Cancelamentos, prejuízos e empregos em risco. O turismo em tempos de epidemia

A hotelaria e as companhias aéreas estão a braços com prejuízos elevados. A epidemia do novo coronavírus está a dar fortes dores de cabeça a um dos setores que é responsável por várias centenas de postos de trabalho, alguns dos quais podem mesmo estar em risco.

Voos cancelados, camas vazias, refeições por servir e espaços culturais e de entretenimento fechados. A cada semana que passa os prejuízos para as empresas do setor do turismo sobem, acompanhando a evolução da epidemia do novo coronavírus. Muitos são os que suspendem as suas viagens, o que se traduz numa quebra da procura e leva, por um lado as companhias aéreas a cancelarem voos, e por outro os hotéis a terem menos hóspedes. Os restaurantes, e outras atividades ligadas ao turismo, também estão a braços com os efeitos de terem menos gente a consumir.

Francisco Rebelo de Andrade é empresário na área da restauração e não esconde que os seus quatro restaurantes em Lisboa têm servido menos refeições. A culpa é da quebra da procura. E por isso não tem dúvidas: "o prejuízo é transversal a todos os agentes económicos e, portanto, tem de ser assumido por todos". O gestor defende ainda que "a única maneira de limitar as perdas seria haver um esforço concertado entre as instituições financeiras, governo e senhorios para conceder condições aos empresários que lhes permitissem lidar com os problemas", nomeadamente o pagamento de rendas pelos espaços e fazer face a responsabilidades financeiras com a banca.

A AHRESP - associação que representa a hotelaria e a restauração - assegura ao Dinheiro Vivo que, desde que se tornou claro que o setor ia ser contagiado pela epidemia, "pediu ao governo que tomasse atenção ao setor e tomasse medidas que pudessem minorar os impactos". Ana Jacinto, líder da associação, diz que foi, por isso, que foi aprovado um apoio de tesouraria para o setor. "Mas estas medidas não são suficientes. Fizemos um conjunto de propostas onde está a questão das rendas, para que pudéssemos encontrar outro tipo de soluções e apoios. As nossas propostas não se resumem a linhas de apoio. Ainda estamos a trabalhar com o governo".

Na quinta-feira, o governo anunciou um novo pacote de medidas que vai ter efeito sobre o setor: encerramento de discotecas e restrições nos restaurantes. Antes da epidemia chegar em força à Europa e Portugal, a associação estimava que o setor precisava de mais de 40 mil pessoas. Ana Jacinto, em declarações ao Dinheiro Vivo antes da decisão do Executivo de restringir o número de pessoas nos restaurantes, dizia que não conseguia prever se o setor ia ter despedimentos significativos. Mas admitia: "é no final de fevereiro e março que as empresas se preparam para a época alta, reforçando os quadros de pessoal. As que não o fizeram, não vão fazer. As que o fizeram vão ter um problema mais grave: engordaram a estrutura sem procura. O que vão fazer aos trabalhadores?!". Algumas firmas podem usufruir das condições de lay-off apresentadas pelas autoridades. Mas pode haver mesmo casos de despedimentos.

O presidente da AHP, Raul Martins, admitia na última quinta-feira que, dos cerca 100 mil trabalhadores que trabalham na hotelaria em Portugal, cerca de 30 mil pessoas, em regime de extras, não vão entrar para os hotéis.

O Executivo anunciou ainda na madrugada desta sexta-feira, e em resposta a um pedido dos patrões, uma linha de crédito específica para as microempresas - grande parte do tecido empresarial - do turismo para fazerem face aos efeitos da epidemia.

Prejuízos de milhões

A AHP, associação que reúne os hoteleiros nacionais, estimou esta semana que os prejuízos só entre 1 de março e 30 de junho podem alcançar os 800 milhões, contando que o setor tenha uma quebra de cerca de 50% das dormidas nesse período comparando com 2019, ou seja cerca de 7,3 milhões de noites. Até ao passado dia 9, as unidades hoteleiras já tinham registado mais de 350 mil noites canceladas.

A AHRESP tem estado a auscultar os seus associados e, num inquérito que foi fechado esta quinta-feira, verificaram que as quebras nas taxas de ocupação na hotelaria estão acima dos 40%. "Estamos a falar para reservas imediatas e período da Páscoa, mas há também cancelamentos para o verão. Estes dados mostram diminuição da taxa de ocupação, mas também perda de procura. Se falarmos da restauração, têm os mesmos prejuízos", acima dos 40%, diz Ana Jacinto.

O panorama para as companhias aéreas não é mais animador. Só esta semana a TAP confirmou o cancelamento de 3500 voos até maio. E este número poderá aumentar depois de o presidente dos EUA ter proibido a entrada de cidadãos do Espaço Schengen no país. A companhia aérea liderada por Antonoaldo Neves assume que a não realização destes voos vão ter efeitos sobre a receita da empresa - sem quantificar -, pelo que, já determinou a suspensão de todos os investimentos não críticos, bem como a revisão e corte de despesas não essenciais para o negócio ou a suspensão de contratações e novas admissões.

Ana Laranjeiro é jornalista do Dinheiro Vivo

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