Está a fazer dois anos que o Grupo CEGOC comprou a Neves de Almeida. Está correr bem a integração?É um bom balanço, olhando para aquilo que eram os objetivos e as sinergias que se vaticinavam numa aquisição destas, só faz sentido se houver sinergias, nomeadamente para quem está a adquirir. Mas preferencialmente também para quem é adquirido e, portanto, esta perspetiva. Olhando para trás, eu continuo a estar não só muito contente com a operação, como muito otimista relativamente àquilo que é o espaço de crescimento que esta operação nos dá. Ainda que, de facto, neste processo de aquisição haja sempre coisas que se vão descobrindo pelo caminho. Depois de assinar há sempre coisas que se comprovam como sendo, nuns casos, valor que estava escondido e, noutros casos, se calhar, o valor previsto não foi totalmente adquirido.Esse espaço de crescimento diz mais sobre as duas empresas ou diz mais sobre o mercado?Diz sobre as duas empresas, mas num mercado que está em polvorosa, está em crescimento, em alteração.Por razões diferentes de há dois anos, certo? Sem dúvida. Na perspetiva de um mundo que há dois anos perspetivava o impacto da Inteligência Artificial, aquilo que eram os impactos mais macroeconómicos, podíamos já antecipar a escassez de talento em Portugal. Mas como é que isto ia evoluir? Hoje percebemos que uma série de temas se agudizaram. A escassez de talento continua a ser um tema que, em Portugal, é extremamente desafiante para quem tem de gerir empresas.É preocupante? É desafiante, porque estamos num dos países que tem, neste momento, uma maior perceção – pelo menos a avaliar pelos estudos, nossos e de outros – de que a evolução do talento nacional e a aquisição das novas competências necessárias não está a ser feito a um ritmo suficientemente acelerado para responder às necessidades do mercado. Naturalmente que, em momentos de expansão, há necessidade de contratar pessoas e de fazer upscaling das pessoas muito rapidamente. Eu diria que o ano passado sentimos que, por exemplo, o negócio do recrutamento reflete algum abrandamento – não só portuguesa, mas também a nível global, fruto do contexto global em que todos vivemos. E todos os dias apanhamos notícias um bocadinho assustadoras, aqui ou ali. .“O que a Neves de Almeida tinha na formação juntou à CEGOC e temos uma equipa supermusculada que equivale a 70% do nosso negócio em 2024. Portanto, esta equipa já era forte e ficou superaditivada.”Ricardo Martins, CEO da CEGOC.As empresas puseram planos e decisões em pausa até perceberem para que lado é que as coisas iam.Sim, seriamente. As empresas tinham planos de expansão e mesmo nos temas do mundo do IT já não se sente aquela voracidade de mandar vir alguém, “desde que tenha duas pernas e dois braços, que nós metemo-las em frente ao computador e damos formação”. Não é tanto isso que está em causa. Já começa a haver algum arrefecimento a esse nível. E como é que isso afeta o negócio?Nós fazemos vários estudos sobre estas dinâmicas. Um deles, que sai nas próximas semanas, é precisamente sobre: “O que vai mudar na gestão das pessoas em 2025?” E já aponta exatamente neste sentido. Também fizemos um estudo sobre a satisfação das pessoas nas empresas, e que nos dá também uma série de perspetivas do que é que está a crescer, e como é que as pessoas e as empresas estão a responder a isso.Que indicações é que a CEGOC recolheu desses trabalhos?Para começar, que as empresas olham para o talento que temos em Portugal e percebem duas coisas: a primeira é que os recursos que estamos a receber em termos de imigração precisam de ser vistos com alguma reserva. Porque não é necessariamente um talento ultraqualificado. Portanto, em alguns setores da economia mais tradicionais, apenas vai dando para as despesas.Qual é a segunda?Percebemos que grande parte das empresas espera um crescimento ou uma manutenção dos negócios em 2025, semelhante a 2024. Não estão