Défice regressa ao fim de um ano e Sarmento culpa Governo do PS
As contas públicas portuguesas registaram, no primeiro trimestre deste ano, o primeiro défice desde o final de 2022, revela a Direção-Geral do Orçamento (DGO), entidade que agora é tutelada pelo novo ministro das Finanças, Joaquim Miranda Sarmento.
Numa nota enviada aos jornais, ontem à tarde, o gabinete do ministro Sarmento constata que o excedente “transformou-se” num défice agora em março e não tem dúvidas: a grande culpa é do Governo anterior, de António Costa, e do ex-ministro das Finanças, Fernando Medina.
“Esta forte degradação do saldo orçamental, entre janeiro e março de 2024, resulta, em grande medida, de decisões e compromissos assumidos já este ano pelo anterior Governo [do PS] e, em muitos casos, após as eleições de 10 de março”, atira o gabinete do ministro na referida nota.
De acordo com cálculos do DN/ Dinheiro Vivo, a partir da síntese da execução orçamental dos primeiros três meses deste ano, estatística que é feita em contabilidade de caixa (ou seja, assume os valores que efetivamente entraram como receita e que saíram como despesa do erário público), o défice acumulado do período de janeiro a março terá ficado muito próximo de 418 milhões de euros, valor que resulta de uma correção importante que expurga o efeito de uma mega operação que empolou a receita do ano 2023, e que distorceria a execução mensal.
Há um ano, o Ministério das Finanças informou que “a execução do primeiro trimestre de 2023, excluindo o efeito da transferência do Fundo de Pensões da Caixa Geral de Depósitos (FPCGD) para a Caixa Geral de Aposentações (CGA), no valor de 3018 milhões de euros, resultou num saldo orçamental de 1881 milhões de euros”.
“Apesar da transferência do FPCGD ser neutra para o saldo orçamental na ótica de contas nacionais, ao assumir uma natureza financeira tem impacto na contabilidade pública. A análise da evolução dos agregados de receita deve, portanto, ser corrigida deste efeito”, explicou a tutela do então ministro Fernando Medina.
A nova tutela das Finanças confirma que essa correção acontece na sequência da “transferência, em 2023, da totalidade das responsabilidades asseguradas através do Fundo de Pensões do Pessoal da CGD para a CGA”.
No entanto, diz o Ministério das Finanças, “ajustando o efeito inerente ao FPCGD, o saldo orçamental das Administrações Públicas (AP) tem uma queda de 2299,1 milhões de euros face ao mesmo período do ano anterior”. Essa redução arrasta o saldo positivo para um défice de 418 milhões de euros no final de março. Desde dezembro de 2022 que o Governo não entregava um défice.
Mas mesmo sem corrigir a referida transferência do fundo de pensões da CGD para o perímetro do Estado (CGA), o MF indica que as contas já registariam um défice nesta altura do ano (março de 2024), embora bem menor do que o défice corrigido apurado.
Expurgando a transferência da CGD (que aparece como apenas receita, em 2023, mas vai servir para pagar todas as pensões aos bancários da Caixa, logo, vai aumentar a despesa dos próximos anos), o ministério de Miranda Sarmento indica que “o crescimento da receita, em 4,3%, excluindo a operação de transferência do FPCGD, reflete a evolução da receita contributiva (9,6%) e da receita não-fiscal e não-contributiva (10,2%), atendendo à quebra da receita fiscal (-0,3%)”. “O crescimento da receita não-fiscal e não-contributiva (10,2%) foi influenciado pelo comportamento do agregado das restantes receitas (27,1%) e das transferências (10,1%).”
“O crescimento da despesa primária [despesa total descontando os juros] em 15,7% (15,1% na despesa efetiva) é explicado essencialmente pelos aumentos nas transferências (23%), nas despesas com pessoal (7,8%) e na aquisição de bens e serviços (7,2%).”
Converge cada vez menos
Também relativamente ao primeiro trimestre, o Instituto Nacional de Estatística (INE) e o Eurostat revelaram ontem que a economia portuguesa continuou a crescer acima do ritmo da Zona Euro (que está a tentar sair da estagnação, que já dura há mais de um ano), mas mostram também que Portugal está a perder fôlego e parece até que essa convergência (que acontece desde o fim do período mais letal da pandemia, o primeiro trimestre de 2021) está por um fio.
No primeiro trimestre, Portugal cresceu 1,4% em termos reais, disse o INE, a Zona Euro avançou 0,4%, referiu o Eurostat. Para a economia portuguesa, que está a carregar com o peso cada vez maior dos juros e com a lentidão crescente do investimento e do consumo das famílias, trata-se do crescimento mais baixo do Produto Interno Bruto (PIB) desde esses tempos de mortalidade máxima da covid-19.
A amplitude da convergência face à Zona Euro também é a mais estreita desde o verão de 2021, segundo cálculos do DV.
Segundo o INE, a riqueza produzida internamente no primeiro trimestre avançou os tais 1,4%, o que representa um abrandamento face aos 2,1% no trimestre precedente.
“O contributo positivo da procura interna para a variação homóloga do PIB diminuiu no 1º trimestre, verificando-se uma desaceleração do investimento e do consumo privado”, explica o instituto.
O comércio externo como um todo também não ajudou, pois o crescimento das importações foi mais forte que o das exportações.