A Deco defende que os bancos devem estar obigados por lei a informar sobre a taxa de juro cobrada no cartão de crédito e a taxa máxima em vigor naquele momento nos extratos que envia aos clientes.
A Deco defende que os bancos devem estar obigados por lei a informar sobre a taxa de juro cobrada no cartão de crédito e a taxa máxima em vigor naquele momento nos extratos que envia aos clientes.FOTO: LUIS COSTA CARVALHO

Cartões de crédito antigos com juros acima do máximo do Banco de Portugal agravam endividamento

Cartões anteriores a 2010 não estão vinculados ao regime das taxas máximas. Deco alerta que é frequente situações de clientes com taxa de juro no cartão superior a 30% quando o máximo ronda agora 19%.
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Consumidores com cartões de crédito anteriores a 2010 estão a pagar juros superiores aos valores máximos definidos pelo Banco de Portugal, o que segundo a Deco agrava e prolonga muitas situações de endividamento.

Segundo o Banco de Portugal (BdP), em dezembro de 2024 (último mês disponível) estavam ativos oito milhões de cartões de crédito. Contudo, o supervisor não tem dados sobre quantos destes cartões são anteriores a 2010 e não estão vinculados ao regime das taxas máximas.

A coordenadora do Gabinete de Proteção Financeira da Deco, Natália Nunes, disse à Lusa que quando são contactados por consumidores devido às dificuldades financeiros, e analisam os casos, concluem que um dos problemas mais graves é que pagam juros elevados pelos cartões de crédito, muitas vezes porque são cartões contratados antes do regime das taxas máximas (que entrou em vigor em 01 de janeiro de 2010).

A Deco disse que é frequente situações de clientes com taxa de juro no cartão de crédito superior a 30% e partilhou o exemplo de um consumidor que tem um cartão há mais de 15 anos com uma taxa de 31,9% e que contactou a associação questionando como podia o banco cobrar esse juro quando naquele período o Banco de Portugal tinha estabelecido como máximo uma taxa de 19,1%.

Tal é permitido porque a pessoa tem um cartão anterior a 2010 e a legislação que define as taxas máximas não se aplica a cartões contratados antes dessa data.

“Este caso ilustra como este problema não é devidamente reconhecido pelos consumidores. O desconhecimento sobre as taxas aplicáveis e os encargos associados acaba por agravar o custo do crédito e prolongar situações de endividamento”, afirmou Natália Nunes.

Mas mesmo consumidores que têm noção desta diferença enfrentam dificuldades. Isto porque, para terminar o contrato antigo, precisam de pagar na totalidade o que devem (capital, juros e comissões), sendo que o valor que muitos pagam mensalmente abate pouco, prolongando a dívida.

A Lusa questionou o Banco de Portugal sobre qual a taxa de juro média dos cartões de crédito em Portugal, tendo o supervisor respondido que entre janeiro e dezembro de 2024, a TAEG (Taxa Anual de Encargos Efetiva Global) média de todos os cartões em Portugal foi de 17,95%.

Em 2009, um diploma do Governo estabeleceu que trimestralmente, a partir de 01 de janeiro de 2010, o BdP definiria as taxas máximas no crédito aos consumidores. Segundo o regime das taxas máximas, em cada trimestre, a TAEG máxima (a TAEG corresponde a todos os custos inerentes à utilização do cartão) é a média praticada pelo mercado no trimestre anterior acrescida de um quarto. A este limite acresce que no máximo a taxa praticada não pode exceder a TAEG média de todos os contratos de crédito aos consumidores mais 50%.

Durante o segundo trimestre deste ano, segundo o estabelecido pelo BdP, é de 19,2% a taxa máxima que pode ser cobrada nos cartões de crédito.

Contudo, são muitos os clientes 'presos' a cartões de créditos mais antigos que, em geral, têm taxas mais elevadas. Mesmo quem tem cartões de crédito contratados após a entrada em vigor do regime (2010) fica ‘preso’ à taxa de juro definida aquando da contratação do cartão de crédito.

Por exemplo, se o cliente contrata um cartão de crédito este mês pela taxa de 19,2% (ou seja, o banco está a cobrar o máximo permitido pelo BdP este trimestre) e no futuro a taxa máxima se alterar (descer ou subir) fica na mesma vinculado à taxa contratada enquanto mantiver o cartão de crédito, salvo se conseguir renegociar com o banco.

Assim, se no próximo trimestre a taxa máxima descer essa nova taxa máxima não se aplica retroativamente aos contratos já celebrados, mas apenas a novos contratos formalizados a partir desse momento.

Para a Deco, outro dos problemas está relacionado com crédito ‘revolving' e os custos associados. Este tipo de crédito é concedido através de um cartão com prazo de renovação e cada vez que é reembolsado o valor utilizado fica novamente disponível o 'plafond' inicial.

"Neste crédito, os consumidores muitas vezes desconhecem o verdadeiro custo do financiamento devido à forma como a dívida é renovada automaticamente”, afirmou Natália Nunes, acrescentando que muitos clientes pagam mensalmente valores que só abatem juros e comissões, mantendo a dívida praticamente inalterada.

Recordou ainda que são muitos os casos de pessoas que recorrem a um novo cartão de crédito para pagar outro, “caindo num ciclo de endividamento difícil de quebrar”.

Lei deve obrigar bancos a informar

A Deco defende que a legislação que obriga os bancos a enviar aos clientes um extrato das comissões cobradas deve incluir informação sobre a taxa de juro cobrada no cartão de crédito e a taxa máxima em vigor naquele momento.

A coordenadora do Gabinete de Proteção Financeira da Deco considera que houve um “grande avanço” quando, em 2010, a lei passou a estabelecer que trimestralmente o Banco de Portugal (BdP) definiria a TAEG (taxa anual de encargos globais) máxima aplicável ao crédito pessoal, crédito ao consumo e aos cartões de crédito, mas defende um reforço da informação.

“Seria importante haver uma informação aos consumidores relativamente à TAEG que eles têm contratado [no cartão de crédito] e também seria importante que, anualmente, o banco fosse obrigado a enviar informação sobre a TAEG contratada e cobrada e também o valor da TAEG máxima [definida pelo Banco de Portugal] naquele momento”, afirmou à Lusa Natália Nunes.

A coordenadora do Gabinete de Proteção Financeira da Deco adiantou que a legislação deveria ter regras semelhantes às que já hoje obrigam os bancos, anualmente, em janeiro, a enviar um extrato de comissões com informação detalhada sobre todas as comissões cobradas no ano anterior pelos serviços associados à conta.

Este extrato, mostra, por exemplo, a taxa de juro aplicada à conta à ordem e o valor total dos juros recebidos ou a comissão unitária cobrada por cada serviço e o número de vezes que foi utilizado.

No caso dos cartões de crédito, o envio de informação sobre a taxa de juro contratada permitiria ao consumidor perceber se esta está muito acima da taxa de juro máxima definida trimestralmente pelo Banco de Portugal.

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