O Governo prepara-se para entregar ao Parlamento, na próxima terça-feira, a proposta de Orçamento do Estado para o próximo ano. Deverá ser um exercício com contas equilibradas, após um excedente orçamental em 2023, e num contexto de desaceleração económica, de acordo com o que revelaram ontem alguns partidos políticos após um encontro com o ministro das Finanças, Fernando Medina, que lhes apresentou as linhas gerais do documento..A maioria dos economistas e fiscalistas ouvidos pelo Dinheiro Vivo sublinham a importância de reduzir impostos sobre famílias e empresas, aumentando o rendimento disponível dos agregados nesta conjuntura de elevada inflação e taxas de juro. IRS, IRC, mas também os impostos que oneram a habitação devem baixar. Há, no entanto, quem aponte para a necessidade de "prudência fiscal", imune a "grupos de pressão", numa altura em que se vislumbram nuvens negras no horizonte económico..O ministro das Finanças terá de lidar com o complexo desafio de atender às reivindicações na Administração Pública, como na Saúde e Educação, ao mesmo tempo que continua a baixar a dívida pública. Aumentar a despesa para "acalmar os ânimos", ou manter as "contas certas"? O OE2024 dirá..João César das Neves, Professor de Economia:.Menos carga fiscal e apoio aos pobres.Podemos continuar a fingir que existem "prioridades orçamentais" e "alternativas políticas", mas a verdade é que, com a recente derrocada dos enganos de sete anos de "contas certas", o ministro tem muito menos margem de manobra do que parece. A descida do défice desde 2015, alegadamente milagrosa, foi conseguida sem reformas estruturais, apenas aumentando a carga fiscal e reduzindo despesas de investimento e manutenção, mantendo salários e pensões. O resultado desta estratégia persistente é que os vários sistemas públicos, com destaque para a saúde e educação, estão todos a rebentar. Este ano, o ministro das Finanças até tem alguma folga financeira que lhe vem da inflação. Assim, a única escolha possível é saber se mantém a ilusão conjuntural das "contas certas", continuando a suportar os protestos setoriais, ou se aumenta as despesas nessas áreas para acalmar os ânimos. Em qualquer caso, as verdadeiras prioridades nacionais, que são a redução da carga fiscal para potenciar desenvolvimento e o apoio aos pobres afetados pela inflação, continuarão adiadas. Com esta estratégia, se fosse ministro das Finanças a minha prioridade seria uma rápida demissão do cargo..Luís Leon, Fiscalista:.IRC de 10% para pequenas empresas.O ministro das Finanças terá de fazer o milagre de manter a trajetória de redução do peso da dívida pública no Produto Interno Bruto (PIB) e, simultaneamente, acudir ao aumento de despesa pedido pelos restantes ministérios (sobretudo Saúde e Educação), bem como às exigências de alívio da carga fiscal por parte de pessoas e empresas..No curto prazo, destacaria as seguintes medidas: 1) Reduzir o IRC para micro e pequenas empresas para 10% e taxa de 14% para os dividendos destas empresas, como forma de incentivar a criação de empresas por parte de pequenos empresários..2) Tornar a regra da isenção a forma de eliminação da dupla tributação internacional para investimentos feitos no estrangeiro (como acontece noutros países da União Europeia)..3) Criar um regime padronizado de benefícios em espécie que as empresas possam disponibilizar aos colaboradores sem tributação..4) Eliminar o englobamento obrigatório das mais-valias de curta duração com efeitos a 2023..5) Permitir aos senhorios deduzir os encargos com as hipotecas ao seu rendimento das rendas..Óscar Afonso, Diretor da Faculdade de Economia da Universidade do Porto:.Baixar taxas do IRS e reforçar deduções.1) A principal prioridade é reduzir as taxas de IRS e subir as deduções, sobretudo para saúde, educação e rendas, prevendo ainda a reintrodução temporária, por um ano, da dedução de juros do crédito à habitação..2) Descida temporária das contribuições sociais dos trabalhadores, reforçando o alívio na carteira, e o mesmo no caso dos empregadores se na Concertação Social houver compromisso para reforços salariais superiores aos já acordados..3) O IRC deve ser desagravado para estimular a competitividade, eliminando a derrama estadual e anunciando uma descida gradual e programada da taxa de imposto, aspetos também a incluir num