A ascensão de Jota até virar o avançado de que o dragão precisava

Descoberto em Gondomar, cobiçado pelos grandes e quase dispensado pelo Paços de Ferreira. A história da nova revelação portista
Publicado a

Dizem que Gondomar é a capital da ourivesaria e foi lá que Gilberto Andrade descobriu a nova joia do ataque portista: Diogo Jota. O antigo coordenador da formação do Paços de Ferreira, agora adjunto de Jorge Simão em Chaves, soube logo que estava na presença de um diamante em bruto. "Era um cavalo selvagem, um talento inato", recorda ao DN o homem que convenceu a direção pacense a avançar para a sua contratação. E foi já na capital do móvel que o talento de Jota começou a ser lapidado para resultar em feitos brilhantes, como o hat trick que apontou ao Nacional, este sábado, no jogo em que se estreou a titular pelo FC Porto.

Desde cedo que a capacidade de finalização que Jota demonstrou na Madeira ficou patente na formação do Gondomar, onde em 2003 iniciou o seu percurso no futebol. Na última época em que por lá jogou marcou 39 golos pelos juniores e mais uns quantos pelos juvenis, numa fase em se desdobrava para competir em dois escalões no mesmo fim de semana.

"Lembro-me de uma ocasião em que marcou dois hat tricks seguidos à mesma equipa. No sábado, fez três golos pelos juniores. No domingo, pelos juvenis. E o guarda-redes era o mesmo nos dois jogos", conta Álvaro Cerqueira, presidente dos gondomarenses. Um exercício de memória confirmado pelo treinador de então, José Carlos Magalhães. "Foi contra o Candal. No jogo de domingo até começou no banco, pois estava cansado. Só entrou na segunda parte mas ainda fez três golos", assinala.

Nesta altura, Diogo Jota já era seguido de perto por Benfica, FC Porto e até Sp. Braga, onde chegou a realizar alguns treinos à experiência. Mas foi num desses fins de semana em modo "agente duplo" que levou Carlos Barbosa, então presidente dos castores, a dar ouvidos aos conselhos de Gilberto Andrade. "O Gondomar foi jogar a Paços de Ferreira e o Jota, que nós já acompanhávamos, tornou a fazer a diferença. Voltei a insistir com o presidente, dizendo-lhe que tínhamos de o contratar. Durante o jogo ele conversou com o presidente do Gondomar e o negócio ficou logo alinhavado", revela o antigo coordenador dos pacenses.

A ascensão meteórica do novo herói dos dragões estava apenas a começar. Ainda não tinha atingido a maioridade quando Paulo Fonseca o lançou pela primeira vez na equipa principal. Mais uma estreia de sonho, com um golo na Taça de Portugal, a confirmar essa predisposição natural para quebrar recordes de precocidade. Na temporada passada, fixou-se nos seniores, voltando a despertar a cobiça do Benfica. Mas foi o Atl. Madrid que acabou por contratá-lo, emprestando-o ao FC Porto.

Da dispensa a avançado
Os primeiros tempos de Jota em Paços de Ferreira não foram nada fáceis. Os pacenses chegaram mesmo a ponderar dispensá-lo poucos dias após a sua chegada, uma vez que o rendimento não correspondia às expectativas. "Estava habituado a ser ele e mais dez, a treinar com menos intensidade para poder jogar por duas equipas. Ali encontrou um contexto competitivo diferente e demorou mais a adaptar-se", explica Gilberto, que acompanhou o processo.

Diogo Jota começou lentamente a afirmar-se, mas só despontou verdadeiramente quando passou a atuar como avançado. O mentor da ideia, que Nuno Espírito Santo soube rentabilizar no seu novo sistema tático (4x4x2), foi Vasco Seabra. "Quando chegou jogava como médio interior. Com o decorrer do tempo, achámos que podia render mais como ponta-de-lança", justifica o antigo técnico dos juniores do Paços de Ferreira.

O sucesso foi evidente: 17 golos nos 14 encontros que se seguiram (tinha feito apenas cinco nos anteriores 22). "Quando falámos com ele ficou um pouco reticente. Gosta de estar envolvido no jogo e achou que ia ter menos bola, mas o nosso processo não funcionava assim. Como é muito humilde e focado, aceitou o desafio. No primeiro jogo fez logo dois golos. A partir daí nunca mais se importou de jogar na frente", atira Vasco.

Mentalidade de ferro
Gilberto Andrade garante que Jota "tem uma capacidade mental anormal". Vasco Seabra assegura que este possui "uma personalidade madura". E José Carlos Magalhães diz que "não se deixa deslumbrar". É este o retrato fiel de "um miúdo espectacular" - nas palavras de Álvaro Cerqueira - que não baqueia nos momentos decisivos.

Aos 19 anos, Diogo José - tantas vezes levava Diogo J. na camisola que a alcunha ficou - promete continuar a bater recordes. Um deles poderá ser fixado caso o FC Porto decida exercer a opção de compra, que é de 22 milhões, para o contratar em definitivo aos madrilenos. O Gondomar, que já recebeu 90 mil euros do Atl. Madrid graças ao mecanismo de solidariedade, pode voltar a encher os cofres com a ajuda do seu menino de ouro.

Diário de Notícias
www.dn.pt