Rio Ave sonha juntar o Milan aos outros gigantes que caíram em Portugal

V. Setúbal, Boavista, Sp. Braga e V. Guimarães surpreenderam a Europa quando eliminaram clubes que já venceram a Champions. Os vila-condenses querem juntar-se, nesta quinta-feira, a este lote restrito de clubes "pequenos" que fizeram história.

"Acreditamos que somos capazes de alcançar o sonho." Foi assim que Bruno Moreira, avançado do Rio Ave, abordou o "jogo especial" desta quinta-feira, às 20.00, em Vila do Conde, com o todo-poderoso AC Milan. Esta é a barreira que separa os vila-condenses de alcançar pela segunda vez na sua história a fase de grupos da Liga Europa.

Apesar de não estar a viver os seus tempos áureos, o Milan conta no seu currículo sete títulos de campeão europeu, algo só superado pelo Real Madrid que conta com 13 Ligas dos Campeões. É um adversário de grande prestígio internacional que o Rio Ave terá pela frente, sendo certo que se vencer este jogo do play-off será um feito com enorme repercussão no mundo do futebol.

Stefano Pioli, treinador dos rossoneri, mostrou estar avisado ao dizer que "o Rio Ave é mais forte do que os adversários anteriores" da sua equipa nesta Liga Europa e por isso pede "concentração máxima" porque se trata de "um jogo em que o adversário é muito bom".

Em Vila do Conde, há a consciência de que o Rio Ave pode escrever nesta quinta-feira a página mais extraordinária da sua história. Aliás, o mote foi mesmo dado por Bruno Moreira: "Derrotar o Milan seria um feito histórico para o clube e para nós todos. Para a maior parte dos jogadores é a primeira vez que defrontam uma equipa destas." Normalmente, as grandes proezas são antecedidas de declarações como estas...

Apenas em sete ocasiões equipas portuguesas, fora do âmbito dos três grandes, conseguiram eliminar clubes que já venceram a Liga dos Campeões, com o Sporting de Braga a ter conseguido o feito por três vezes, o V. Setúbal por duas, enquanto Boavista e V. Guimarães fizeram-no por uma vez cada um. E atenção porque colossos como o Liverpool e o Inter Milão já caíram por duas vezes perante emblemas portugueses.

Quando o V. Setúbal de Pedroto fez história

O primeiro grande herói lusitano foi o Vitória de Setúbal que na época de 1969-70 afastou o Liverpool na segunda eliminatória da Taça das Cidades com Feira, atualmente designada de Liga Europa. Os sadinos eram treinados pelo histórico José Maria Pedroto e no Estádio do Bonfim triunfaram por 1-0, graças a um golo de Fernando Tomé aos 40 minutos.

O Liverpool, treinado pelo mítico Bill Shankly e recheado de internacionais ingleses e escoceses, prometeu vingar-se em Anfield, mas um início de jogo memorável do Vitória fez com que aos 56 minutos já vencessem por 2-0 graças aos golos de Wagner Canotilho, de penálti, e a um autogolo de Geoff Strong. Reagiram os reds, que acabaram por dar a volta ao marcador, mas não à eliminatória. Venceram por 3-2, graças a um penálti de Tommy Smith e a dois golos muito perto do final do jogo por Roy Evens e Roger Hunt.

Dessa equipa sadina, Jacinto João era a grande estrela de uma equipa que tinha ainda Carlos Cardoso, Félix Guerreiro e José Maria. Estes três ídolos setubalenses fizeram também parte da equipa que voltou a surpreender a Europa três anos depois, na 3.ª eliminatória da então já designada Taça UEFA. Nessa época 1972-73, depois de ter afastado a Fiorentina, o V. Setúbal ainda treinado por Pedroto tinha a difícil missão de ultrapassar o Inter Milão, que tinha sido campeão europeu em 1964 e 1965.

A primeira mão, no Bonfim, foi épica, com o Vitória a vencer por 2-0, com golos do brasileiro Duda e de Graziano Bini, na própria baliza. Estrelas como Gabriele Oriali, Sandro Mazzola e Roberto Boninsegna deixavam Setúbal vergados a uma derrota embaraçosa, mas a acreditar que seria possível garantir o apuramento. Só que, com uma exibição muito consistente os sadinos festejaram o apuramento, pois perderam por apenas 1-0 - um penálti marcado por Boninsegna -, o que levou Pedroto a exultar com mais esse feito: "Jogámos em San Siro como se estivéssemos no Bonfim." O Vitória só caiu na eliminatória seguinte com o Tottenham, mas vencendo os ingleses em casa.

A equipa das camisolas esquisitas

Foi preciso esperar 19 anos para que um campeão da Europa voltasse a ser eliminado por uma equipa portuguesa da chamada segunda linha. E o cliente foi outra vez o Inter Milão, agora perante o Boavista. Estava no início a época de 1991-92 e a fava tinha calhado aos axadrezados no sorteio da primeira eliminatória da Taça UEFA, afinal os nerazzurri eram os detentores do troféu.

