K-League, onde os golos são festejados sem contacto e é proibido trocar camisolas
A K-League é uma competição desconhecida de muitos daqueles que gostam de futebol. Isto apesar de, no final de 2019, o campeão tenha sido o Jeonbuk, equipa treinada pelo português José Morais, que tem tempos foi adjunto de José Mourinho no Inter Milão, Real Madrid e Chelsea. O campeonato profissional de futebol da Coreia do Sul ganhou, no entanto, uma impensável dimensão internacional esta sexta-feira, quando mostrou ao mundo como será o futebol em tempos de pandemia.
O jogo inaugural da época 2020 foi transmitido para 36 países, entre os quais Portugal, mas também a Inglaterra, a denominada pátria do futebol que se abriu a um campeonato longínquo, onde a Premier League é vista com grande entusiasmo.
O Jeonbuk de José Morais venceu o Suwon por 1-0 graças a um golo de Lee Dong-guk, um veterano avançado de 41 anos, que deu ainda mais glamour à exótica K-League, um autêntico bálsamo em tempos de pandemia. Ainda mais porque Lee conta na sua longa carreira com passagens pelos alemães de Werder Bremen e dos ingleses do Middlesborough, o que aumentou ainda mais o interesse, pelo menos desses dois países pelo primeiro jogo de futebol em direto transmitido nos principais países europeus, após dois meses de jejum.
José Morais, de 54 anos, que inicia a segunda época no Jeonbuk estava, obviamente, satisfeito pela vitória no jogo de estreia da nova temporada, mas fez questão de dizer que as dificuldades sentidas frente a um adversário que em 2019 lutou para fugir à despromoção, nada tiveram a ver com as questões físicas provocadas pelo grande período sem competição. Afinal, este foi o primeiro jogo que a equipa fez desde que terminou a última época, sendo que esta temporada devia ter-se iniciado a 29 de fevereiro mas foi sucessivamente adiada por causa da pandemia.
"Não vejo que a minha equipa tenha sido influenciada negativamente pela paragem porque tivemos oportunidade de trabalhar juntos durante o período em que estivemos de quarentena no centro de treinos", disse à sua assessoria de imprensa, lembrando que "as outras equipas tiveram o mesmo tipo de condições de treino". O Jeonbuk começou a trabalhar no seu centro de treinos há algumas semanas, onde jogadores, treinadores e todo o staff se mantiveram em isolamento.
Naquele que foi o primeiro jogo de uma nova era para o futebol, José Morais deixa a certeza de que foi tudo diferente do que vinha sendo hábito. Desde logo com a ausência de pessoas nas bancadas. Mas as novidades começaram logo à entrada no estádio Jeonju, onde a seleção nacional venceu a Polónia por 4-0 - hat trick de Pauleta e um golo de Rui Costa - na fase de grupos do Mundial 2002.
"A entrada no estádio foi feita com distanciamento de dois metros entre todos. O uso de máscara foi obrigatória, bem como o controlo da temperatura corporal", explicou o treinador português. Aliás, o site KBS News revela mesmo que dois jogadores do Suwon registaram uma temperatura corporal acima do normal... Instalou-se algum nervosismo nos atletas que, cinco minutos depois, voltaram a ser controlados. Dessa vez, os valores já eram normais e lá puderam entrar no estádio, com visível sensação de alívio.
Mas as diretrizes dadas às duas equipas não ficaram por aqui. "Foi obrigatório o uso de garrafas de água individuais para cada um dos jogadores, que ficaram também proibidos de trocar de camisolas", revela José Morais, acrescentando que as equipas foram também "desaconselhada a reunião dos jogadores em círculo no relvado, onde dão o habitual grito de guerra para o jogo". Uma recomendação que, no entanto, não foi cumprida pelos jogadores do Suwon.
Um sem número de medidas de segurança que foram mantidas até na habitual formação das equipas, onde o habitual aperto de mão deu agora lugar a uma vénia entre jogadores das duas equipas antes do apito inicial. E em pleno jogo as regras mantiveram-se, pois "todos aqueles que se sentaram nos bancos de suplentes foram obrigados a usar máscaras", embora os treinadores as tirassem quando tinham de dar indicações aos seus atletas para dentro do campo.
E até os golos foram objeto das medidas traçadas pelas autoridades sanitárias. "Foi pedido para que nas celebrações dos golos não houvesse contacto de grupo", explicou José Morais que, quando viu Lee Dong-guk marcar o golo do triunfo aos 84 minutos conseguiu ser bastante controlado, limitando-se a cumprimentar os seus adjuntos com toques com o antebraço. E mesmo dentro do campo, apesar da emoção de um golo já nos últimos minutos, os jogadores cumpriram à risca o que lhes foi pedido, com o distanciamento possível.
Aliás, José Morais admitiu que no aspeto mental este tenha sido "um jogo diferente" sobretudo por causa das medidas de seguranças que todos tiveram de cumprir, na sequência de uma pandemia que tem atingido todo o mundo, sendo que a Coreia do Sul foi tido como um dos países exemplares na resposta ao combate ao vírus, tendo registado quase mil casos, dos quais resultaram 256 mortos, sendo que neste momento as autoridades dão o covid-19 como controlado, embora receiem uma segunda vaga da pandemia.
O primeiro jogo da K-League foi o pontapé de saída na normalidade possível no desporto sul-coreano. Num estádio onde habitualmente estariam 46 mil frenéticos adeptos a puxar pelo tricampeão, os jogadores debateram-se desta vez com as cadeiras vazias e duas frases na bancada central, uma escrita em coreano e outra em inglês, mas cujo significado era o mesmo: "Stay Strong" ("Fiquem fortes", na tradução para o português).
Durante o jogo, o eco das vozes podia-se ouvir em todo o estádio, mas foi possível também momentos em que se ouviu o cântico dos adeptos... numa gravação reproduzida no sistema áudio do recinto.
No final da partida, Lee Dong-guk, avançado com uma carreira profissional de mais de 20 anos, estava feliz por ter marcado o primeiro golo na era do covid-19 na Coreia do Sul, mas considerou "um pouco estranhas" as sensações que teve durante a partida, afinal "esta foi a primeira vez" na sua carreira que jogou "sem adeptos nas bancadas".
Este foi o primeiro jogo numa nova era do futebol sul-coreano, mas também numa nova realidade que, no próximo dia 16, terá como palco a Alemanha e lá mais para o final do mês a Liga portuguesa.