Nepal, Sri Lanka, Rússia e Bélgica conseguiram conter o covid-19. Portugal tem dois casos

Há nove países dos 60 já afetados pelo covid-19 que há mais de 15 dias não registam novos casos. No continente europeu, dos 28 atingidos, só a Rússia e a Bélgica estão nesta situação, há 30 e há 26 dias, respetivamente. Portugal foi dos que resistiram mais tempo aos casos confirmados. Mas enquanto o surto não for estancado em Hubei, ninguém pode descansar, defende o virologista Jaime Nina.
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Nepal, Sri Lanka, Camboja, Rússia e Filipinas foram dos primeiros países a registar casos de coronavírus, depois de a doença ter sido detetada na China, mas também são os que há mais tempo não registam novos casos. Portugal, depois de 85 casos suspeitos, tem agora dois confirmados, um homem de 66 anos e outro de 33, que estão a ser acompanhados e tratados nos hospitais de São João e Santo António, no Porto.

Mas, no que toca ao resto do mundo, e de acordo com dados divulgados pela OMS nas últimas 24 horas, há nove dos 60 países atingidos que estão a conseguir conter o vírus. Por exemplo, o Nepal foi o país que até agora só notificou um caso há 48 dias e desde essa altura que não regista mais nenhum. O Sri Lanka e o Camboja também, um caso cada um há 34 dias, e sem novos casos. Nos três países, todos os casos foram importados.

Na Europa, a Rússia, com dois casos importados, e a Bélgica, com um, são exemplo. Um e outro não registam novos casos há 30 e 26 dias, respetivamente. A Rússia, que anualmente recebe quase 2,5 milhões de chineses, em turismo ou negócios, tomou como medida principal o encerramento das fronteiras com a China, proibindo a entrada de chineses, fosse de que ponto fosse do país, e proibindo viagens de cidadãos russos para aquele país. A Bélgica até agora conseguiu monitorizar as entradas no país. Para o virologista Jaime Nina, o facto de "estes países não registaram nenhum caso há tanto tempo quer dizer que já não têm o vírus ou que, então, têm uma doença mais leve".

Mas no mundo há mais países que não registam qualquer situação há mais de 15 dias. É o caso da Índia que, segundo os dados da OMS, até agora só registou três casos importados, sendo o último há 27 dias. As Filipinas tiveram também três casos importados, uma morte, e há 26 dias que não têm novas situações. O Vietname teve 16 casos, alguns já devidos a transmissão local, mas o último já foi notificado há 17 dias. O Egito teve um caso há 16 dias e mais nenhum outro.

Há um outro fator importante. A maioria dos países que estão a conseguir conter o vírus registaram apenas casos importados. Ou seja, não houve transmissão local. O que aconteceu em Itália - as próprios autoridades de saúde admitiram ter tido dificuldade em identificar o paciente zero -, sendo neste momento o país da Europa com a situação mais grave: mais de dois mil infetados e mais de 50 mortes. A zona norte é a mais afetada, mas há casos confirmados também no centro e no sul do país.

A União Europeia não decretou o encerramento do espaço Schengen. As autoridades de saúde portuguesas, a partir do momento em que foram confirmados os primeiros casos em Itália, pediram bom senso e precaução a quem tivesse estado nas regiões italianas, para que, se tivessem sintomas, ficassem em casa e contactassem a Linha de Saúde 24 e não se dirigissem a um serviço de urgência. Um dos casos agora confirmados é mesmo de um médico de 60 anos que esteve de férias no norte daquele país e que sentiu os primeiros sintomas a 29 de fevereiro. O outro caso, um homem de 33, teve os primeiros sintomas a 26 de fevereiro e a sua ligação ao vírus parece estar em Espanha, em Valência. Segundo o último boletim da Direção-geral da Saúde, o estado de ambos é estável.