acordo de Concertação Social para aumento de salários..4) A redução do rácio da dívida pública no PIB deverá prosseguir, sendo promovida pela redução preconizada da carga fiscal, indutora de crescimento económico, o que permite ainda contrariar o abrandamento económico previsto..5) Encetar uma verdadeira reforma da Administração Pública com base em melhorias de gestão, meritocracia e redefinição das funções do Estado, visando uma melhor provisão de serviços públicos com menos recursos, o que permitirá baixar sustentadamente a carga fiscal..Diogo Bernardo Monteiro, Fiscalista:.Aumento "muito significativo" dos valores dos escalões do IRS.O primeiro conjunto de medidas deve privilegiar a redução do IRS no sentido de aumentar o rendimento disponível das famílias. Estas medidas devem concretizar-se através de um aumento muito significativo (e não apenas destinado a refletir a inflação) dos valores aplicáveis aos diferentes escalões de rendimentos. Alguns ajustes mais cirúrgicos ao nível do IRS devem incentivar o mercado do arrendamento, ampliando a redução de tributação sobre estes rendimentos, ao mesmo tempo que se recupera a dedução à coleta dos encargos financeiros com a aquisição de imóveis destinados a habitação própria e permanente. O segundo pilar de medidas fiscais deve concentrar-se no aumento da competitividade das empresas, aperfeiçoando-se os incentivos à sua capitalização e ao investimento. Finalmente, não se deve perder a oportunidade de consagrar medidas de simplificação de procedimentos administrativos impostos aos cidadãos e às empresas, com a eliminação de obrigações redundantes, e a melhoria do relacionamento com a Administração Pública em geral e com a administração fiscal, e os serviços da Segurança Social em particular..António Mendonça, Bastonário da Ordem dos Economistas:."Política fiscal prudente".É difícil, senão mesmo impossível, colocarmo-nos na pele do ministro das Finanças. Não dispomos da mesma informação, não sofremos as pressões políticas, internas e externas. Atrever-me-ia, em todo o caso, a considerar como prioridades:.1) Reformar o processo de elaboração orçamental, transformando-o num verdadeiro instrumento de política económica, enquadrado num planeamento estratégico de médio e longo prazo, aumentando a sua transparência, previsibilidade, coerência e amizade para com o investimento e o crescimento..2) Adotar uma perspetiva contra cíclica, face às projeções de forte desaceleração económica de economia portuguesa e do seu enquadramento europeu e internacional, muito em particular, em resultado dos efeitos previsíveis das elevadas taxas de juro e dos lags na sua transmissão..3) Privilegiar uma política fiscal prudente, centrada nos equilíbrios macroeconómicos, internos e externos, e não na resposta a grupos de pressão..4) Recuperar os rendimentos das classes médias, particularmente dos quadros qualificados, e promover o investimento, público e privado..5) Dar resposta imediata aos problemas da saúde e da educação..Tiago Caiado Guerreiro, Fiscalista:.Reduzir IRS e eliminar IMI na habitação própria.Se fosse ministro das Finanças as minhas prioridades para o Orçamento de 2024 seriam as seguintes: Reduzir o IRS sobre os rendimentos do trabalho de forma sustentável e sistemática por forma a deixar mais rendimento disponível para as famílias e para os reformados, beneficiando em especial aqueles que tiveram carreiras contributivas mais longas. Reduziria progressivamente o IRC sobre as empresas, tal como fez a Irlanda com o objetivo de estimular o crescimento económico e o emprego. Eliminava o IMI ou qualquer outro tipo de imposto sobre habitação própria e permanente, dada a sua função social. Reduziria progressivamente a contribuição para a Segurança Social "das famílias" com dois ou mais filhos, dado estarem a contribuir para a sustentabilidade da mesma. Criava um fundo de mil milhões de euros para construir habitação, a custos controlados nos múltiplos terrenos do Estado, nos locais onde existe menos oferta de habitação. Estes não seriam para venda, mas arrendados a custos controlados gerando com isso receitas suficientes para continuar o processo de construção todos os anos. Continuaria a reduzir o peso da dívida pública no PIB, por forma a reduzir os encargos e risco do país..Leia mais em Dinheiro Vivo a sua marca de economia