particularmente otimistas em termos de crescimento. Mas acreditam que o número de trabalhadores que têm ou vai manter-se, ou sobe ligeiramente. Não temos uma perspetiva de que vai haver uma sangria brutal. Mas quando falamos do recrutamento, eles percebem que temos necessidade de trazer outro tipo de competências para as empresas. O nível de recrutamento vai estar ao nível de 2024, ligeiramente acima em alguns casos. Para 44% das empresas existem algumas perspetivas de recrutamento. Ora para a CEGOC é um negócio que não existia no passado. .Os recursos que estamos a receber da imigração precisam de ser vistos com alguma reserva. Porque não é necessariamente um talento ultraqualificado. Em setores de economia mais tradicionais vai dando só para as despesas.”.Uma área de negócio de consultoria de recrutamento de talento?Voltando à pergunta inicial: “O que é que a aquisição da Neves de Almeida nos trouxe?” Trouxe-nos a hipótese de responder a clientes que já tínhamos nas duas empresas, mas para quem o grupo não conseguia dar resposta, porque não era o seu posicionamento. Também nos deu a possibilidade de entrarmos na consultoria de Recursos Humanos. Diria mais: consultoria de Pessoas e Cultura. Temas onde tradicionalmente a CEGOC não era tão considerada. Somos muito fortes na área da Formação e, aí, consolidámos com a Neves de Almeida. O que a Neves Almeida tinha na formação juntou à CEGOC e temos uma equipa supermusculada, que equivale a 70% do nosso negócio em 2024. Portanto, esta equipa já era forte e ficou superaditivada [risos].É um exemplo das novas sinergias com a absorção da Neves de Almeida? É e dou outro: por exemplo, a consultoria, que na Neves de Almeida já valia mais de meio milhão de euros, neste momento já vale quase um milhão, só com a junção de uma e outra empresa. Nós juntámos a consultoria da Neves de Almeida com a consultoria da CEGOC e criámos uma unidade de Pessoas e Cultura. O elemento Cultura é um elemento muito forte e é um dos temas que a maior parte das empresas diz que temos de trabalhar. Captar talento indo além do salário, certo?As empresas precisam não só de atrair talento, mas também de o reter. E a retenção de talento passa por aquilo que as pessoas encontram além do salário. “Venho trabalhar para esta empresa e o que é que eu encontro em termos de valores? Associo os meus aos deles? Isto é uma cultura desejada ou uma cultura acidental?” E a CEGOC viveu precisamente isto nestes últimos dois anos com a aquisição da Neves de Almeida. E que lições extraíram? Percebemos que, ainda que fossem empresas que estavam no mesmo setor, juntando duas empresas que têm dois backgrounds culturais muito distintos, há um momento em que temos de optar. E no final de ano, de setembro para cá, nós dissemos: “Ok, a cultura que nós temos é uma cultura que, no fundo, é muito repartida entre a realidade que tínhamos antes da aquisição e a realidade que resulta da aquisição, um mix das duas, mas não é necessariamente a cultura que precisamos para executar a estratégia que temos na cabeça.” .Estou a falar de [eventualmente adquirir] outras empresas, de igual ou até maior dimensão, que nos permitam transformar uma área que fatura um milhão numa que fatura dois, três ou quatro.” .Que é?É uma estratégia de crescimento acelerado em vários grandes pilares. O primeiro é People and Culture Consulting, portanto, uma unidade hardcore para a consultoria dos temas tradicionais de recursos humanos, dos processos de gestão de recursos humanos, mas também, a meu ver, temas que realmente importam cada vez mais às empresas que querem crescer, a sua cultura organizacional. Um outro pilar de Learning Development Solutions, que são todas as soluções de formação, desde as presenciais, tradicionais, às digitais, às coisas mais experienciais, formações, teambuilding, etc. Nas modalidades híbridas, presencial, 100% online. E um terceiro pilar? É uma outra área, apesar