Reembolsos do IVA devem anular devolução da sobretaxa do IRS
Os trabalhadores e pensionistas devem preparar-se para não contar com qualquer devolução da sobretaxa de IRS. A tendência é para que a receita do IRS e do IVA "alise" em termos homólogos nesta reta final do ano e está agora a verificar-se uma maior rapidez nos reembolsos do IVA por parte do Estado às empresas, alertam os especialistas ouvidos pelo DN/Dinheiro Vivo. O tema está já a causar desconforto entre o PSD e o CDS-PP e levou mesmo ontem o PS a exigir com "carácter de urgência" a presença dos secretários de Estado dos Assuntos Fiscais e do Orçamento no Parlamento.
Depois de a execução orçamental de setembro (revelada duas semanas após a realização das eleições) ter baixado de 35% para 9,7% a estimativa de devolução da sobretaxa, o Jornal de Negócios veio ontem dar como certo de que esta devolução pode chegar a 0% em outubro. Os números oficiais só serão conhecidos na quarta-feira, mas Domingues de Azevedo, bastonário da Ordem dos Contabilistas Certificados, não tem dúvidas de que daqui para a frente as estimativas não vão melhorar.
"Quem paga sobretaxa deve esperar receber 0%", diz. Decisivo neste desfecho, afirma, são os sinais que lhe vão chegando por parte das empresas e que dão conta de uma aceleração nos reembolsos do IVA desde o mês passado. "Neste momento, as devoluções do IVA estão a ser desblo- queadas e a ser processadas de forma mais rápida. Isto começou a sentir-se a partir de meados de outubro", referiu.
Ao longo dos últimos meses, a Unidade Técnica de Acompanhamento Orçamental (UTAO) alertou por diversas vezes que o crescimento do IVA em 2015 estava a beneficiar da queda do valor dos reembolsos face a 2014. O Ministério das Finanças negou sempre esta leitura, afirmando que as situações não são comparáveis pelo facto de o sistema e-fatura permitir fazer uma triagem mais eficaz de quem tem e não tem direito àquele reembolso.
Vasco Valdez, que assumiu a pasta dos Assuntos Fiscais no governo de Durão Barroso, afirma que, neste momento, apenas o governo tem dados que permitem saber se vai ou não haver lugar a devolução da sobretaxa. Mas refere que à luz dos indicadores que vão sendo conhecidos, não há razões para acreditar que o crédito fiscal se materialize.
A receita dos impostos tende a crescer na segunda metade do ano (ver infografia). Não havendo alterações de maior na atividade económica ou nas taxas dos impostos, a tendência é para que a evolução homóloga "alise" nesta reta final do ano. Do lado do IRS, os reembolsos estão já arrumados - ainda que este imposto possa beneficiar de outubro em diante do efeito da reversão do corte salarial de 20% na função pública - e, no IVA ,os sinais de abrandamento do consumo são mais um fator que pode anular o crédito fiscal ou atirá-lo para um valor "completamente marginal".
No mês passado, o IRS foi apontado como o "culpado" para a quebra abrupta na estimativa do crédito fiscal, mas o certo é que, sublinha o fiscalista Manuel Faustino, tem sido a evolução da receita do IVA que tem dado algum fôlego à perspetiva de devolução da sobretaxa. O crédito fiscal foi a resposta da coligação à proposta da bancada do CDS-PP de baixar a sobretaxa de 3,5% para 3% no Orçamento do Estado de 2015. A perspetiva de que possa não se concretizar está a causar alguma divisão entre os deputados dos dois partidos.
Para existir devolução é necessário que a receita conjunta do IRS e do IVA cresçam mais de 3,7% face a 2014. Ora, afirma Manuel Faustino, o "IRS está exaurido" e "seria um milagre" se conseguisse crescer este ano e, "quem contou com o crédito fiscal, deve desiludir-se".
O PS quer que o governo explique a súbita queda "após as eleições" na estimativa deste crédito e apresentou um requerimento para ouvir Paulo Núncio e Hélder Reis no Parlamento. O pedido só será votado na próxima semana.