O centenário do Movimento 4 de Maio é assinalado com pompa e circunstância em Pequim. O líder Xi Jinping elogiou o espírito patriótico e modernizador dos jovens que há cem anos denunciaram a humilhação resultante do Tratado de Versalhes e exigiram democracia e ciência. No entanto, o ambiente nas universidades é de maior controlo ideológico e de prudência num ano marcado por aniversários sensíveis..É um momento de viragem na história contemporânea da China. Um século depois, o Movimento de 4 de Maio é celebrado quer pelo Partido Comunista da China (PCC) em Pequim, quer pelo Partido Nacionalista (Kuomintang) em Taipé, como dínamo para um novo patriotismo, promoção da democracia e modernidade, numa ainda frágil República da China estabelecida apenas oito anos antes, colocando um ponto final à dinastia Qing e aos ciclos imperiais milenares..Naquele dia 4 de maio, milhares de jovens universitários afluíram à Praça de Tiananmen para protestar contra o Tratado de Versalhes - que concedia territórios ocupados pela Alemanha na região de Shandong ao Japão. Ou seja, o território passaria das mãos de um poder imperial para uma nova ocupação colonial, algo inaceitável para os estudantes que gritavam "abaixo os traidores". Sob intensa pressão, as autoridades chinesas acabaram por se recusar a assinar o Tratado de Versalhes em Paris, fazendo que o movimento tivesse uma primeira vitória. Esta acabou por ser sobretudo simbólica, uma vez que os japoneses acabaram mesmo por ocupar a península de Shandong. Todavia, o que sobressaiu do movimento foi uma capacidade de mobilização de jovens e classes sociais por todo o país, numa onda de solidariedade e cooperação que deixou sementes para uma transformação que veio a ser conhecida como o Novo Movimento Cultural da China - um período compreendido entre 1915 e 1921. Um texto publicado na altura por Chen Dixiu, diretor da Universidade de Pequim, salientava dois conceitos- chave: "Democracia e ciência, a única via "para que a China saísse da escuridão intelectual, moral e política em que se encontrava".".Embrião do Partido Comunista.Como resultado deste movimento, que acordou jovens e intelectuais, o sentimento anti-imperialista acentuou-se, estando lançadas as bases para grupos de cariz esquerdista proliferarem. Não foi por acaso que dois anos depois era criado o PCC, onde figuravam alguns dos destacados líderes estudantis de 4 de maio, como Li Dazhao e Chen Duxiu, que acabou por ser afastado em 1929. Mao Tsé-tung fazia questão de situar o movimento de 1919 como uma das origens do espírito que guiou o PCC na Revolução de 1949 que implementou a República Popular da China..Nesta semana, o PCC assinalou a efeméride com uma sessão solene no Grande Palácio do Povo e Pequim, em que o líder Xi Jinping falou do Movimento de 4 de Maio como uma grande campanha patriótica e revolucionária de luta do povo contra o imperialismo e feudalismo. Ao mesmo tempo, o presidente chinês sublinhou a forma como aquele movimento inspirou a ambição e confiança do povo chinês para concretizar o rejuvenescimento da nação, um conceito que Xi tem usado frequentemente desde que assumiu a liderança do PCC e do Estado em 2012 e 2013..Prudência e controlo ideológico.O foco do discurso político na juventude é visto por analistas como sedimentar a implantação do partido numa camada que, sendo tendencialmente mais idealista também poderá ser um foco de contestação. "O PCC deposita esperanças nos jovens, uma vez que a maioria das pessoas de meia-idade ou mais velhas já não acreditam nesta narrativa", afirma Zhang Lifan, comentador político baseado em Pequim, citado pelo jornal de Hong Kong South China Morning Post..Apesar de ser elogiado e visto como estando parcialmente na origem do nascimento do PCC, o Movimento 4 de Maio também tem servido de argumentação para os críticos do governo central chinês e do PCC. Há 30 anos, quando ocupavam a Tiananmen, estudantes lançavam o Novo Manifesto do 4 de Maio. Mais recentemente, no ano passado, um grupo de estudantes da Universidade de Pequim acusava a instituição de ter abandonado os valores do 4 de Maio, após uma colega sua, estudante marxista e feminista, ter sido alegadamente assediada por funcionários da universidade. Nos últimos meses, foram relatados vários casos de questão de restrições à liberdade académica e controlo ideológico na China, através de mobilização de estudantes para monitorizar opiniões políticas consideradas "radicais", tendo professores sido afastados ou punidos. Em declarações ao The New York Times, Guo Yuhua, um académico da Universidade de Tsinghua conhecido por ter posições mais críticas, afirmou que "desde o início do ano académico que nos disseram que este não é um ano qualquer, sendo bastante sensível, pelo que não devemos expressar determinadas opiniões". Guo referia-se aos aniversários redondos assinalados em 2019, nomeadamente os 30 anos sobre a repressão sangrenta dos estudantes na Praça de Tiananmen, a 4 de junho de 1989, e o 70.º aniversário do estabelecimento da República Popular da China, que é celebrado a 1 de outubro.
