gozou de enorme popularidade..Ainda sem os resultados oficiais conhecidos, e sem ter ainda um mandato oficial da parte do presidente Reuven Rivlin para formar governo, o líder do Likud já começou os contactos. Após uma reunião de Netanyahu com os partidos que o apoiaram nas outras eleições, o Likud emitiu um comunicado a dizer que tinham concordado em trabalhar juntos e não afastavam a possibilidade de incluir na coligação "partidos que reconhecem Israel como um Estado democrático e judaico", numa aparente referência ao Yisrael Beiteinu (e excluindo a Lista Conjunta)..Lieberman já fez parte da coligação de governo com Netanyahu, mas abandonou-a em desentendimento com os partidos ortodoxos e ultraortodoxos que apoiam o primeiro-ministro. Uma abstenção do seu partido seria suficiente para garantir a eleição de Netanyahu, já que o chefe do governo não precisa de maioria absoluta, mas de maioria simples para ser eleito..Segundo o jornal israelita Haaretz, o Likud estará a pressionar pelo menos uma deputada da Azul e Branca para desertar e votar a favor de Netanyahu, depois de terem sido reveladas gravações em que um assessor diz que Omer Yankelevich apelidou Gantz de "perdedor idiota inapto para ser primeiro-ministro". De acordo com o jornal, o Likud ameaça revelar mais gravações embaraçosas caso ela não os apoie, mas o partido nega a acusação..Outra hipótese que está a ser apresentada pelos media é a de um eventual dissidente votar a favor de Netanyahu, demitindo-se em seguida do cargo de deputado em troca e um cargo fora do Parlamento (como por exemplo como embaixador ou embaixadora) e a promessa de poder entrar nas listas do Likud nas próximas eleições. O problema com dissidentes é que, de acordo com a lei, um terço de cada partido político pode ir para outro sem consequências legais ou sanções, mas menos do que isso enfrenta problemas..O que acontece ao julgamento de Netanyahu?.Netanyahu consegue a maior vitória para o Likud apesar de estar chamado para, dentro de duas semanas, se sentar no banco dos réus, para ser julgado por suborno, fraude e quebra de confiança - é acusado de aceitar presentes exorbitantes e trocar favores políticos por uma cobertura noticiosa favorável. O primeiro-ministro nega as acusações, alegando que há motivos políticos por detrás do julgamento..Se conseguir formar governo, terá outros argumentos para lutar contra as acusações, havendo quem fale na hipótese de uma mudança na lei que permita ao Knesset decidir por cima do Supremo Tribunal e evitar o julgamento. Primeiro, os advogados podem tentar pedir um adiamento do processo, mas os analistas acreditam que mesmo que o consigam, não será um adiamento por muito tempo: os tribunais não vão querer ser vistos como estando a fugir das responsabilidades, mas também não querem ser vistos como um entrave à formação de governo, segundo o jornalista Yonah Jeremy Post, do The Jerusalem Post..O julgamento está marcado para 17 de março, sendo esperado que por volta dessa mesma data o presidente convide Netanyahu para formar governo - os resultados oficiais só serão transmitidos a Rivlin a 10 de março pelo Comité Central de Eleições, tendo este depois sete dias para ouvir os partidos e decidir quem é que tem mais possibilidade de formar governo. O escolhido tem 28 dias para conseguir a maioria, podendo o prazo ser alargado ainda mais duas semanas..A lei israelita exige que os ministros que enfrentam processos judiciais se demitam, mas não diz nada em relação ao primeiro-ministro. Netanyahu poderá ser o primeiro chefe de governo a ser julgado enquanto ainda está o cargo, havendo, contudo, quem esteja a tentar travar na justiça a possibilidade de ele poder ser convidado a formar governo por Rivlin. Em janeiro, o tribunal já tinha rejeitado um pedido nesse sentido, dizendo que era "prematuro"..O fim de Gantz?.O líder da aliança Azul e Branca não conseguiu aproveitar os problemas que Netanyahu enfrenta com a justiça para se conseguir distanciar ainda mais do líder do Likud das urnas, apesar de ter ficado à sua frente nas eleições de setembro..O general Gantz, antigo chefe do Estado-Maior das Forças de Defesa Israelitas, formou a Azul e Branca há menos de um ano - é a união de dois partidos de centro, o Partido da Resiliência de Israel, de Gantz, o Yesh Atid, de Yair Lapid, e o Telem, de Moshe Ya'alon. Em três eleições consecutivas conseguiu atrair o voto de um terço dos eleitores, mas para sobreviver terá de conseguir manter a união da jovem aliança..A gravação em que se alega que uma deputada da aliança disse que Gantz era um "perdedor idiota inapto para ser primeiro-ministro" parece ir ao encontro do que alguns eleitores pensam, que o líder da Azul e Branca não tem o carisma necessário para assumir a chefia de governo..Inicialmente, a ideia da aliança era uma partilha do cargo de primeiro-ministro entre Gantz e Lapid, mas este último recuou após as eleições de setembro, dizendo apoiar totalmente a liderança de Gantz. Uma eventual passagem pela oposição (nada garante que Gantz já está fora do governo, podendo haver um apoio de última hora de Lieberman) pode alterar a situação interna..E depois há a dúvida sobre se o partido, que conseguiu centralizar o sentimento de "todos menos Netanyahu", pode sobreviver à futura saída do líder do Likud. Qual será então a mensagem? E o que acontecerá aos ex-Likud que estão no partido só por terem entrado em desacordo com Netanyahu?.Quem irá Lieberman apoiar?.O "fazedor de reis" perdeu deputados, podendo os eleitores ter optado por castigar Lieberman por não ter ajudado a