A 16 meses da cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos de Paris 2024, o Comité Olímpico Internacional (COI) parece estar a ceder à pressão internacional de manter as sanções aplicadas à Rússia e à Bielorrússia pela invasão da Ucrânia. Isto depois de o seu presidente, o alemão Thomas Bach, ter aberto a porta à possível participação de atletas daqueles países nos Jogos que vão realizar-se em França, embora sem símbolos - bandeira e hino - dos respetivos países..Em comunicado, o COI garantiu quarta-feira que as sanções são para manter, classificando a Rússia e a Bielorrússia como "únicos responsáveis" por uma "guerra sem sentido". O organismo, considera ainda a invasão "uma flagrante violação da Trégua Olímpica e da Carta Olímpica" e, nesse sentido, coloca-se ao lado dos atletas ucranianos, assumindo o compromisso de ajudá-los a enfrentar "dificuldades indescritíveis". Por isso, anunciou ter triplicado o fundo de solidariedade do qual já beneficiaram "cerca de 3000 atletas", que comporta apoio financeiro e logístico para os Jogos de verão em Paris e de inverno marcados para 2026, em Itália..Esta organização refere ainda, no comunicado que assinala um ano após a invasão da Ucrânia, que a esmagadora maioria do movimento olímpico, incluindo atletas, comités nacionais e federações internacionais, apoia a "solidariedade inabalável" com os ucranianos e as sanções à Rússia e à Bielorrússia..Esta posição acaba por ser reflexo de um conjunto de pressões exercidas nos últimos meses, sobretudo após Thomas Bach ter aberto a porta à integração dos atletas russos e bielorrussos, defendendo que "não podem ser castigados pelo que fazem os governos dos seus países", assumindo o desafio de iniciar uma "missão unificadora" para não penalizar quem pretende competir em provas internacionais. Aliás, Bach defendia que a suspensão de atletas "não fazia parte das sanções" e era apenas "uma medida protetora, para salvaguardar a integridade das competições e dos desportistas"..Os países bálticos - Estónia, Letónia e Lituânia - avisaram de imediato que não participariam nos Jogos. A Polónia seguiu o mesmo caminho e até os governos da Dinamarca, Finlândia, Islândia, Noruega e Suécia enviaram uma carta ao COI na qual demonstraram o seu apoio à Ucrânia, ao mesmo tempo que diziam que não era o momento de alterar a posição assumida..Mais duro foi Volodymyr Zelensky, presidente da Ucrânia, que condenou a abertura do COI. "Enquanto a Rússia mata e aterroriza, os representantes desse Estado terrorista não têm lugar nas competições desportivas e olímpicas", disse, durante uma reunião por videoconferência com ministros do Desporto de vários países. E foi este movimento de 30 nações - entre as quais Portugal, França, Grã-Bretanha, Suécia, Polónia, Estados Unidos e Canadá - que ameaçaram com o boicote a Paris 2024 se não for clarificada a ideia de neutralidade dos atletas russos e bielorrussos, defendendo ao mesmo tempo que estes estejam impedidos de participar enquanto durar a guerra na Ucrânia. E, nesse contexto, lançaram um conjunto de perguntas, que esperam ver respondidas antes de tomarem uma decisão..O comunicado do COI de quarta-feira pode assim ser interpretado como um sinal, embora em janeiro o alemão Thomas Bach tenha deixado uma ideia forte: "Como a história tem demonstrado, boicotes anteriores não atingiram os seus objetivos políticos e serviram apenas para punir os atletas dos comités que boicotaram.".A verdade é que, desde o início da invasão à Ucrânia, o desporto russo está numa situação de isolamento absoluto, pois as suas equipas e seleções foram de imediato expulsas das competições internacionais das diversas modalidades, incluindo no basquetebol, onde tinha três equipas na poderosa Euroliga, que reúne as principais equipas europeias..As sanções da UEFA acabaram por ser as que tiveram maior impacto, pois inviabilizaram a presença da seleção de futebol da Rússia no Mundial 2022, pois foi excluída do play-off de acesso, mas também ficou fora do Europeu e do Mundial femininos. Já as principais equipas do país ficaram sem acesso às receitas da Liga dos Campeões e até foi colocada a hipótese de serem integradas nas competições asiáticas, o que, para já, ainda não se concretizou..Menos duras foram as sanções no ténis, pois os principais tenistas russos como Daniil Medvedev ou Andrey Rublev foram autorizados a competir, tal como as bielorrussas Aryna Sabalenka e Victoria Azarenka, mas sob bandeira neutra. Isto depois de todos eles terem sido impedidos de jogar no ano passado em Wimbledon, o primeiro Grand Slam após a invasão russa..O futebol é uma das grandes bandeiras de exaltação e de orgulho dos ucranianos, sobretudo no que diz respeito à participação do Shakhtar Donetsk na Liga Europa e do Dnipro na Liga Conferência. São autênticos embaixadores do país, até porque onde quer que joguem têm contado com o apoio de muitos ucranianos, algo que se vê sobretudo quando atuam na condição de visitados, por condições de segurança, respetivamente, em Varsóvia (Polónia) e Kosice (Eslováquia)..Os jogos da liga ucraniana decorrem no país, mas com as portas dos estádios fechadas e com as partidas sujeitas a interrupções quando surgem os avisos de bombardeamento. Apesar do cenário de incerteza, já estão decorridas 15 jornadas, com Dnipro na liderança com mais cinco pontos que o Shakhtar, que tem um jogo a menos..As dificuldades inerentes à guerra obrigaram os clubes a vender alguns dos seus melhores jogadores, com destaque para a nova estrela do futebol ucraniano, o extremo Mykhaylo Mudryk, que em janeiro foi vendido pelo Shakhtar ao Chelsea por 70 milhões de euros. Aliás, o clube de Donetsk encaixou esta época 114,8 milhões de euros com a venda de atletas, entre os quais David Neres, que no verão assinou pelo Benfica por 15,3 milhões de euros..Na Rússia, os campeonatos internos decorrem normalmente, aparentemente indiferentes à guerra na Ucrânia. Isto apesar de, logo após a invasão, alguns jogadores terem abandonado o país, entre os quais uma das estrelas emergentes do futebol mundial, o georgiano Khvicha Kvaratskhelia, que deixou o Rubin Kazan para regressar ao seu país, ao Dínamo Batumi, sendo que agora brilha no Nápoles..Curioso é que na janela de transferências de inverno, houve vários jogadores do Ocidente que rumaram à Rússia, alguns deles saídos de Portugal como Tomás Tavares, que o Benfica transferiu para o Spartak Moscovo por dois milhões de euros, mas também os brasileiros Tassano e Léo Andrade, que trocaram, respetivamente, Santa Clara e Marítimo pelo FK Khimki. Na Liga russa, o Zenit continua a dominar, tendo, à 17.ª jornada, seis pontos de vantagem sobre o Spartak Moscovo..carlos.nogueira@dn.pt