Os pesos dos salários públicos e da despesa pública total em Portugal medidos em proporção do Produto Interno Bruto (PIB) são dos que mais caem na Europa desde 2015, o primeiro ano completo depois do ajustamento da troika e em que a crise da Zona Euro se dissipou finalmente, ou desde as vésperas da grande crise financeira global que começou a sério em 2008 com a falência de bancos por todo o mundo. A mesma crise que depois migrou para as contas públicas quando os governos foram chamados a apoiar os bancos. E idem, desde o fim da pandemia.De acordo com cálculos do DN/DV a partir dos novos dados da Comissão Europeia (CE) publicados na colheita das previsões de outono, na passada segunda-feira, vários são os países da Europa que nunca regressaram aos níveis de despesa pública (despesa corrente total e gastos com pessoal/salários, a rubrica com maior peso no total) verificados antes de 2008.Portugal regista, entre 2008 e 2026 (nova previsão de Bruxelas), a quarta maior redução do rácio da despesa corrente face ao PIB da zona euro, isto apesar de ser um dos países que ainda carrega um dos maiores fardos de despesa com juros da dívida.A partir dos dados da CE, Portugal tem hoje uma despesa que está estruturalmente cerca de dois pontos percentuais ou mais abaixo do nível que vigorava antes da grande crise financeira. Em 2026, a Comissão prevê que Portugal registe um rácio de despesa corrente de 39,8% do PIB, o sexto mais baixo da área do euro e bastante inferior à média da região da moeda única que está em 45%. O ajustamento é estrutural porque durante muitos anos, mesmo depois da bancarrota, o nível de despesa costumava andar nos 43% ou 44%. A média histórica de 1995 a 2015 é 42%.Desde 2008, os maiores ajustamentos aconteceram, sem surpresa, nos países que mais se debateram com a crise bancária e com a migração desta para as contas públicas. Irlanda, Malta, Grécia e Portugal foram, por esta ordem, os países que mais ajustaram.Os salários públicos são, como se sabe, a principal rubrica da despesa e, dizem vários economistas, também a mais rígida. Mas aqui, a História recente de Portugal e da Europa mostra que a folha salarial pública (em proporção do PIB, uma vez mais) tem vindo a cair de forma paulatina e significativa.A despesa salarial vale quase 30% do total, sendo que os dados de Bruxelas mostram que esta rubrica tem sido decisiva para ao ajustamento estrutural das contas públicas, que hoje entregam excedentes, os tais que permitem ir pagando aos credores (bancos, sobretudo) para reduzir o peso da dívida (o grande objetivo do Pacto de Estabilidade europeu).Desde o início da grande crise global em 2008 até 2026 (previsão), a CE sinaliza que Portugal vai ter a terceira maior quebra no peso dos salários públicos de toda a Europa, um desbaste equivalente a 2,3 pontos percentuais do PIB. Desde que acabou a pandemia, a dinâmica é em tudo semelhante.Assim, Portugal tem hoje um peso da despesa com salários que, ligeiramente acima da média europeia (10,8%), já está quase em linha com os valores de referência da Zona Euro (10%).Se depender deste governo, este esforço vai ter de continuar para reduzir a dívida.O Ministério das Finanças, hoje liderado por Joaquim Miranda Sarmento, assim como os seus antecessores, tem avançado com medidas que levam ao aumento nominal dos salários público e a valorizações setoriais acima da norma (caso dos professores), numa tentativa de recuperar mais de uma década de congelamento de progressões e carreiras.Segundo a Unidade Técnica de Apoio Orçamental (UTAO), que assessora o Parlamento nestes temas, "a atualização salarial dos funcionários das Administrações Públicas comporta cerca de um terço do aumento total previsto para a rubrica de despesas com pessoal em 2026", mas "este modelo de atualização, por si só, continua a contribuir para a compressão salarial dentro das carreiras de trabalhadores das Administrações Públicas".No entanto, Miranda Sarmento já fez saber que é preciso travar mais e no Orçamento do Estado para 2026 (OE 2026) prevê interromper a subida sucessiva anual, desde 2014, no número de empregados públicos.A UTAO confirma que as Finanças, apesar de quererem parar o aumento do universo de funcionários já este ano, adiaram o objetivo para o próximo."No relatório da proposta de OE 2026, o Governo indicia que não atingirá o objetivo de congelamento do número de trabalhadores da Administração Pública em 2025, ao prever que, em 2026, o objetivo passe a ser o de manter o número de funcionários públicos apurado em junho de 2025 (cerca 760,7 mil), ou seja, um crescimento homólogo de 1,5% (mais 11.030 funcionários) e de 1% (mais 7.171 funcionários) face a dezembro 2024".Segundo os economistas da UTAO, "este objetivo — que pretende quebrar a tendência de crescimento sucessivo verificada desde 2014 — implica a aplicação da regra de uma entrada por cada saída, a qual, por si só, tem impacto na redução da massa salarial das AP" pelo que "o aumento previsto das despesas com pessoal em 2026 resultará do acréscimo da remuneração média (incluindo o impacto mitigador do efeito de substituição)"..Sarmento "bastante confiante" em excedente de pelo menos 0,3% do PIB este ano