desbloquear a situação política e ter levado o país para as terceiras eleições no espaço de um ano. Mas o líder do Yisrael Beiteinu continua a ter nas mãos a possibilidade de pôr Netanyahu ou Gantz no poder..Ex-ministro dos Negócios Estrangeiros e depois da Defesa de Netanyahu, Lieberman deixou o governo em protesto contra um cessar-fogo em Gaza em novembro de 2018. Mas também, como líder de um partido secular, nunca esteve à vontade com a aliança com os partidos ortodoxos e ultraortodoxos que apoiam Netanyahu, defendendo, por exemplo, que os ultraortodoxos devem ser obrigados a cumprir também o serviço militar..Durante a campanha, Netanyahu teve especial atenção aos eleitores israelitas de origem russa (cerca de um milhão) que normalmente votavam em Lieberman (nascido na Moldávia). Entre outras coisas, fez várias aparições públicas ao lado do presidente russo, Vladimir Putin, distribuindo também mensagens em russo nas redes sociais. Algum do apoio extra que conseguiu pode ter sido às custas de Lieberman..O líder do Yisrael Beiteinu tem repetido que não vai permitir que Israel vá às quartas eleições, mas não tem explicado como, tendo pedido aos seus apoiantes que esperassem o resultado final do escrutínio antes de tomar uma posição. Apesar do seu desdém pelos ortodoxos, Lieberman também não suporta os deputados árabes da Lista Conjunta - aos quais já apelidou "apoiantes do terrorismo" - de que Gantz depende para poder chegar a primeiro-ministro..Na prática, basta uma abstenção dos deputados do seu partido para garantir a eleição de Netanyahu, que teria então um governo sem maioria no Knesset..A subida dos partidos árabes vai continuar?.Os partidos árabes, reunidos na Lista Conjunta, têm o melhor resultado de sempre em Israel, elegendo 15 deputados (mais dois do que em setembro e mais cinco do que em abril)..Segundo o Haaretz, há duas razões que explicam o crescimento da Lista Conjunta: um aumento do número de eleitores dentro da comunidade árabe israelita (descendentes dos palestinianos que continuaram nas suas terras após a criação de Israel em 1948 e que são uma minoria de 21% em Israel) e a queda de apoio entre estes pelos partidos judaicos. Muitos tinham votado na Azul e Branca nas eleições anteriores, tendo recuado depois de Gantz ter dito que não queria o apoio da Lista Conjunta..De acordo com os números preliminares citados pelo jornal, nas localidades árabes, 65% dos eleitores foram votar, contra 49% em abril e 59% em setembro. Foi a maior participação entre este eleitorado desde 1999. A razão do interesse especial destes eleitores foi uma: "o acordo do século" do presidente norte-americano, Donald Trump..O plano de paz de Trump foi apresentado no final de janeiro e prevê a anexação dos colonatos da Cisjordânia, algo há muito desejado pelos colonos, tendo sido considerado demasiado pró-Israel - a data da sua apresentação também foi vista como uma tentativa do presidente norte-americano de beneficiar Netanyahu, que estava ao lado de Trump na cerimónia. Ainda antes de ser apresentado já tinha sido rejeitado pelos palestinianos..Apesar de os árabes israelitas poderem defender a criação do Estado palestiniano (os deputados árabes costumam pedir o fim da ocupação da Israel dos Territórios Palestinianos, queixando-se também de que as suas comunidades enfrentam discriminação na saúde, educação e habitação), o plano gerou alarme por ter levantado a possibilidade de que podiam perder a cidadania israelita numa troca de terras com os palestinianos..A transferência de população incluía um conjunto de dez municípios árabes, conhecidos como "o triângulo", onde se estima que vivam 350 mil árabes israelitas. Nestas localidades, a Lista Conjunta usou a ameaça da perda da cidadania israelita para apelar ao voto..Apesar do bom resultado eleitoral, a vitória de Netanyahu pode implicar que não têm qualquer palavra a dizer na formação de governo. Apesar disso, o seu líder, Ayman Odeh, estava confiante. "Temos de nos tornar a principal alternativa ao mapa político israelita. Isto é o início de uma verdadeira esquerda.".Este é o fim do Partido Trabalhista?.O Partido Trabalhista, que nasceu da união de três partidos de esquerda por onde passou o pai fundador de Israel, David Ben-Gurion, está em declínio desde 2001, tendo tido como último primeiro-ministro Ehud Barak. Esteve em governos posteriores, mas sempre como parceiro menor das coligações..Erros internos do partido, que alguns acusam de se ter afastado das raízes socialistas e outros de que ao apoiar os acordos de Oslo e de Camp David acabou por mostrar abertura e possibilidade de cedência aos palestinianos, junto com uma mudança do eleitorado (como a entrada dos imigrantes de origem russa, com tendência a votar à direita), resultaram numa queda acentuada nas urnas..A aliança que os trabalhistas (aliados com o Gesher) efetuaram com o Meretz acabou por não resultar, pelo que só estarão representados por três deputados no próximo Parlamento (em sete eleitos no total). Nas eleições de setembro tinham conseguido, separados, 11 deputados, mas enfrentavam agora o risco de um deles não passar a barreira mínima de votos para estar no Knesset e resolveram formar uma aliança de esquerda..A possibilidade de poderem estar no governo com Gantz é neste momento mínima, enfrentando a esquerda a possibilidade de ficar na oposição e com o desafio de se reinventar a tempo das próximas eleições, sejam elas dentro de poucos meses, se não houver acordo para formar novamente governo, ou quatro anos..(Notícia atualizada às 11.30, com os resultados já a 99%)