24 março 2017 às 00h20

Miguel Guedes. O toque português nos motores dos campeões do mundo

Engenheiro de eletrónica e computadores, natural de Santarém, ajuda a desenvolver os motores que têm dominado a F1

Rui Frias

A participação no Projeto Formula Student do Instituto Superior Técnico de Lisboa, no qual ajudou a construir o primeiro carro elétrico de competição em Portugal, foi a ponte que levou Miguel Guedes até à Mercedes, onde este santareno formado em Engenharia de Eletrónica e Computadores tem dado desde 2011 um toque português aos motores dos carros que ganharam os últimos três títulos de campeão na Fórmula 1 - dois por Lewis Hamilton (2014 e 2015) e um por Nico Rosberg (2016).

"Desde sempre" aficionado pelo mundo automóvel, e em particular pela F1, Miguel, de 30 anos, vive o sonho que em adolescente nunca achou "que fosse possível concretizar". Desde Brixworth, em Inglaterra, sede da fábrica da Mercedes AMG High Performance Powertrains, explica ao DN o processo que o levou até ao exclusivo mundo do Grande Circo.

"Durante a nossa participação na Formula Student [competição internacional entre faculdades de engenharia, com carros desenhados e construídos de raiz pelos alunos], no Reino Unido, em 2010, fiquei a conhecer alguns representantes da empresa, que era um dos patrocinadores do evento, e percebi que aposta bastante no recrutamento de jovens talentos e decidi tentar a sorte. Candidatei-me no final do ano e, para minha surpresa, ficaram interessados. Fiz uma entrevista por telefone e meses depois estava a iniciar a minha aventura na Fórmula 1."

Agora, após passar por vários departamentos, desempenha as funções de engenheiro de integração de sistemas, trabalhando principalmente no desenvolvimento do software embebido nas várias unidades eletrónicas de controlo (ECU) da Power Unit (nome dado aos atuais motores de F1) para controlar a injeção, a ignição e a gestão da utilização de energia elétrica das componentes híbridas dos atuais motores V6 ao longo das provas. "O objetivo é sempre extrair o máximo de performance possível, transferi-la para as rodas de forma controlada e ainda gerir a vida da Power Unit [moto], uma vez que atualmente cada uma tem de durar pelo menos cinco provas", explica Miguel Guedes.

As novas regras em vigor nesta época obrigaram a trabalho extra na offseason, "a altura do ano mais atarefada" para os engenheiros. "Com as novas regras, os pilotos vão passar mais tempo a acelerar, e a guiar a grandes velocidades, e como tal vai haver uma maior exigência do motor. Isso obrigou a um enorme esforço para reforçar a Power Unit, de forma a que a durabilidade não seja afetada", conta ao DN o português que ajuda a construir os motores de maior sucesso na F1 (equipam também Williams e Force India) e que durante as corridas dá suporte à equipa a partir da fábrica. "Recebemos na nossa sala de controlo dados de todos os carros, em tempo real, e estamos em constante comunicação com a equipa que está em pista."

Apesar de a relação entre engenheiros e pilotos "nem sempre ser fácil", Miguel salienta o privilégio de trabalhar com nomes como Hamilton, Rosberg ou, nesta época, Valtteri Bottas. "Todos eles extremamente talentosos." Mas, se lhe perguntarem qual o favorito para o título deste ano, Miguel Guedes não se descose: "O meu trabalho é garantir que ambos tenham a mesma oportunidade de vencer as corridas, independentemente da minha opinião pessoal."