A confirmação de 16 casos de peste suína africana (PSA) em javalis na província espanhola de Barcelona colocou o setor suinícola português em alerta máximo. O risco continua controlado e Portugal mantém-se livre da doença – que não é detetada em território nacional desde o final do século passado -, mas a proximidade do foco acendeu sinais de alarme num setor cuja fileira vale cerca de 2,5 mil milhões de euros por ano, dos quais 816 milhões correspondem à produção.Por isso, a Federação Portuguesa de Associações de Suinicultores (FPAS) sublinha que já está ativado o reforço imediato das medidas de vigilância e prevenção. “O nível de preocupação hoje é mais alto porque o vírus está mais perto”, admite ao DN João Bastos, secretário-geral da FPAS. Ainda assim, sublinha que “a ameaça é elevada, mas não é alarmante”, apontando como sinal positivo o facto de o surto espanhol parecer, para já, confinado à área inicialmente delimitada.A peste suína africana é uma doença viral que afeta apenas porcos domésticos e javalis, não representando qualquer risco para os humanos nem para o consumo de carne. O problema é, sobretudo, económico. “O que acontece nos países que declaram focos é que ficam automaticamente fechados para a exportação para países terceiros”, recorda João Bastos.Ora, Portugal exporta hoje cerca de 20% da produção suinícola e tem vindo a ganhar espaço nos mercados asiáticos. “Seria um forte revés na estratégia que temos vindo a desenvolver”, admite o secretário-geral da FPAS, acrescentando que a situação em Espanha, um dos maiores produtores mundiais, também pode influenciar o mercado português, porque “em caso de dificuldades em escoar a produção para outros mercados externos, acabam por ser os mercados mais próximos a absorver esse excesso de produção disponível”.Plano nacional ativo desde 2018Portugal não parte do zero. O país acompanha a evolução da peste suína africana na Europa desde 2018, altura em que foi criado um Plano Nacional de Ação para a Prevenção da PSA, coordenado pela Direção-Geral de Alimentação e Veterinária (DGAV). “Desde que esta situação existe na Europa, solicitámos a constituição de uma comissão de acompanhamento, onde estão todas as entidades relevantes do setor”, explica João Bastos, lembrando que a doença já começou a espalhar-se pelo leste europeu a partir de meados da década passada.O plano nacional assenta essencialmente em dois eixos: “a vigilância ativa e a contingência”, resume. Para já, estamos em fase de vigilância e “a principal preocupação são os javalis, considerados o maior vetor de transmissão do vírus”, o que justifica o envolvimento do ICNF e das federações da caça no controlo das populações. Além da fauna selvagem, o reforço da biossegurança nas explorações é outra das prioridades. “Há uma atenção muito grande à lavagem e desinfeção dos veículos, porque recebemos muitos animais, particularmente de Espanha”, refere João Bastos, destacando ainda os cuidados adicionais exigidos pelo regime extensivo, especialmente vulnerável ao contacto com javalis.Com a confirmação dos focos na Catalunha, a comissão de acompanhamento do plano reuniu de imediato “para abordar o reforço dos controlos, sobretudo nos veículos que entram de Espanha para Portugal”, relata o dirigente. Outra preocupação destacada prende-se com a entrada de produtos cárneos por viajantes, identificada noutros países como via provável de disseminação do vírus.João Bastos sublinha, no entanto, a robustez dos sistemas de controlo existentes em Portugal. “Temos um sistema informativo da sanidade dos suínos que é dos mais avançados do mundo. Todas as movimentações estão registadas e é isso que nos dá alguma segurança”, afirma, referindo também a aplicação ANIMAS, que permite sinalizar javalis mortos para análise laboratorial.No plano da contingência, estão previstas medidas rigorosas caso a doença entre no país. “Se tivermos de ativar o plano, haverá zonas de restrição, abate sanitário nas explorações afetadas e uma mobilização de várias entidades no terreno”, explica o secretário-geral da FPAS.Medidas a reforçarEm comunicado divulgado na sexta-feira, a federação elencou um conjunto de ações que considera prioritárias nesta fase, entre os quais controlos oficiais reforçados às movimentações de animais com origem em Espanha; sorologias sistemáticas aos suínos que entram no país; controlo rigoroso de javalis e o escrutínio dos centros de limpeza e desinfeção.No plano da contingência, a FPAS pede ainda clareza sobre as áreas geográficas a restringir, os dispositivos a acionar e os critérios de indemnização em caso de abate sanitário. “É essencial saber como se responde no terreno se o pior acontecer”, defendeu João Bastos.Apesar do aumento do nível de alerta, o secretário-geral da FPAS destaca como positivo, no caso espanhol, o facto de a “estirpe detetada ser altamente letal para os javalis, o que limita a sua deslocação e facilita a contenção”. Além disso, as autoridades sanitárias da Catalunha anunciaram a intenção de abater mais de 60 mil javalis, metade do total da população estimada na região. Mas “não se pode facilitar”, pelo que João Bastos apela à responsabilidade coletiva. “Todos têm de fazer a sua parte, começando por cada exploração”, conclui, apontando a biossegurança como a primeira linha de defesa do setor.O DN tentou obter reações do Ministério da Agricultura sobre o eventual reforço de medidas, mas não obteve resposta em tempo útil. Para já, segundo posições públicas assumidas pela DGAV, Portugal não vê qualquer necessidade de aplicar restrições à importação de carne espanhola.