Os especialistas em economia e marketing desportivo ouvidos pela Lusa antecipam "muitos milhões" de euros para o Benfica com a projetada venda do nome do estádio da Luz, mas dividem-se sobre o impacto da estratégia..Daniel Sá, docente universitário e diretor executivo do Instituto Português de Administração e Marketing (IPAM), antevê "muitos milhões" para o clube, dependendo uma verba exata da duração do contrato, mas também que possa trazer "outros usos" para o recinto desportivo..Por outro lado, o economista João Duque tem dúvidas sobre a alienação de um ativo de longo prazo para responder à conjuntura atual..Na terça-feira, o Benfica anunciou ter escolhido a agência WME Sports para liderar o processo de procura de patrocinadores para o nome do estádio da Luz e do centro de estágios, no Seixal..Para o nome do estádio, assegura João Duque, "vai ter de ser feito um contrato de décadas".."Só assim é que faz sentido, e a covid-19 não tem nada a ver. Estão a pegar num ativo que é estratégico para o clube para o comprometer a uma situação de conjuntura, que não é estratégica", atira..À Lusa, Duque explica que esta resposta deveria implicar uma "aplicação [das verbas recebidas] da mesma dimensão", isto é, que possa influenciar o longo prazo, mas não o vê dessa forma.."Ora, o que se está a fazer é hipotecar valores estratégicos para pagar remunerações de trabalhadores, que têm todo o direito a defender-se, mas repare-se, toda a gente está a sofrer [com a crise]", comenta..O economista deixa ainda críticas à "estrutura de custos tão elevada", pelo investimento em jogadores, que lhe suscita "dúvidas de que o próprio modelo de desenvolvimento de negócio seja razoável"..Por outro lado, os clubes portugueses, como o campeonato, têm "uma dimensão relativamente pequena", aliado à constante venda de jogadores para gerir a entrada de verbas.."Ver clubes a hipotecar ativos de longo prazo para fazer face a conjuntura não é uma boa decisão. Quando as pessoas vão meter um anel no prego, a ideia é de que depois, quando conseguirem recuperar, vão desonerá-lo. Neste caso não é. Daqui a dois ou três anos, o clube não vai resgatar o nome. É mesmo um negócio para alienar", analisa..Daniel Sá, por seu lado, aplaude a "notícia significativa e muito importante", para o Benfica e para o futebol português, lembrando o recente acordo de centralização dos direitos televisivos para reconhecer um caminho de "internacionalização" do desporto.."Portugal não tem histórico de 'naming rights'. Há alguns exemplos, mas eu diria que são pontuais e esporádicos, não como a realidade norte-americana, onde esta questão é muito comum. Na Europa, só nos últimos anos começámos a ter alguma tradição", recorda..O especialista em 'marketing' desportivo lembra que esta é uma forma de os clubes rentabilizarem o facto de serem "marcas muito visíveis" e diversificarem as fontes de rendimento, algo que não foi "um descobrir da pólvora", mas antes seguir o que há anos fazem os melhores campeonatos europeus..Sem "histórico relevante para analisar em Portugal", no padrão europeu, refere, o contrato mais valioso será o da Allianz Arena, casa do Bayern de Munique, "que ronda os 15 milhões anuais, [mas] num país como a Alemanha e num clube como o Bayern"..Sá aponta para a natureza da agência escolhida, uma multinacional norte-americana que reconhece como "um dos maiores 'players' do mundo do entretenimento", gerindo ativos comerciais do desporto ao cinema e à música.."Esta parceria faz-nos prever que vêm parceiros internacionais [para assumir o nome do estádio e do Seixal]. A empresa vê potencial na marca [Benfica], e estou curioso sobre os detalhes do contrato, porque habitualmente contratos de 'naming rights' não são só o nome, mas preveem a utilização do espaço em moldes diferentes do normal", analisa..Assim, é de esperar que a Luz possa passar a ser mais do que "uma infraestrutura usada para 90 minutos de futebol de 15 em 15 dias", o que é "um desperdício do ponto de vista económico"..Tanto João Duque como Daniel Sá reconhecem, também, que os adeptos e sócios podem "não gostar muito" da alteração, com o primeiro a lembrar as equipas de ciclismo, com o nome 'tomado' pelo de várias empresas, e o segundo a explicar que este é um processo natural de "evolução"..O especialista em 'marketing' desportivo antevê ainda que "mais tarde ou mais cedo" o clube 'encarnado' mudará o símbolo, como outros clubes europeus têm feito, para "atualizar" um símbolo da marca..De resto, João Duque escusa-se a avaliar o valor concreto do contrato, mas lembra que, para a empresa que assumir o nome, esta parceria "só tem valor, verdadeiramente, se toda a gente que falar no estádio disser o novo nome", o que nem sempre acontece..Em comunicado, o clube explicou, na terça-feira, que "a parceria comercial exclusiva" permite que a WME Sports "represente dois dos mais prestigiados ativos do futebol europeu" em relação à questão do 'naming'..O estádio do clube, inaugurado em 2003, tem capacidade para 65.000 espetadores e já foi palco, entre outros grandes eventos e competições, da final do Campeonato da Europa de futebol em 2004, da final da Liga dos Campeões em 2014 e da final a oito da mesma competição em 2020..O centro de estágios, situado no Seixal, foi inaugurado em setembro de 2006, tendo recebido em 2015 e 2019 o prémio de melhor academia do ano nos Globe Soccer Awards.