Jovens vão trabalhar até aos 70 para a reforma
Continuar a trabalhar para além da idade da reforma pode dar um valor extra na pensão de 5,4% no primeiro ano (considerando um salário médio). O bónus vai descendo à medida que o pensionista se mantém no ativo, uma vez que as regras impõem um teto máximo de 92% face ao valor da remuneração de referência, além das regras de cálculo já permitirem taxas de substituição muito elevadas.
Comparando com outros países, só na Bélgica compensa menos continuar a trabalhar depois da idade da reforma, em que o valor extra é de 2,8%, defende a Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económicos (OCDE). No lado oposto está a Islândia e o Japão, em que adiar por um ano a entrada na reforma dá um bónus superior a 11% ao ano.
Neste aspeto, Portugal está longe da média da OCDE, em que um trabalhador em idade de reforma consegue um benefício de cerca de 7,5% ao ano.
No relatório divulgado ontem, a organização sediada em Paris indica que 6,8% dos portugueses entre os 55 e os 69 anos acumulavam pensão com rendimento do trabalho, um valor ligeiramente acima da média da União Europeia (6,2%).
O bónus atribuído por cada mês de trabalho ao valor da pensão depende dos anos de carreira contributiva. Quem descontou 40 ou mais anos tem uma compensação de 1% por mês, mas quem descontou entre 15 e 24 anos já só tem um acréscimo mensal de 0,33%.
É um incentivo que a OCDE considera baixo, tendo em conta o rápido envelhecimento da população portuguesa. E, olhando para as regras em vigor, este valor tão baixo acaba por "manchar a imagem dos incentivos reais para trabalhar mais tempo depois da idade legal da reforma", sublinha.
No relatório sobre o sistema português de pensões, a OCDE faz uma recomendação específica para quem, por via do desemprego durante a crise, interrompeu a carreira contributiva.
Os técnicos da organização defendem que deve ser considerada a "concessão de direitos de pensão para as pessoas que não conseguiram encontrar emprego durante a crise", sugerindo que se abarque o período entre 2009 e 2014. Uma forma de "amortecer os efeitos de longo prazo", permitindo que consigam aceder à reforma em condições semelhantes a um trabalhador que se manteve no ativo durante aquele período.
A OCDE refere que, em média, um trabalhador que interrompeu a sua carreira contributiva por um período de dez anos ao longo da vida ativa tem de trabalhar mais dois anos para conseguir compensar os descontos que não fez durante o período de inatividade.
O problema é mais grave para os jovens trabalhadores. A OCDE lembra que, entre 2010 e 2017, "a taxa média de desemprego atingiu os 17% para o segmento 25-29 anos e os 29% para idades entre os 20 e os 24 anos, conduzindo a pensões mais baixas pela falta de descontos.
Quem começou a trabalhar no ano passado, com 20 anos, poderá conseguir a reforma completa aos 67 anos e dois meses em 2066. A projeção é feita pela OCDE tendo em conta as atuais regras de acesso à reforma. Ou seja, mantendo-se a possibilidade de reforma com 40 anos de carreira contributiva. Em caso de eliminação da regra, um recém-trabalhador precisaria de estar no ativo até aos 69 anos e meio para conseguir a reforma completa.
Tudo depende da idade em que os futuros pensionistas entram no mercado de trabalho. Portugal está entre o grupo de países que mantêm uma taxa de substituição mais elevada nos países da OCDE. De acordo com o estudo divulgado nesta quarta-feira, e utilizando as projeções da Comissão Europeia, um trabalhador que se reforme em 2056 sem qualquer penalização terá uma reforma mais baixa do que uma pessoa que se reformou em 2016, correspondendo a um corte de 11%. Será uma das maiores quebras de taxa de substituição na Europa.
Mesmo assim, a OCDE faz notar que as taxas de substituição continuarão a ser das mais elevadas, comparando com outros países. Para o cenário-base traçado para o estudo - entrada no mercado de trabalho com 20 anos em 2018 e reforma na idade legal sem interrupção na carreira -, a taxa bruta de substituição será de 74,5% face ao salário médio de um trabalhador. Mesmo assim, está muito acima da média da OCDE, que não chega a uma taxa de 53%. Apenas a Áustria, a Dinamarca, a Itália, o Luxemburgo e a Holanda terão uma taxa de substituição futura mais elevada.
A idade legal para a reforma em Portugal é hoje de 66 anos e cinco meses, mas pode ser antecipada para os 60 anos, beneficiando da flexibilização permitida pelo atual regime. É um limite que a OCDE considera muito baixo. "Dada a esperança de vida mais longa, a elegibilidade aos 60 anos para a reforma antecipada é demasiado baixa", refere o relatório sobre o sistema de pensões em Portugal divulgado nesta quarta-feira, em Lisboa.
Os técnicos da instituição indicam que este referencial de idade "contribuiu para moldar normas sociais e influenciar comportamentos, tanto da parte do empregador como da parte do trabalhador sobre o trabalho em idades mais avançadas", acrescentando que, ao manter esse limite tão baixo e tendo em conta as penalizações associadas, pode "induzir as pessoas a fazerem escolhas erradas".
O relatório da OCDE refere ainda que Portugal está entre os países da organização com as mais pesadas penalizações pela reforma antecipada. "Portugal destaca-se entre os outros países da OCDE em termos de penalizações pela reforma antecipada. Reformar-se um ano antes da idade normal de reforma traduzir-se-á numa redução permanente de 36,2%."
A fatia de leão da penalização vem do fator de sustentabilidade que se aplica apenas às reformas antecipadas, depois das alterações introduzidas em 2014. Só por esta via, para quem se reformou em 2018, o corte foi de 14,5% e pode subir até aos 31% em 2065. Além do fator sustentabilidade, há que juntar ainda o corte de 0,5% por mês de reforma antecipada. O país com a segunda maior penalização por cada ano de reforma antecipada é a Alemanha, com 12,8%. A OCDE revela que, "para outros países em que a reforma antecipada é possível, o impacto médio de se reformar três anos antes da idade legal corresponde a uma perda de 7% por cada ano de antecipação, menos de metade do registado em Portugal".