Os boavisteiros treinados por Manuel José , e com o jovem João Vieira Pinto no onze, surpreenderam os italianos e conseguiram uma vantagem de dois golos graças a Marlon Brandão e Pedro Barny. O Inter, com estrelas como os alemães Andreas Brehme e Lothar Matthäus, além de Walter Zenga, Bergomi e Dino Baggio, sairia do Bessa com uma desvantagem de 2-1, com o golo de Fontolan a dar esperança à equipa de Milão.

Em San Siro, mesmo com o Inter reforçado com o goleador Klinsmann, o Boavista resistiu a todos os ataques e arrancou um empate 0-0. Os italianos eram eliminados perante aquela que chamaram de "equipa das camisolas esquisitas".

A época gloriosa do Sp. Braga

A época de 2010-11 foi épica para o Sporting de Braga que eliminou três clubes campeões da Europa. A equipa então treinada por Domingos Paciência conseguiu entrar na fase de grupos da Liga dos Campeões, mas antes teve de afastar os escoceses do Celtic na 3.ª pré-eliminatória, com uma vitória por 3-0 no Minho e uma derrota por 2-1 em Glasgow.

Os bracarenses foram depois relegados para a Liga Europa, onde acabaram por chegar à final de Dublin, perdida para o FC Porto. Mas pelo caminho tiveram de afastar o Liverpool, nos oitavos-de-final. Uma proeza, ou não fosse o clube inglês um dos mais poderosos do continente, que na altura contava na sua equipa com Raúl Meireles e tinha estrelas como Carragher, Joe Cole ou Dirk Kuyt e era treinado por Kenny Dalglish, uma lenda de Anfield.

A eliminatória ficou resolvida graças a um penálti cobrado por Alan no jogo realizado em Braga, tendo-se registado em Liverpool um empate 0-0. Nas meias-finais, foi a vez de o Sp. Braga enfrentar um clube campeão europeu bem mais conhecido, no caso o Benfica, tendo perdido na Luz por 2-1 e vencido em casa por 1-0, graças a um golo de Custódio.

Menos sensacional foi a proeza do V. Guimarães na época passada afastou, no play-off da Liga Europa, os romenos do Steaua Bucareste, que venceram a Champions em 1986, mas que vivem tempos de menor fulgor, pelo que o apuramento dos vimaranenses acabou por ser natural, tendo o único golo da eliminatória sido obtido por Tapsoba, de penálti, no jogo realizado no Estádio D. Afonso Henriques.

Os "nossos" grandes também se abatem

Os três grandes clubes portugueses também já foram vítimas de surpresas que deixaram a Europa do futebol de boca aberta. E uma das mais escandalosas foi protagonizada pelo FC Porto, quando no dia 3 de outubro de 1984 foi eliminado na 1.ª eliminatória da Taça das Taças diante do desconhecido Wrexham, equipa galesa que militava na quarta divisão de Inglaterra.

A derrota 0-1 no País de Gales já tinha causado sensação, mas o pior foi quinze dias depois. O FC Porto esteve a ganhar 3-0 (dois de Fernando Gomes e um de Jaime Magalhães) e, como tal, com a eliminatória ganha aos 38 minutos, mas nos instantes finais da primeira parte dois erros do guarda-redes Petar Borota permitiram ao Wrexham reduzir para 3-2.

Um golo de Paulo Futre aos 61 minutos mantinha os dragões na frente da eliminatória, mas, nos instantes finais da partida, um contra-ataque de um tal de Barry Horne gelou o Estádio das Antas. O Wrexham deixava pelo caminho o finalista da edição anterior da Taça das Taças graças aos golos marcados fora de casa.

O Benfica também tem um pesadelo na sua história internacional e dá pelo nome de Halmstads. Uns suecos desconhecidos que em 2000-01 calharam em sorte na primeira eliminatória da Taça UEFA. A derrota dos encarnados na Suécia, por 2-1 (golo de Van Hooijdonk), abria ainda assim as portas do apuramento na Luz.

Antes da segunda mão, o alemão Jupp Heynckes deixou o comando técnico dos encarnados e foi rendido por José Mourinho, que no segundo jogo da sua carreira de treinador não foi além do empate 2-2 diante do modesto Halmstads. Van Hooijdonk abriu o marcador aos 23 minutos e o apuramento parecia uma formalidade, mas Gustavson (33') e Selakovic (88') deram a volta ao marcador, tendo Miguel ainda conseguido empatar nos instantes finais.

Finalmente o Sporting, que cinco anos depois também foi eliminado pelo mesmo Halmstads, teve o primeiro grande desastre quando, em 1999, foi surpreendido pelo Viking Stavanger, da Noruega.

A equipa então treinada por Augusto Inácio, que viria nessa época a romper com um jejum de 18 anos sem ser campeã nacional, tinha na baliza um tal de Peter Schmeichel e jogadores como Beto, Aldo Duscher, Pedro Barbosa ou Beto Acosta, garantiu uma curta vantagem de 1-0, em Alvalade, graças a um penálti de Ayew.

O pior foi na Noruega, onde os leões foram goleados por 3-0 e acabaram prematuramente a carreira na Taça UEFA.

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