A lei determina que todos os contratos de arrendamento têm de ser registados no Fisco, e as rendas comunicadas. Acresce que, no caso dos imóveis com rendas congeladas - os quais, por via do Programa Mais Habitação e do Orçamento de Estado de 2024, beneficiam de isenção total de IMI -, o Fisco teve de anteriormente, através da emissão de um certificado de Rendimento Anual Bruto Corrigido, certificar a “insuficiência económica” dos inquilinos. É muita informação concentrada na Autoridade Tributária (AT) - mas que, de acordo com o ministério das Finanças, não lhe permite dispor de “informação relativa a quais os prédios com contratos de arrendamento abrangidos pela isenção em causa”.Foi esta a justificação que esta segunda-feira foi dada à agência Lusa pela tutela da AT para o facto, noticiado pelo DN, de esta estar a cobrar indevidamente IMI, relativo ao ano de 2024, a imóveis com rendas congeladas (ou seja, com contratos de arrendamento habitacional anteriores a 1990): o Fisco não sabe em pode saber, pelo que “não foi possível a consideração dessas isenções na liquidação do IMI relativo ao ano de 2024”.Esta resposta do Governo, que não quisera antes reagir às questões sobre o assunto que o jornal enviou, na quinta-feira 8 de maio, para o gabinete do ministro das Finanças, Miranda Sarmento, é recebida pela Associação Lisbonense de Proprietários (ALP), que apresentou já queixa desta cobrança indevida à Provedora de Justiça, com “profundo choque”.“É claro que a AT tem toda a forma de saber quais são as frações que têm direito essa isenção - aliás o governo anterior fez um estudo com esses dados [trata-se de um estudo do Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana publicado em novembro de 2023], porque tudo está comunicado no que respeita aos contratos anteriores a 1990. As respostas dadas pelo ministério são uma desculpa sem sentido e chocam, chocam profundamente”, diz ao DN Diana Ralha, da direção da ALP.Sendo detentora, por herança, de imóveis com rendas congeladas, esta senhoria explica que a AT nem se preocupou em criar, no respetivo portal, na zona em que se pode pedir isenção de IMI, um campo para os contratos habitacionais anteriores a 1990. “Quando vamos pedir uma isenção no portal das Finanças há várias hipóteses: para os partidos políticos, comunidades religiosas, na compra de habitação própria permanente, etc. Tem lá um sítio para fazer uma cruzinha nesses casos. Mas não para a isenção decretada para os contratos anteriores a 1990 pelo OE2024. Para os outros casos há um processo automático; nós o que temos de fazer para requerer essa isenção é imprimir um papelinho, depois digitalizar o papelinho e submeter por via digital. Pelo que aquilo que o ministério diz é uma desculpa - a AT não quis criar um processo automático para as pessoas que têm estes contratos, e que foram espoliadas durante décadas.”.“As respostas dadas pelo ministério das Finanças são uma desculpa sem sentido e chocam profundamente.” (Associação Lisbonense de Proprietários)..Na sua resposta à Lusa, o ministério de Miranda Sarmento refere o “papelinho” mencionado por Diana Ralha, afirmando que em julho de 2024 a AT disponibilizou um formulário no portal das Finanças para passar a dispor da tal informação sobre os contratos de que, segundo a tutela, não dispunha. Ora na verdade esse formulário foi criado pela AT (e com atraso) por um motivo muito diferente: porque a lei determina que os senhorios que têm rendas congeladas e pretendem aceder à compensação criada pelo governo anterior para os “indemnizar” por esse facto têm de entregar ao Instituto da Habitação e Reabilitação Urbana (IHRU) o comprovativo do pedido de isenção de IMI apresentado à AT. E esse comprovativo é um dos documentos exigidos pela lei para a tramitação do processo porque, precisamente, só a AT tem forma de saber se os senhorios em causa estão em condições de aceder à compensação. Nomeadamente se os seus inquilinos apresentaram certificação de insuficiência económica (ou seja, se, nos termos da lei em vigor, têm um rendimento mensal bruto corrigido inferior a cinco ordenados mínimos). De tal modo assim é que a recusa da dita isenção pela AT determina a perda da compensação - como se lê na lei: “Caso o pedido de isenção do IMI (…) venha a ser posteriormente indeferido, o senhorio comunica esse facto ao IHRU no prazo de 30 dias para efeitos de restituição da compensação recebida.” Fisco alega "falta de instruções superiores" ou remete para IHRUCerto é que, quase um ano volvido sobre o início (a 1 de julho de 2024) do processo de compensação por rendas congeladas, e quando os proprietários em causa são obrigados, porque a lei assim o determina, a renovar o requerimento da mesma, a AT não respondeu a um único dos pedidos de isenção que lhe foram endereçados e, como se constata, está a cobrar IMI como se a isenção não fosse devida.Mais: as respostas que a AT está, como o DN noticiou esta segunda-feira, a dar aos senhorios que a interpelam sobre a ausência de atribuição da isenção contrariam frontalmente todas as explicações do ministério das Finanças. Segundo várias dessas respostas, o que falta para “resolver o assunto” são “instruções superiores” ou “dos serviços centrais”. Há também, naquilo a que se costuma dar o nome de “pescadinha de rabo na boca”, remissão para o IHRU: “O reconhecimento do benefício é da responsabilidade do IHRU, entidade a quem se deve dirigir para obtenção de informação”.Ignorando estas evidências de total desnorte das repartições, o ministério das Finanças garantiu esta segunda-feira à Lusa que “irá rever, até ao fim do mês de junho (quando termina o prazo para o pagamento do IMI este ano) todas as liquidações que incluam prédios relativamente aos quais tenha sido requerida esta isenção e a mesma deva aplicar-se”. Por sua vez, o ministro Miranda Sarmento admitiu à RTP, ao início da tarde de segunda-feira, que a AT “pode ter falhado”, e que está a apurar se assim foi, certificando que “quem tem direito à isenção de IMI naturalmente não pagará IMI e a situação administrativa será reposta se existir alguma inconformidade”. Depreende-se assim que mesmo perante a evidência de que o Fisco não respondeu, desde julho de 2024, a um único dos milhares de pedidos de isenção que ali deram entrada -- tantos quantos os pedidos de compensação entrados no IHRU, que segundo o governo eram, no início de fevereiro de 2025, perto de cinco mil -- , o titular das Finanças põe ainda a hipótese de não existir qualquer desconformidade na respetiva atuação. .Rendas Congeladas: Fisco está a cobrar IMI a imóveis isentos.Fisco vai rever todas as liquidações de IMI em que haja pedido de isenção