Para o especialista português, "deixámos de ser a anomalia na Europa. Já temos dois casos, não seria normal se também não os tivéssemos", mas é preciso "saber lidar com a situação". Jaime Nina reafirma a necessidade de não se entrar numa onda de alarmismo, mas também não se deve deixar de tomar as medidas necessárias, como o cancelamento de eventos desportivos ou de música, iniciativas como congressos ou conferências. Ao DN o médico salientou que, "tudo depende da evolução do número de casos, se começarmos a ter muitos, eu proporia que se cancelassem eventos que reunissem muitas pessoas, como jogos de futebol que, apesar de serem ao ar livre, reúnem milhares de pessoas".

Em Portugal, os clubes da I e da II Ligas de futebol também já afirmaram estar disponíveis para fazerem jogos à porta fechada ou ter de adiar jornadas caso a situação o justifique. Mas outras medidas terão de ser tomadas. Hoje mesmo a Apifarma, a associação que representa a indústria farmacêutica, e a Ordem dos Médicos fizeram uma recomendação conjunta para que, sempre que possível, procedam ao adiamento dos eventos que tenham agendados, como conferências, congressos, seminários, simpósios", argumentando que se trata de "uma medida preventiva que deverá manter-se enquanto os riscos para a saúde pública se mantiverem nos atuais níveis".

Vamos conseguir conter o vírus ou teremos pandemia? Tudo depende da China

A pergunta que agora se impõe, não só para Portugal, mas também para o resto do mundo, é se se consegue conter o vírus ou se teremos mesmo uma pandemia. Para Jaime Nina tudo dependerá do que acontecer na China. E, apesar de as notícias começarem a ser positivas, já que o dia 1 de março foi o dia em que a província de Hubei registou o menor número de casos suspeitos, apenas 64, o que não acontecia há muito tempo, e só com 570 confirmados, não se sabe ao certo a dimensão da situação. Ou seja, o dia 1 de março foi aquele em que em todo o território chinês se registaram 579 casos, só nove fora de Hubei, e 132 casos suspeitos, 68 fora desta província. O médico português explica: "É uma boa notícia, pode querer dizer que estão a conseguir estancar o vírus, mas, ao certo, não sabemos." Até porque, argumenta, a OMS divulgou há dias ter sido informada pela China que a província de Hubei tinha atingido o seu limite, não tendo mais capacidade para testar todos os doentes suspeitos com a PCR, passando assim a notificar só os casos confirmados e os possíveis. "Ora, isto também é muito importante, pois, por outro lado, pode significar que deixámos de saber quantos casos há na verdade."

Reforçando que o saber-se o número de mortes com certezas é muito importante. Até agora, e de acordo com o número de mortes referido pela OMS, pode dizer-se que há uma taxa de letalidade baixa - sendo que esta corresponde ao número de mortes por população infetada - na China, fora da província de Hubei.

Segundo os últimos dados divulgados pela OMS, referentes ao balanço do dia 1 de março, havia na província de Hubei 66 907 infetados com o covid-19, enquanto em todo o território chinês havia só mais 13 mil casos. Ao todo, 79 968 infetados. A taxa de letalidade na província de Hubei, que reúne 13 cidades, e uma população idêntica à de França, cerca de 60 milhões de pessoas, é de 4%, mas no resto da China é da ordem dos 0,7%.

Jaime Nina sublinha que se isto for mesmo assim que a China conseguiu fazer o que seria impensável na UE e no resto do mundo. "Conseguiram isolar dentro do próprio país uma província com uma população idêntica à de França, vamos ver se conseguem manter aquela zona mais tempo fechada", afirmou.

O médico defende ainda que para se estancar o vírus seria necessário definir-se, se calhar, "um plano Marshall", o principal plano dos Estados Unidos para ajudar à reconstrução dos países aliados da Europa nos anos seguintes à Segunda Guerra Mundial. "Eu proporia que o mundo se unisse e enviasse desde técnicos a laboratórios para ajudar a China na notificação de casos como no tratamento, não sei se a China aceitaria, mas era uma forma de se atacar a situação."

Nesta segunda-feira, Portugal confirmou dois casos importados de coronavírus, mas outros países como Arábia Saudita, Jordânia, Tunísia e Irlanda também deram conta dos primeiros casos.

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