Nazaré Costa Cabral, presidente do Conselho das Finanças Públicas (à esquerda).
Nazaré Costa Cabral, presidente do Conselho das Finanças Públicas (à esquerda).Gerardo Santos

NATO agrava défice português e dívida em 4,7 mil milhões de euros nos próximos quatro anos

Em 2024, Portugal gastou 1,5% do PIB na defesa, mas meta dos aliados exige 2% em 2029. Governo promete antecipar objetivo. Impacto "afeta sustentabilidade” da dívida, diz o CFP.
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O esforço que Portugal (os contribuintes) terá de fazer para atingir a nova meta da Organização do Tratado do Atlântico Norte (NATO), para os gastos militares, para subir a sua despesa anual dos atuais 1,5% do Produto Interno Bruto (PIB) para 2%, deverá ter custo muito significativo para os portugueses e traduzir-se num agravamento bastante cavado do défice público e da dívida.

De acordo com cálculos do DN/Dinheiro Vivo a partir de novos dados do Conselho das Finanças Públicas (CFP) que constam do estudo divulgado esta quinta-feira, estamos a falar numa carga de mais 4,7 mil milhões de euros sobre os contribuintes no saldo orçamental (défice) e de mais 4,7 mil milhões de euros na dívida que irá ser acumulada no período de 2026 a 2029.

A meta da NATO de 2% do PIB para a Defesa implica Portugal gastar 6 mil milhões de euros, anualmente. Em 2029, este valor, calculado em função do Produto Interno Bruto (PIB) nominal, já com a inflação projetada, deve equivaler a 7 mil milhões.

A pressão para cumprir a meta de 2% da NATO deve gerar um prejuízo acumulado para o saldo orçamental (alimentando assim o défice que se prevê reaparecer a partir de 2026, inclusive) na ordem dos 1,4% do PIB nos próximos quatro anos (2026 a 2029).

Admitindo os valores do CFP para o PIB nominal em cada um desses anos, significa que o custo adicional acumulado imposto pela NATO - agora por causa das guerras em curso e dos riscos de agressão cada vez maiores, mas também por causa da pressão elevada que tem vindo do maior membro da aliança, os EUA, para que os europeus gastem mais em armas e tropas - vai ultrapassar os 4,7 mil milhões de euros no período de quatro anos considerado (até 2029 inclusive).

Na dívida, a mesma coisa. O rácio vai subir todos os anos e cada vez mais até 2029 por conta do reforço exigido para se chegar aos 2% da NATO.

Isto traduz-se numa subida do peso da dívida, daqui a quatro anos, no final de 2029, de 85,4% do PIB (em políticas invariantes, sem haver reforço adicional com a área militar) para 86,8% (com reforço).

Segundo o CFP, este diferencial traduz-se em mais 4,7 mil milhões de euros na dívida pública que estará por pagar no final de 2029.

É a fatura que fica para as gerações futuras pagarem aos credores internacionais por conta dos planos militares atuais e outros que devem arrancar a breve trecho no contexto do rearmamento da Europa e da NATO.

Défice regressa

O excedente orçamental público deverá desaparecer de vez este ano, mas as contas públicas portuguesas deverão, ainda assim, manter-se em equilíbrio, isto é, o saldo final ficam em 0% do PIB, prevê o CFP.

Depois o défice regressa e um dos novos fatores de pressão negativa sobre o saldo público será a despesa militar, que agravará o défice e a dívida de forma significativa e permanente, como referido.

Ainda sem computar os efeitos das políticas destrutivas de Donald Trump nas tarifas (e num cenário de políticas invariantes, isto é, sem novas medidas além das que hoje vigoram), o CFP acrescenta que Portugal regressará aos défices públicos já em 2026 e que as contas públicas permanecerão deficitárias daí em diante.

No novo estudo Perspetivas Económicas e Orçamentais 2025-2029, a entidade que avalia a qualidade das finanças portuguesas, presidida por Nazaré da Costa Cabral, revê ainda o crescimento deste ano em baixa ligeira. Portugal vai crescer menos este ano do que o esperado há seis meses, 2,2% em vez de 2,4%.

Mais Defesa, mais despesa

“Para 2025 projeta-se um saldo orçamental equilibrado (0% do PIB), embora a projeção seja sensível a alguns fatores como o grau de execução do investimento público, dos empréstimos do Plano de Recuperação e Resiliência (PRR) e evolução dos impostos diretos, em particular do IRS, e da utilização de mecanismos de contenção orçamental, pelo que não se pode excluir a possibilidade de um ligeiro excedente orçamental”, mas a partir de 2026 “aponta-se para o regresso a uma situação de défices orçamentais”, refere.

O CFP decidiu estimar o impacto no saldo orçamental e na dívida pública (em contas nacionais, o que é relevante para o Pacto de Estabilidade) que decorre da “concretização da meta de gasto de 2% do PIB em despesas em Defesa”, isto é, do adicional de gastos que terá de ser cumprido todos os anos.

No final do ano passado, o rácio português estava nos 1,5%, mas com a ascensão de Donald Trump ao poder nos EUA e a pressão crescente que tem feito sobre os aliados da NATO (para estes gastarem muito mais), até aquela meta de 2% está cada vez mais a prazo e vai, muito provavelmente, ter de subir para um rácio de gastos militares na ordem dos 3% do PIB ou mais ao ano, por país.

“Portugal é dos países da UE que apresenta gastos relativos em defesa mais baixos. No ano de 2024, estes corresponderam a 1,5% do PIB, um montante insuficiente face aos compromissos assumidos no âmbito na NATO em 2014”, repara o CFP, que no entanto alerta para “o impacto que esta despesa [reforço] terá na evolução do saldo orçamental e da dívida pública, afetando a sua sustentabilidade”.

* Artigo corrigido às 16h30. Daqui a quatro anos, em 2029, o valor nominal do acréscimo da dívida pública (em euros), na sequência do maior esforço com Defesa, é 4,7 mil milhões de euros e não 8,5 mil milhões de euros, como referido inicialmente.

Conselho das Finanças Públicas

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