Criar ofertas de trabalho nas grandes empresas em Portugal poderia assegurar melhores salários e evitar a fuga de talentos, estima a análise.
Criar ofertas de trabalho nas grandes empresas em Portugal poderia assegurar melhores salários e evitar a fuga de talentos, estima a análise.Rui Oliveira / Global Imagens

Sem regresso de jovens licenciados, convergência de Portugal com a UE só em 2060

Análise da Associação Business Roundtable estima que o valor acrescentado bruto em Portugal aumentaria 1,6 mil milhões de euros, caso os 194 mil jovens graduados que emigraram nos últimos dez anos regressassem ao país.
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Criar condições para que os jovens licenciados regressem ao país, a trabalhar em grandes empresas e a criar valor acrescentado bruto por trabalhador e, por outro lado, transferir o peso do emprego das pequenas empresas para organizações de grandes dimensões - são os dois fatores-chave, segundo os cálculos da Associação Business Roundtable, para que Portugal não fique (ainda) mais para trás no que se confere à convergência europeia.

Ao analisar as estatísticas europeias do Eurostat e perspetivas para a economia nacional, para 2024 e 2025, Pedro Brinca, professor e investigador na Nova School of Business & Economics, aponta que Portugal, quando comparado com países de escalão semelhante, está muito abaixo, em termos de performance de crescimento. E isto coloca uma questão: que tipo de mercado de trabalho é que os jovens, hoje adolescentes, vão encontrar?

Para o investigador, com este desempenho económico, o que se prevê é que Portugal consiga convergir com a Zona Euro em 2056 e com a União Europeia em 2060. Números apresentados na Conferência BRP 2024 | Portugal: o país onde vais querer estar.

Pedro Brinca considera que a Polónia, por exemplo, que tem o mesmo nível rendimento em termos de paridade de poder de compra que Portugal (79% da média comunitária), a manter-se o desempenho económico previsto para os próximos dois anos, irá atingir a convergência com a União Europeia e com a Zona Euro em 2039.

As causas? Um dos fatores caracterizadores, pela negativa, da economia portuguesa, face à UE, é a predominância de emprego em microempresas, “que pagam baixos salários e sem ambição de crescimento”. A isto há que acrescentar “muito pouco emprego, apenas 22%, nas grandes empresas”. Sendo que esses 22% geram quase 40% daquilo que é o valor acrescentado bruto do país.

O professor salientou ainda que o valor acrescentado bruto por empregado, nas grandes empresas, é de 83 mil euros por ano e, nas microempresas, é de apenas 22 mil euros. “Num cenário destes, a emigração acaba por ser a única solução para muitas pessoas”, refere Pedro Brinca.

Mas o que aconteceria à economia se, através das políticas definidas, o país conseguisse trazer, por ano, o mesmo número de emigrantes licenciados que saíram nos últimos dez anos - 194 mil, entre 2012 e 2021? Claro, acrescenta o investigador, proporcionando um ambiente económico favorável de criação de emprego nas grandes empresas que os pudessem absorver.

Partindo do princípio de que o país cria as condições para que os licenciados regressem, os cálculos da Business Roundtable indicam que o valor acrescentado bruto em Portugal aumentaria 1,6 mil milhões de euros. “Isto traria, todos os anos, um aumento da taxa de crescimento do PIB de 0,65 pontos percentuais e 0,42 pontos percentuais em crescimento per capita”.

Além disso, “atingiríamos a convergência, com este ritmo adicional, em 2046”, aponta Pedro Brinca, que acrescenta que “pouparíamos dez a 15 anos”.

Criar condições para atrair (e reter) licenciados, a um ritmo de 19 mil por ano, a trabalhar em grandes empresas e assumindo que a economia tinha capacidade de continuar a ter o mesmo valor acrescentado bruto por trabalhar - 83 mil euros ano -, poria Portugal muito perto da trajetória de convergência média daquilo que são os países da União Europeia.

Esta é a opinião de Pedro Brinca que coloca outro cenário: e se ambicionássemos ter a mesma distribuição de empresas por tamanho que a média da UE? Na prática, passar o peso do emprego das microempresas de 44 para 30% e o peso do emprego nas grandes empresas de 21,5 para 36,4%.

Os cálculos indicam que, mantendo os valores acrescentados brutos, “teríamos um aumento do PIB de 16,4%”, ou seja, “passaríamos de PIB per capita de 25,4 para 29,3 mil euros por ano e atingiríamos 92% da média comunitária”. Em termos comparativos, “ultrapassaríamos a Espanha e estaríamos perto da Itália”.

Pedro Brinca apresentou ainda um terceiro cenário, em que os dois desafios estão alinhados. Nesse caso, Portugal atingiria a convergência em 2033.

A isto há a acrescentar os dados do estudo da Associação Business Roundtable que aponta conclusões preocupantes.

Por um lado, nos últimos 20 anos, houve aquilo a que se chama de “fuga de talentos” de Portugal. E o número é demonstrativo: 1,5 milhões de portugueses decidiram tentar a sua sorte noutro país. O estudo aponta mesmo que Portugal, com 26% da população a viver no estrangeiro, é o 8.º país do mundo com mais emigrantes. Tão ou mais preocupante é o facto de um terço desse número ser constituído por jovens com idades compreendidas entre os 15 e os 39 anos.

A agravar a situação está o facto de o estudo referir que cinco em cada dez jovens com idades compreendidas entre os 14 e os 29 anos demonstram, já, intenções de emigrar.

Por outro lado, apenas uma pequena percentagem dos que emigraram se disponibilizam a regressar. Dos 875 mil portugueses que saíram do país, entre 2011 e 2021, apenas 132 mil regressaram. Os números não mentem: 61% dos emigrantes não tencionam regressar a Portugal.
 

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