Um mês depois do anúncio, a 6 de dezembro passado, que reuniu a presidente da Comissão Europeia, Ursula von der Leyen, e os presidentes de Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai na capital deste último país, Montevideu, o Acordo de Parceria UE-Mercosul segue sem grandes novidades. No entanto, 2025 lança novas expectativas sobre este que é o maior instrumento bilateral de livre comércio do mundo. Juntos, os dois blocos reúnem cerca de 718 milhões de pessoas e somam um Produto Interno Bruto de aproximadamente 22 biliões de dólares (cerca de 21 biliões de euros).A conclusão das negociações 25 anos depois do seu início é só uma das provas da complexidade de se chegar a consensos neste cenário. De 2023 até dezembro de 2024, foram sete reuniões com representantes dos dois blocos, todas em Brasília, capital brasileira, até que houve o entendimento final. Até agora, nenhum dos lados formalizou calendários para que os trâmites internos relativos aos processos de revisão, tradução e ratificação sejam realizados, burocracias que deverão levar certo tempo..UE-Mercosul: “Fortalecer vínculos entre países com valores semelhantes é muito favorável”. Enquanto isso, manifestações contrárias ao acordo são retomadas na Europa. Em França, país onde o livre comércio com o Mercosul enfrenta a maior resistência, o primeiro domingo deste ano foi marcado pela retoma da marcha de agricultores e produtores rurais de todas as regiões rumo à capital. Representantes do sindicato destes trabalhadores têm marcada uma reunião, no próximo dia 13, com o novo primeiro-ministro, o recém-empossado François Bayrou, nomeado em 13 de dezembro depois de o seu antecessor, Michel Barnier, ter sido censurado. Embora o movimento tenha decidido não bloquear totalmente as estradas neste momento, que marca o retorno após as férias de Natal, alguns cortes pontuais em vias de acesso a Paris poderão ser vistos nos próximos dias, conforme alertou a presidente do sindicato Coordenação Rural (CR), Véronique Le Floc’h, aos media.A tentar sobreviver a uma crise política interna, França encontra uma certa união no antagonismo ao pacto com os sul-americanos. “O assunto não está encerrado (...). Continuaremos a defender vigorosamente a consistência de nossos compromissos”, disse Emmanuel Macron a embaixadores reunidos no Palácio do Eliseu ontem. O presidente francês falava sobre o acordo para tentar tranquilizar os agricultores, que exigem que promessas feitas após a sequência de protestos de 2024 sejam implementadas. A dissolução da Assembleia Nacional por Macron, em junho, e sucessivas mudanças de governo atrasaram a votação de um projeto de lei para a política agrícola que pretende responder a algumas exigências dos trabalhadores. Os manifestantes não descartam a instalação de um cerco de tratores ao redor de Paris até à véspera da reunião com François Bayrou.Cenários para ratificaçãoNo Mercosul, Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai precisam, cada um, de submeter o texto do acordo aos seus parlamentos para aprovação. Na Europa, o enquadramento jurídico que vai definir os próximos passos é esperado até meados deste ano.Num documento que analisa os possíveis cenários para ratificação, a analista do Serviço de Estudos do Parlamento Europeu, Gisela Grieger, considera que a Comissão Europeia ainda deve definir se o acordo UE-Mercosul será submetido para ratificação como um instrumento misto, com competências partilhadas entre a UE e os seus Estados-membros, ou se será dividido em dois acordos: um primeiro, provisório, apenas da UE, que perderá validade depois de o acordo misto final ser ratificado pelos Estados-membros (podendo também coexistirem como acordos juridicamente separados após a sua ratificação).Os modelos poderão seguir o exemplo do que já existe com o Canadá, com o Chile ou com Singapura. No primeiro caso, o Acordo Económico e Comercial Global entre a UE e o Canadá (CETA) entrou em vigor provisoriamente em 21 de setembro de 2017, com a aprovação no Conselho e no Parlamento Europeu. O acordo só entrará em vigor de forma definitiva quando os 27 Estados-membros o tiverem ratificado. Este tipo de instrumento, que traz a partilha de competências entre a UE e os 27 países, exemplifica o tempo que pode levar para que enquadramentos como este estejam plenamente funcionais.caroline.ribeiro@dn.pt