O centenário do Movimento 4 de Maio é assinalado com pompa e circunstância em Pequim. O líder Xi Jinping elogiou o espírito patriótico e modernizador dos jovens que há cem anos denunciaram a humilhação resultante do Tratado de Versalhes e exigiram democracia e ciência. No entanto, o ambiente nas universidades é de maior controlo ideológico e de prudência num ano marcado por aniversários sensíveis..É um momento de viragem na história contemporânea da China. Um século depois, o Movimento de 4 de Maio é celebrado quer pelo Partido Comunista da China (PCC) em Pequim, quer pelo Partido Nacionalista (Kuomintang) em Taipé, como dínamo para um novo patriotismo, promoção da democracia e modernidade, numa ainda frágil República da China estabelecida apenas oito anos antes, colocando um ponto final à dinastia Qing e aos ciclos imperiais milenares..Naquele dia 4 de maio, milhares de jovens universitários afluíram à Praça de Tiananmen para protestar contra o Tratado de Versalhes - que concedia territórios ocupados pela Alemanha na região de Shandong ao Japão. Ou seja, o território passaria das mãos de um poder imperial para uma nova ocupação colonial, algo inaceitável para os estudantes que gritavam "abaixo os traidores". Sob intensa pressão, as autoridades chinesas acabaram por se recusar a assinar o Tratado de Versalhes em Paris, fazendo que o movimento tivesse uma primeira vitória. Esta acabou por ser sobretudo simbólica, uma vez que os japoneses acabaram mesmo por ocupar a península de Shandong. Todavia, o que sobressaiu do movimento foi uma capacidade de mobilização de jovens e classes sociais por todo o país, numa onda de solidariedade e cooperação que deixou sementes para uma transformação que veio a ser conhecida como o Novo Movimento Cultural da China - um período compreendido entre 1915 e 1921. Um texto publicado na altura por Chen Dixiu, diretor da Universidade de Pequim, salientava dois conceitos- chave: "Democracia e ciência, a única via "para que a China saísse da escuridão intelectual, moral e política em que se encontrava".".Embrião do Partido Comunista.Como resultado deste movimento, que acordou jovens e intelectuais, o sentimento anti-imperialista acentuou-se, estando lançadas as bases para grupos de cariz esquerdista proliferarem. Não foi por acaso que dois anos depois era criado o PCC, onde figuravam alguns dos destacados líderes estudantis de 4 de maio, como Li Dazhao e Chen Duxiu, que acabou por ser afastado em 1929. Mao Tsé-tung fazia questão de situar o movimento de 1919 como uma das origens do espírito que guiou o PCC na Revolução de 1949 que implementou a República Popular da China..Nesta semana, o PCC assinalou a efeméride com uma sessão solene no Grande Palácio do Povo e Pequim, em que o líder Xi Jinping falou do Movimento de 4 de Maio como uma grande campanha patriótica e revolucionária de luta do povo contra o imperialismo e feudalismo. Ao mesmo tempo, o presidente chinês sublinhou a forma como aquele movimento inspirou a ambição e confiança do povo chinês para concretizar o rejuvenescimento da nação, um conceito que Xi tem usado frequentemente desde que assumiu a liderança do PCC e do Estado em 2012 e 2013..Prudência e controlo ideológico.O foco do discurso político na juventude é visto por analistas como sedimentar a implantação do partido numa camada que, sendo tendencialmente mais idealista também poderá ser um foco de contestação. "O PCC deposita esperanças nos jovens, uma vez que a maioria das pessoas de meia-idade ou mais velhas já não acreditam nesta narrativa", afirma Zhang Lifan, comentador político baseado em Pequim, citado pelo jornal de Hong Kong South China Morning Post..Apesar de ser elogiado e visto como estando parcialmente na origem do nascimento do PCC, o Movimento 4 de Maio também tem servido de argumentação para os críticos do governo central chinês e do PCC. Há 30 anos, quando ocupavam a Tiananmen, estudantes lançavam o Novo Manifesto do 4 de Maio. Mais recentemente, no ano passado, um grupo de estudantes da Universidade de Pequim acusava a instituição de ter abandonado os valores do 4 de Maio, após uma colega sua, estudante marxista e feminista, ter sido alegadamente assediada por funcionários da universidade. Nos últimos meses, foram relatados vários casos de questão de restrições à liberdade académica e controlo ideológico na China, através de mobilização de estudantes para monitorizar opiniões políticas consideradas "radicais", tendo professores sido afastados ou punidos. Em declarações ao The New York Times, Guo Yuhua, um académico da Universidade de Tsinghua conhecido por ter posições mais críticas, afirmou que "desde o início do ano académico que nos disseram que este não é um ano qualquer, sendo bastante sensível, pelo que não devemos expressar determinadas opiniões". Guo referia-se aos aniversários redondos assinalados em 2019, nomeadamente os 30 anos sobre a repressão sangrenta dos estudantes na Praça de Tiananmen, a 4 de junho de 1989, e o 70.º aniversário do estabelecimento da República Popular da China, que é celebrado a 1 de outubro.