Vírus chinês põe 550 milhões de exportações portuguesas de quarentena
Mármores, granitos e outras pedras, pastas celulósicas e papel, máquinas e aparelhos ou automóveis de passageiros foram os principais produtos que saíram para o Oriente no ano passado, num volume de vendas que chegou aos 553 milhões de euros entre janeiro e novembro (menos 10% do que um ano antes), enquanto de lá vieram máquinas e aparelhos, metais comuns e matérias têxteis - e chegaram em quantidade, sobretudo para abastecer indústrias, fazendo aumentar as importações em 26% nesses primeiros 11 meses, para 2,7 mil milhões.
É este volume de negócios e trocas que o coronavírus poderá quebrar. Os primeiros casos foram detetados em dezembro, em Wuhan, a capital da província de Hubei, onde vivem 11 milhões de pessoas, e desde então tem paralisado cidades inteiras. Sendo o vírus transmissível por ar, o surto já fez mais de 200 vítimas mortais e contagiou milhares, tendo alastrado a pelo menos 20 países.
Os efeitos de um surto desta dimensão na produção chinesa estão ainda por contabilizar - tudo dependerá da real gravidade da doença, da intensidade e velocidade do contágio e do tratamento e do tempo de paragem laboral em que isso se traduzirá. E se, devido às celebrações do Ano Novo Lunar neste mês de janeiro, já era previsto que várias fábricas da região estivessem paradas, o prolongamento da pausa festiva ordenado pelo governo de Pequim quando o número de casos começou a crescer não é - por nenhum motivo - uma boa notícia.
"Há o risco de os encerramentos serem alargados. E, mesmo quando a produção for retomada, as fábricas podem não ser capazes de manter os níveis de produção", avisam Piya Sachdeva, economista, e Azad Zangana, estratega e economista sénior para a Europa da Schroders. Os efeitos "sobre a procura são significativos para a China, mas têm potencial para afetar tanto ou mais a economia mundial, causando perturbações nas cadeias de fornecimento. A época em que este surto surge é particularmente infeliz, já que coincide com as celebrações do Ano Novo chinês - principal evento anual de migração de pessoas, com milhões a viajar, fazendo que seja problemático conter o vírus", explicam.
No curto prazo, as limitações impostas às viagens e os receios da população "vão provavelmente reduzir a procura das famílias chinesas, bem como o turismo. Com um potencial atraso no regresso à normalidade, há o risco de Pequim crescer abaixo dos 6%". Tendo em conta que "o resto do mundo só consegue neste momento níveis de crescimento moderados, a China é agora mais importante do que nunca para a economia mundial - e as potenciais perturbações nos próximos meses são preocupantes nessa mesma medida".
Eurico Brilhante Dias, secretário de Estado da Internacionalização, admite que o cancelamento das ligações à China "terá seguramente impacto". "Num momento de incerteza, há empresas e cidadãos que vão atrasar decisões e isso tem sempre impacto económico. Quanto mais rapidamente ultrapassarmos esta fase mais rapidamente poderemos recuperar."
Devido ao potencial impacto deste vírus, as vendas do iPhone no mercado chinês também podem cair, admitiu já a Apple, enquanto o CEO, Tim Cook, tem preocupações acrescidas, mas a principal fornecedora de componentes do iPhone, Foxconn, afirma estar preparada para enfrentar o surto. Embora tenha a unidade de Wuhan, o principal ponto de produção do iPhone está a vários quilómetros do epicentro da doença. Por enquanto, a companhia mantém as unidades chinesas encerradas, conforme recomendado pelo governo chinês.
Sediada em Shenzhen, um dos centros tecnológicos da China, a Huawei, adiou a sua conferência anual dedicada a programadores para o final de março. A Xiaomi encerrou temporariamente todas as lojas na China. Solidariedade ou tentativa de controlar danos, vários empresários multimilionários anunciaram que estão a doar verbas para ajudar a travar a propagação do vírus e ajudar na investigação para uma vacina. De Jack Ma (14 milhões) a Bill Gates (dez milhões), a onda de donativos engordou nestes dias e alargou-se à indústria do luxo. Com os chineses a representar 90% do crescimento do mercado mundial do luxo (que ganhou cinco pontos percentuais no ano passado), segundo a consultora Bain & Co, a LVMH e a Kering juntaram mais três milhões ao bolo.
Ana Laranjeiro, Cátia Rocha e Ilídia Pinto são jornalistas do Dinheiro Vivo