O preço do petróleo nos mercados internacionais é uma das variáveis cruciais e de base em que assenta o Orçamento do Estado (OE) e que ainda determina muito a dinâmica da economia portuguesa e da inflação.No entanto, apesar da escalada do conflito no Médio Oriente desde que Israel atacou o Irão, no passado dia 12 de junho, ainda não coloca em xeque as premissas do OE, de acordo com cálculos do DN.A margem de segurança face a um impacto direto de um novo choque nos preços do crude e também do gás é ainda significativa.Ao dia de ontem, 23 de junho, já depois dos ataques dos EUA ao Irão no sábado e das retaliações do regime de Teerão, o preço médio do barril de petróleo (desde o início deste ano) rondava os 72,4 dólares, cerca de 66,5 euros.Ambas as medidas encontram-se visivelmente abaixo da média anual assumida pelo governo de Luís Montenegro e do seu ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento, no OE 2025: 75,5 dólares e 68,6 euros, menos 4% e 3%, respetivamente.Para já, se a guerra no Médio Oriente não descambar ainda mais e não provocar um choque petrolífero a sério, isto dá margem para acomodar eventuais flutuações e volatilidades.Em todo o caso, há limites.Para já, o OE tem margem para acolher, pelo menos em parte, algum choque petrolífero que venha a acontecer e volte a atirar os preços do barril para níveis bem superiores a 100 dólares, como aconteceu em 2008 (crise financeira global), entre 2011 e 2014 (crise da Zona Euro e das dívidas) e em 2022 (com o ataque da Rússia à Ucrânia).Mas, se a subida continuar, haverá um ponto em que esses preços começam a ser incomportáveis, a corroer a atividade da economia (poder de compra dos consumidores e margens das empresas) e a desestabilizar as contas públicas porque os choques petrolíferos tendem a provocar recessões graves, como nos mostra a História económica desde os anos 70 do século passado.No caso de Portugal, apesar dos progressos nas energias renováveis e em alguns aspetos da eficiência energética, a exposição face ao petróleo e a outros produtos fósseis importados não é de somenos.De acordo com as estatísticas oficiais, anualmente (2024), Portugal até exportou cerca de 5,5 mil milhões de euros em mercadorias energéticas (como produtos refinados), mas sempre na dependência do crude e do gás que não produz e tem de comprar lá fora: a fatura anual em importações rondou os 11,6 mil milhões de euros.Ou seja: o défice e a exposição líquida ao exterior nestes produtos ascende a mais de 6 mil milhões de euros por ano. É muito, ainda.Esta segunda-feira foi o primeiro dia de negociação real e a sério nos mercados internacionais.Depois de um primeiro solavanco em alta no fim de semana (nas negociações eletrónicas), eis que o petróleo surpreendeu: começou a cair. E caiu tanto que na hora do fecho desta edição estava a afundar mais de 6%, mesmo depois de o Irão atacar com mísseis bases militares dos EUA no vizinho Catar e, supostamente, no Iraque.O barril de Brent, a referência para os países europeus, estava nos 69,8 dólares, praticamente em linha com os 69,4 dólares da cotação do dia 12 de junho (antes do ataque de Israel) e já bastante abaixo dos 77 dólares de domingo (depois de se conhecer o ataque dos EUA às instalações nucleares iranianas de Fordow).Como é possível o crude não ter disparado esta segunda-feira?Os analistas argumentam que os mercados não estão a contabilizar o prémio de risco maior, que seria o encerramento do Estreito de Ormuz, no Golfo Pérsico, por onde passa 20% do comércio de petróleo e de gás natural a nível mundial.Também dizem que a China está a ser o grande efeito dissuasor, já que é um dos grandes parceiros económicos da potente república islâmica. É um grande comprador de petróleo, mas também um fornecedor de proa de material militar, por exemplo. Pequim não terá o mínimo interesse numa escalada disjuntiva.Acresce o facto de o Irão querer continua a retaliar contra os seus inimigos maiores (EUA e Israel). Fechar Ormuz seria o fim de tudo, a bomba definitiva, mas também do sustento (receitas) mais seguro do Irão, um dos maiores produtores mundiais de petróleo.Além disso, os níveis de reservas estratégicas da maioria dos países estão elevadas – foram reconstruídas desde o início da guerra da Ucrânia."Claro que o bombardeamento das instalações nucleares iranianas pelos EUA no fim de semana aumentou significativamente os riscos de abastecimento para o mercado de petróleo e LNG [gás natural liquifeito]", começa por dizer Warren Patterson, analista-chefe de matérias primas no gigante financeiro holandês ING.Para este economista, que está a ver o filme em Singapura, onde está baseado, "a grande questão agora é como o Irão irá responder".Sendo verdade que "o grande risco para o mercado petrolífero é o Irão tentar agora interromper os fluxos de transporte marítimo através do Estreito de Ormuz", "um ponto crucial para os fluxos globais de petróleo e LNG, com um quarto do comércio marítimo de petróleo a passar pelo estreito e de 20% no caso do gás", "temos de considerar que, "no caso do petróleo, há margem para que alguns fluxos sejam desviados".Segundo o mesmo perito do ING, "a Arábia Saudita tem o oleoduto Leste-Oeste, com capacidade para 5 milhões de barris por dia, que permite que o petróleo seja transportado a partir do Mar Vermelho", "os Emirados Árabes Unidos têm um oleoduto de 1,8 milhões de barris por dia para o Golfo de Omã, que evita o Estreito de Ormuz" e "o Irão tem um oleoduto que vai até ao Golfo de Omã com uma capacidade de cerca de 300 mil barris por dia". Resumindo: "embora o Irão possa sentir que precisa retaliar os ataques dos EUA, bloquear Ormuz pode ser um passo demasiado radical"."Dado o impacto potencial dessa ação nos fluxos e preços do petróleo, é provável que haja uma resposta rápida dos EUA e de outros países. Além disso, com mais de 80% do fluxo de petróleo que passa por Ormuz a chegar à Ásia, o impacto na região seria maior do que nos EUA. Portanto, o Irão precisa de ter cuidado para não perturbar países como a China, interrompendo o fluxo de petróleo", repara o analista.Além disso, "o petróleo iraniano também passa por Ormuz" pelo que "bloquear o estreito também teria um impacto" negativo no próprio Irão."Acreditamos que um bloqueio bem-sucedido do Estreito de Ormuz é improvável, mas, claro, os riscos geopolíticos aumentaram significativamente", remata Warren Patterson.O fator China e mais um comentário de TrumpComo referido, o Irão quer continuar a retaliar e para isso precisa de fazê-lo gradualmente. Já o Presidente dos EUA, Donald Trump, disse esta segunda-feira que o caminho não pode ser o da escalada dos preços. "Toda a gente" quer os preços baixos ou contidos e que se acontecer o contrário isso é "jogar a favor do inimigo", o Irão.O fator China é talvez o maior travão face ao cenário de desastre.O The Wall Street Journal noticiou há duas semanas que "o Irão encomendou à China grandes quantidades de material para a produção de mísseis balísticos".Na reportagem, o jornal revela que o governo iraniano "encomendou perclorato de amónio suficiente para fabricar até 800 mísseis". A valiosa e abundante carga está prevista chegar "nos próximos meses"..Irão retalia com ataque “simbólico” a base militar dos EUA e Trump diz que é tempo para a paz.Portugal com excedente orçamental de 0,2% no primeiro trimestre. "Reforça confiança na execução orçamental"