de tudo mais pequenina. De Learning Process Outsourcing, que basicamente é a gestão da formação. E isso era uma coisa que não existia na Neves de Almeida, mas existe dentro do grupo CEGOS [os donos da CEGOC] e estamos a dar esses passos para termos também uma unidade cá em Portugal. Trata-se da gestão administrativa da formação. Se tu tiveres um departamento de formação numa empresa, ele faz isso. Mas nós, aqui, tratamos do processo todo, por exemplo de uma empresa como a Siemens. Desde o levantamento das necessidades de formação, encontrar os fornecedores, organizar as formações, garantir que depois as avaliações são feitas e que os pagamentos são feitos a tempo e horas. Eles depois, basicamente, recebem uma fatura e não têm chatice nenhuma. No grupo, em França, vale 40 milhões de euros, mas aqui em Portugal está ainda muito longe disso. Estamos a dar os primeiros passos. .Como é que isso fica organizado dentro da empresa, especialmente com a Neves de Almeida?Estes três blocos de negócio vão ficar todos debaixo da marca CEGOC. A Neves de Almeida vai dedicar-se ao Talent Acquisition e Talent Assessment. Ou seja, recrutamento especializado com metodologias de procura de pessoas para cargos executivos. E no Assessment estamos a falar de competências. Vão manter a marca Neves de Almeida?Vamos manter a marca Neves de Almeida. Aliás, a minha intenção é, antes do final do mês, haver uma nova identidade gráfica para a Neves de Almeida. Estamos a procurar integrá-la dentro do grupo, com uma uma apresentação pública que permita identificar esta empresa como fazendo parte do grupo CEGOS e do Grupo CEGOC em Portugal, ainda que se dedique de forma exclusiva ao executive search.Que novidades é que a CEGOC nos reserva em 2025 e no anos seguintes?Eu continuo interessado, para já, em consolidar esta aquisição com uma equipa que é nova, com novas lideranças.Mas já está identificado o que é que a Neves de Almeida podia e está a dar.Neste momento é consolidar isto, numa perspetiva de dizer: “Senhores, há algumas áreas que podemos internacionalizar no grupo e que vamos dar os primeiros passos nesse sentido.”Com outro nome?Neste momento é com esta identidade gráfica. Mas, no futuro, quando quisermos lançar noutras geografias, faz sentido, se calhar, criar uma marca diferente para esses mercados ou para todos os mercados. Não está decidido, mas claramente é uma das coisas que nós queremos fazer. Portanto, o primeiro passo é esse. Temos a capacidade, por exemplo, de consolidar o nosso engagement survey dentro do grupo e nas geografias onde o grupo tem negócios, em clientes do grupo, de uma forma bastante transversal. Tenho também a necessidade de procurar oportunidades de consolidar estas áreas de negócio com eventuais aquisições que venham a surgir. Estou a falar de [eventualmente adquirir] outras empresas, de igual ou até maior dimensão, que nos permitam transformar uma área que fatura um milhão, numa área que fatura dois ou três ou quatro.Tal como aconteceu com a integração da Neves de Almeida.Exato. A visão mantém-se e, de facto, deste ponto de vista nós temos uma preocupação muito clara de ser consistentes com aquilo que nós dissemos, como com o que fomos fazendo ao longo do tempo. Agora, se formos olhar exclusivamente para a CEGOC, tem, a meu ver, dentro daquilo que são os vários temas que nós vamos tocando, uma série de coisas que são muito positivas. Temos um mercado a dizer, por um lado, que vamos recrutar mais pessoas ou, pelo menos, as mesmas pessoas do ano passado. Isso significa que este negócio está em crescimento, ou pelo menos em manutenção. De facto, nós temos empresas a dizer: “Nós temos que apostar mais na formação, em liderança, em business transformation, até mais do que nas outras componentes de formação.” E estes são os nossos territórios naturais aquilo que são as competências mais transversais, que continuam a ser prioritárias face às demais.